sábado, 31 de agosto de 2013

PIB cresce 3,3% e chega a R$ 1,2 trilhão

PIB cresce 3,3% e chega a R$ 1,2 trilhão
 
O Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 3,3% no segundo trimestre de 2013 em comparação com o mesmo período em 2012. O destaque foi da agropecuária (13%), seguida por indústria (2,8%) e serviços (2,4%). Em relação ao primeiro trimestre de 2013, o aumento foi de 1,5%. A agropecuária apresentou o maior crescimento (3,9%), seguida por indústria (2%) e serviços (0,8%). Os dados foram publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística nesta sexta-feira (30).

Todos os subsetores que formam a indústria apresentaram resultados positivos, com destaque para o desempenho da construção civil (3,8%). A indústria de transformação apresentou aumento do volume do valor adicionado de 1,7% em relação ao trimestre imediatamente anterior, seguida pela extrativa mineral (1,0%) e por eletricidade e gás, água, esgoto e limpeza urbana (0,8%).
Dentre os serviços, destaque para o crescimento do comércio (1,7%). As demais atividades também registraram aumento do volume do valor adicionado em relação ao trimestre anterior: intermediação financeira e seguros (1,1%), transporte, armazenagem e correio (1%), serviços de informação (0,9%), outros serviços (0,7%) e atividades imobiliárias e aluguel (0,7%).

‘Guerras humanitárias’

‘Guerras humanitárias’

Emir Sader

A Otan foi a expressão militar da hegemonia norte-americana no marco da guerra fria. Foi construída para a “contenção da União Soviética” na perspectiva de que haveria um projeto de expansionismo soviético, que teve como resposta a teoria da contenção. A Otan reunia aos países europeus, sob o comando militar dos EUA.

Terminada a guerra fria, com a vitória do bloco ocidental, o que fazer com a Otan? Terminado seu objetivo inicial, deveria desaparecer. Mas as potências ocidentais passaram a descobrir ou inventar novos inimigos globais, sem os quais suas aventuras militares não se sustentariam.

Enquanto os EUA apontavam para o narcotráfico, depois diretamente para o “terrorismo islâmico”, Tony Blair se encarregou de teorizar a nova função da Otan: “ingerência humanitária” onde houvesse violação maciça dos direitos humanos, o que permitiria violar a soberania nacional de Estados, em nome desse objetivo superior. Intelectuais com trajetórias progressistas, como Norberto Bobbio, Jurgen Habermas, entre outros, passaram a usar a ideia de “guerras humanitárias”.

Foi assim na Bósnia, foi assim no Afeganistão, no Iraque, na Líbia, e agora a justificativa volta à baila no caso da Síria. As forças imperiais assumem um ar “humanitário” para realizar suas operações militares e de conquista.

No caso da Líbia, a resolução que conseguiram arrancar do Conselho de Segurança da ONU – com a abstenção da Rússia, da China, do Brasil, da África do Sul e da Índia – foi a autorização para atuar a fim de “defender a população civil”. Com a declaração em mãos, as potênciais imperiais – os EUA e as europeias – se valeram da Otan para bombardear oito meses seguidos o regime de Kadafi, com todas as vítimas civis correspondentes, até derrubar o regime.

Desta vez a Rússia e a China prometem se valer dos seus direitos de veto e impedir que algo similar passe. Por isso os EUA busca argumentos e alianças que contornem a ONU.

A ideologia segue a mesma: “defesa da população síria”, daí a necessidade de provar que foi usado gás sarin, que poderia justificar uma intervenção estrangeira, uma nova “guerra humanitária”.

Milhões de afegãos, iraquianos e líbios já foram vítimas desse “humanismo imperialista”, que agora quer se estender aos sírios. O fato de que 70% dos socialistas franceses se pronunciem pelo ataque à Síria demonstra a efetividade dessa ideologia liberal-imperialista.
 

CRÔNICA DE MACHADO DE ASSIS

(NA FOTO: LUIZ MURAT)
 
Bons dias!

 

Antes de mais nada deixem-me dar um abraço no Luís Murat, que acaba de não ser eleito deputado pelo 12° distrito do Rio de Janeiro. Eu já tinha escovado a casaca e o estilo para o enterro do poeta e o competente necrológio; ninguém está livre de uma vitória eleitoral. Escovei-os e esperei as notícias.

 

Vieram elas, e não lhe digo nada: dei um salto de prazer. Cheguei à janela; vi que as rosas, — umas grandes rosas encarnadas que Deus me deu, — vi que estavam alegres e até dançavam; a música era um bater de asas de pássaros brancos e azuis, que apareceram ali vindos não sei donde, nem como.

 

Sei que eram grandes, que batiam as asas, que as rosas bailavam e que as demais plantas pareciam exalar os melhores cheiros. Umas vozes surdas diziam rindo: Murat, derrotado. Murat, derrotado.

 

E que bonita derrota, Deus de misericórdia! Podia perder a eleição por vinte ou trinta votos; seria então um meio desastre, porque abria novas e fundadas esperanças. Mas, não, senhor, a derrota foi completa; nem cinqüenta votos. Por outros termos, é um homem liberto; teve a sua Lei de 13 de Maio: “Art. 1°. Luís Murat continuará a compor versos. Art. 2°. Ficam revogadas as disposições em contrário”.

 

Não é que seja mau ter um lugar na Câmara. Tomara eu lá estar. Não posso; não entram ali relojoeiros. Poetas entram, com a condição de deixar a poesia. Votar ou poetar. Vota-se em prosa, qualquer que seja, prosa simples, ruim prosa, boa prosa, bela prosa, magnífica prosa, e até sem prosa nenhuma, como o Sr. Dias Carneiro, para citar um nome. Os versos, quem os fez, distribui-os pelos parentes e amigos e faz uma cruz às musas. Alencar (e era dos audazes) tinha um drama no prelo, quando foi nomeado ministro. Começou mandando suspender a publicação; depois fê-lo publicar sem nome de autor. E note-se que o drama era em prosa...

 

Suponhamos que Luís Murat saía eleito, e que seu rival, o Augusto Teixeira, é que ficava com os quarenta votos. Com certeza, os versos de Murat não passavam a ser feitos pelo Teixeira; e era talvez, uma vantagem. Em todo caso, ficávamos sem eles. Onde estão os do Dr. Afonso Celso? José Bonifácio, se os fazia, enterrava-os na chácara... Podia citar outros, mas não quero que a Câmara brigue comigo.

 

Vá lá abraço, e adeus. Agora é arrazoar de dia no escritório de advogado, e versejar de noite. Não fazem mal as musas aos doutores, disse um poeta; podem fazê-lo aos deputados.

 

Antes de mais nada, disse eu a princípio; mas francamente não vi se tinha mais alguma coisa que dizer. Prefiro calar-me, não sem comunicar aos leitores uma notícia de algum interesse.

 

Os leitores pensam com razão que são apenas filhos de Deus, pessoas, indivíduos, meus irmãos (nas prédicas), almas (nas estatísticas), membros (nas sociedades), praças (no exército), e nada mais. Pois são ainda uma certa coisa, — uma coisa nova, metafórica, original.

 

Ontem, indo eu no meu bonde das tantas horas da tarde para (não digo o lugar), ao entrarmos no Largo da Carioca, costeamos outro bonde, que ia enfiar pela Rua de Gonçalves Dias. O condutor do meu bonde falou ao do outro para dizer que na viagem que fizera da estação do Largo do Machado até a cidade, trouxe um só passageiro. Mas não contou assim, como aí fica; contou por estas palavras: “Que te dizia eu? Fiz uma viagem à toa; apenas pude apanhar um carapicu...”

 

Aí está o que é o leitor: um carapicu este seu criado; carapicus os nossos amigos e inimigos. Aposto que não sabia desta? Carapicu... Como metáfora, é bonita; e podia ser pior.

 

Boas noites.

 

Das vantagens de ser bobo




Das vantagens de ser bobo

                   [Clarice Lispector]


O bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir e tocar o mundo. O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo. Estou pensando." 

Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a idéia. 

O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os vêem como simples pessoas humanas. O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver. O bobo nunca parece ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um Dostoievski. 

Há desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer. Resultado: não funciona. Chamado um técnico, a opinião deste era de que o aparelho estava tão estragado que o conserto seria caríssimo: mais valia comprar outro. Mas, em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto estar tranqüilo. Enquanto o esperto não dorme à noite com medo de ser ludibriado. O esperto vence com úlcera no estômago. O bobo não percebe que venceu. 

Aviso: não confundir bobos com burros. Desvantagem: pode receber uma punhalada de quem menos espera. É uma das tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo a célebre frase: "Até tu, Brutus?" 

Bobo não reclama. Em compensação, como exclama! 

Os bobos, com todas as suas palhaçadas, devem estar todos no céu. Se Cristo tivesse sido esperto não teria morrido na cruz. 

O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos. Ser bobo é uma criatividade e, como toda criação, é difícil. Por isso é que os espertos não conseguem passar por bobos. Os espertos ganham dos outros. Em compensação os bobos ganham a vida. Bem-aventurados os bobos porque sabem sem que ninguém desconfie. Aliás não se importam que saibam que eles sabem. 

Há lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não confundir bobo com burro, com tolo, com fútil). Minas Gerais, por exemplo, facilita ser bobo. Ah, quantos perdem por não nascer em Minas! 
Bobo é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas. É quase impossível evitar excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo. 

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Tela de Lygia Clark bate recorde e é vendida em leilão por R$ 5,3 milhões

Tela de Lygia Clark bate recorde e é vendida em leilão por R$ 5,3 milhões
 
SILAS MARTÍ
 
Numa disputa que demorou três minutos entre compradores que deram lances por telefone, a tela "Superfície Modulada nº 4", de Lygia Clark, se tornou a obra de arte mais cara de um artista brasileiro vendida em leilão, arrematada por R$ 5,3 milhões na Bolsa de Arte em São Paulo.
Segundo a Folha apurou, o comprador da obra é de Nova York.
O lance inicial da obra de 1958 da artista neoconcreta, no leilão da Bolsa de Arte em São Paulo, era de R$ 4,5 milhões. Mas, segundo a reportagem apurou, mesmo antes da disputa um colecionador já oferecia R$ 5 milhões pela peça.
Segundo a casa de leilões, a tela, que pertencia à coleção de Luiz Buarque de Hollanda, havia despertado interesse de três colecionadores estrangeiros.
O valor desbancou o recorde anterior também atingido por Lygia Clark, quando "Contra Relevo (Objeto N. 7)", de 1959, foi arrematado por US$ 2,2 milhões, ou R$ 4,5 milhões na cotação da época, em maio deste ano na casa de leilões Phillips, em Nova York.
Divulgação
Tela "Superfície Modulada nº4", obra de Lygia Clark que pode atingir recorde em leilão
Tela "Superfície Modulada nº4", obra de Lygia Clark que pode atingir recorde em leilão
Embora não tenha muito "apelo visual", nas palavras de Jones Bergamin, dono da Bolsa de Arte, "Superfície Modulada nº4" é uma obra seminal na trajetória de Clark, morta em 1988. Ela foi exposta na Bienal de Veneza em 1968 e está cotada para participar da megarretrospectiva da artista marcada para o ano que vem no MoMA, em Nova York.
Composta por placas distintas de madeira montadas sobre a tela, a série foi um marco na transição das obras de Clark e na história do neoconcretismo brasileiro, quando artistas abandonaram a superfície bidimensional das telas para criar obras que se expandiam no espaço.
No caso de Clark, a série antecedeu a criação de suas famosas esculturas em metal articulado, os "Bichos", criaturas geométricas que podiam ser manipuladas pelo público. Um deles foi vendido por € 1,8 milhão, ou R$ 4,7 milhões na época, na feira Art Basel, em Basileia, há dois anos.

Estudante de 11 anos é admitido em universidade do Texas

Estudante de 11 anos é admitido em universidade do Texas


Do UOL*, em São Paulo

  • Com apenas 11 anos, Carson Huey-You está no primeiro semestre da Texas Christian University Com apenas 11 anos, Carson Huey-You está no primeiro semestre da Texas Christian University
Com apenas 11 anos, Carson Huey-You é o aluno mais novo a ser admitido na história da Texas Christian University. Carson, que quer ser físico quântico, tem aulas de cálculo, física, história e religião no primeiro semestre da universidade.
O garoto tinha apenas 10 anos quando se candidatou para a graduação -- ele fez 1.770 pontos de 2.400 possíveis no SAT (espécie de Enem americano) e fala mandarim. A mãe dele afirma que o menino já lia livros com dois anos e fazia contas de multiplicação e divisão aos tr~es anos.
Tendo em vista o ritmo de estudos de Carson, a estimativa é que ele pode se tornar PhD com menos de 20 anos.
O estudante prodígio disse à CBS 11 News que a universidade é divertida pois parece com a escola, só que em um campus maior e com mais gente. A mãe de Carson acompanha o garoto nas aulas.
O pai de Carson disse que não pressionou o filho para entrar na universidade e que, inclusive, tentou "segurar" o garoto.
*Com informações do Huffington Post e do New York Daily News

Conheça histórias de sucesso na educação28 fotos

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19.abr.2012 - Menina que nasceu sem as mãos ganha concurso de caligrafia nos Estados Unidos    


HISTÓRIA DO BRASIL DE AFRANIO PEIXOTO


HISTÓRIA DO BRASIL DE AFRANIO PEIXOTO

Pero de Góes da Silveira, parente do escritor Damião de Góes, companheiro de Pero Lopes na exploração do Rio da Prata, sob Martinho Afonso, teve S. Tomé ou Paraíba do Sul, de Macahé às divisas do Espírito Santo. Veio à sua capitania, plantou cana que trouxera de S. Vicente, montou engenhocas, mas sofreu vicissitudes com os índios, matanças de colonos, abandonando, por fim, suas terras, recolhido ao Reino.
Vasco Fernandes Coitinho teve o Espírito Santo, do Itapemerim ao Mucuri. Desfrutava seu ócio de fidalgo rico, que estivera na Índia, quando, à doação, vendeu tudo e saiu da pátria, sem idéia de retorno; fundou Vitória, plantou cana, fez engenho, mas demandou-se em maus hábitos e declinou perdendo tudo, chegando a esmolar.
Pedro de Campos Tourinho teve Porto Seguro, que ia do Mucuri até o Jequitinhonha. A princípio pacífica e ordeira, a colônia progrediu com a pesca e o açúcar; sob os herdeiros decaiu, vendida ao Duque de Aveiro.
Jorge de Figueiredo Corrêa teve os Ilhéus, do Jequitinhonha ao Jaguaripe. Não veio o donatário ao Brasil: seu nome foi dado, como invocação, à vila de S. Jorge dos Ilhéus. Foi das prósperas capitanias até que, rebeldia e revoltas, invasões de índios, a fizeram declinar.
Francisco Pereira Coitinho, do Jaguaripe, no extremo sul da baía de Todos os Santos, ao rio de S. Francisco. Pereira fundou ao lado da Graça, onde morava Diogo Álvares, a Barra, muito tempo chamada “Arraial do Pereira” e, depois da cidade nova de Tomé de Sousa, a “Vila Velha”. Os colonos espalharam-se pelo recôncavo e desmandaram-se. Os índios levantaram-se e o donatário teve de fugir em navios, que naufragaram na costa de Itaparica, onde os selvagens comeram o velho donatário... A família, refugiada em Ilhéus, sofreu penúria.
Duarte Coelho, filho de Gonçalo Coelho, dos primeiros exploradores, teve Pernambuco, do S. Francisco a Itamaracá. Fundou Olinda e, aliado aos índios, a “Nova Lusitânia”, nome da colônia, que prosperou com a cana de açúcar. Seu filho Jorge de Albuquerque Coelho, continuou o prestígio e a riqueza. Foram ambos inspiradores do poema “Prosopopéa”, e da “Narração” de um naufrágio, o pai e o filho, aquele morto em África, com D. Sebastião, este escapado do mar, numa travessia do Atlântico, que conta e canta Bento Teixeira, português originário do Porto, que assim inaugurou a literatura brasileira.
A João de Barros, o historiador, e Aires da Cunha, foram dadas cem léguas, da baía da Traição à barra do Mossoró, Rio Grande do Norte, ou do Jaguaribe, no Ceará. A Fernão Álvares de Andrade coube a terra que ia do rio da Cruz, no Ceará, ate a Ponta dos Mangues Verdes, no Maranhão. Da Ponta dos Mangues à divisa entre Maranhão e Pará, era inda de Barros e de Cunha. Como João de Barros e Álvares de Andrade não pudessem vir, associaram-se a Aires da Cunha. A expedição naufraga e dispersa-se no mar; os colonos sofrem fome e, em embarcações improvisadas, alguns vão ter ao Haiti, donde não puderam sequer tornar à pátria. Apenas João de Barros logroí reaver dois filhos. Partidos em festa e fausto de Lisboa, vieram encontrar a ruína e a catástrofe.
Antônio Cardoso de Barros, finalmente, teve terras entre o Jaguaribe e Mundaú, além de Fortaleza, que veio a ser a capital do Ceará: deste nem se sabe se tentou colonizar sua capitania.
O “drama e a tragédia” das capitanias, pôde dizer um historiador (João Ribeiro)... Apenas duas prosperam, Pernambuco e S. Vicente. As outras tiveram contra si o naufrágio, no mar, e, em terra, a rebeldia dos índios e a desordem dos colonos. A penúria do donatário do Espírito Santo dá tristeza, e o destino inclemente do da Bahia, horror. Felizes os que não se meteram na aventura. Mas, ainda assim, sistematicamente, a costa do Brasil ficou conhecida e as suas possibilidades manifestas. O inimigo externo que as promovera, os Franceses, ainda não estavam longe. Em 12 de Maio de 48, de S. Vicente, Luiz de Góes(15) fazia a Dom João III exortação patética: “Se com tempo e brevidade V. A. não socorre estas capitanias e costa do Brasil... ainda que nós percamos as vidas e fazendas, V. A. perderá a terra”. “E que nisto perca pouco, aventura-se a perder muito... queira Deus não se vão (os Franceses) a dobrar o Cabo de Boa Esperança...” (Hist. de Colonização Port., t. III, p. 334).
Sem abolir o sistema das capitanias, o remédio seria o governo geral, provendo ao Brasil, abandonado, com elas, aos interesses regionais. Alguns donatários se agravariam, mas, providencialmente, fora um deles, Pero de Góes, presente à Corte, dos mais persuasivos: viria com o governador geral, por capitão-mor da costa.


O PEQUENO PRINCIPE, V


O PEQUENO PRINCIPE, V

O Pequeno Principe, Antoine de Saint-Exupery, V


Dia a dia eu ficava sabendo mais alguma coisa do planeta, da partida, da viagem. Mas isso devagarinho, ao acaso das reflexões. Foi assim que vim a conhecer, no terceiro dia, o drama dos baobás.
Dessa vez ainda, foi graças ao carneiro. Pois bruscamente o principezinho me interrogou, tomado de grave dúvida:
- É verdade que os carneiros comem arbustos?
- Sim. É verdade.
- Ah! Que bom!
Não compreendi logo porque era tão importante que os carneiros comessem arbustos. Mas o principezinho acrescentou:
- Por conseguinte eles comem também os baobás?
Fiz notar ao principezinho que os baobás não são arbustos, mas árvores grandes como igrejas. E que mesmo que ele levasse consigo todo um rebanho de elefantes, eles não chegariam a dar cabo de um único baobá.
A idéia de um rebanho de elefantes fez rir ao principezinho:
- Seria preciso botar um por cima do outro...
Mas notou, em seguida, sabiamente:
- Os baobás, antes de crescer, são pequenos.
- É fato! Mas por que desejas tu que os carneiros comam os baobás pequenos?
- Por que haveria de ser? respondeu-me, como se se tratasse de uma evidência. E foi-me preciso um grande esforço de inteligência para compreender sozinho esse problema.
Com efeito, no planeta do principezinho havia, como em todos os outros planetas, ervas boas e más. Por conseguinte, sementes boas, de ervas boas; sementes más, de ervas más. Mas as sementes são invisíveis. Elas dormem no segredo da terra até que uma cisme de despertar. Então ela espreguiça, e lança timidamente para o sol um inofensivo galhinho. Se é de roseira ou rabanete, podemos deixar que cresça à vontade. Mas quando se trata de uma planta ruim, é preciso arrancar logo, mal a tenhamos conhecido.
Ora, havia sementes terríveis no planeta do principezinho: as sementes de baobá... O solo do planeta estava enfestado. E um baobá, se a gente custa a descobri-lo, nunca mais se livra dele. Atravanca todo o planeta. Perfura-o com suas raízes. E se o planeta é pequeno e os baobás numerosos, o planeta acaba rachando.
"É uma questão de disciplina, me disse mais tarde o principezinho. Quando a gente acaba a toalete da manhã, começa a fazer com cuidado a toalete do planeta. É preciso que a gente se conforme em arrancar regularmente os baobás logo que se distingam das roseiras, com as quais muito se parecem quando pequenos. É um trabalho sem graça, mas de fácil execução."
Em um dia aconselhou-me a tentar um belo desenho que fizesse essas coisas entrarem de uma vez na cabeça das crianças. "Se algum dia tiverem de viajar, explicou-me, poderá ser útil para elas. Às vezes não há inconveniente em deixar um trabalho para mais tarde. Mas, quando se trata de baobá, é sempre uma catástrofe. Conheci um planeta habitado por um preguiçoso. Havia deixado três arbustos..."
E, de acordo com as indicações do principezinho, desenhei o tal planeta.
Não gosto de tomar o tom de moralista. Mas o perigo dos baobás é tão pouco conhecido, e tão grandes os riscos daquele que se perdesse num asteróide, que, ao menos uma vez, faço exceção à minha reserva. E digo portanto: "Meninos! Cuidado com os baobás!" Foi para advertir meus amigos de um perigo que há tanto tempo os ameaçava, como a mim, sem que pudéssemos suspeitar, que tanto caprichei naquele desenho. A lição que eu dava valia a pena. Perguntarão, talvez: Por que não há nesse livro outros desenhos tão grandiosos como o desenho dos baobás? A resposta é simples: tentei, mas não consegui. Quando desenhei os baobás, estava inteiramente possuído pelo sentimento de urgência.



quinta-feira, 29 de agosto de 2013

O PEQUENO PRINCIPE, IV



O PEQUENO PRINCIPE, IV

O Pequeno Principe, Antoine de Saint-Exupery, IV

Eu aprendera, pois, uma segunda coisa, importantíssima: o seu planeta de origem era pouco maior que uma casa!
Não era surpresa para mim. Sabia que além dos grandes planetas - Terra, Júpiter, Marte ou Vênus, aos quais se deram nome - há centenas e centenas de outros, por vezes tão pequenos que mal se vêem no telescópio. Quando o astrônomo descobre um deles, dá-lhe por nome um número. Chama-o, por exemplo: "asteróide 3251".
Tenho sérias razões para supor que o planeta de onde vinha o príncipe era o asteróide B 612. Esse asteróide só foi visto uma vez ao telescópio, em 1909, por um astrônomo turco.
Ele fizera na época uma grande demonstração da sua descoberta num Congresso Internacional de Astronomia. Mas ninguém lhe dera crédito, por causa das roupas que usava. As pessoas grandes são assim.
Felizmente para a reputação do asteróide B 612, um ditador turco obrigou o povo, sob pena de morte, a vestir-se à moda européia. O astrônomo repetiu sua demonstração em 1920, numa elegante casaca. Então, dessa vez, todo o mundo se convenceu.
Se lhes dou esses detalhes sobre o asteróide B 612 e lhes confio o seu número, é por causa das pessoas grandes. As pessoas grandes adoram os números. Quando a gente lhes fala de um novo amigo, elas jamais se informam do essencial. Não perguntam nunca: "Qual é o som da sua voz? Quais os brinquedos que prefere? Será que coleciona borboletas?" Mas perguntam: "Qual é sua idade? Quantos irmãos ele tem? Quanto pesa? Quanto ganha seu pai?" Somente então é que elas julgam conhecê-lo. Se dizemos às pessoas grandes: "Vi uma bela casa de tijolos cor-de-rosa, gerânios na janela, pombas no telhado..." elas não conseguem, de modo nenhum, fazer uma idéia da casa. É preciso dizer-lhes: "Vi uma casa de seiscentos contos". Então elas exclamam: "Que beleza!"
Assim, se a gente lhes disser: "A prova de que o principezinho existia é que ele era encantador, que ele ria, e que ele queria um carneiro. Quando alguém quer um carneiro, é porque existe" elas darão de ombros e nos chamarão de criança! Mas se dissermos: "O planeta de onde ele vinha é o asteróide B 612" ficarão inteiramente convencidas, e não amolarão com perguntas. Elas são assim mesmo. É preciso não lhes querer mal por isso. As crianças devem ser muito indulgentes com as pessoas grandes.
Mas nós, nós que compreendemos a vida, nós não ligamos aos números! Gostaria de ter começado esta história à moda dos contos de fada. Teria gostado de dizer:
"Era uma vez um pequeno príncipe que habitava um planeta pouco maior que ele, e que tinha necessidade de um amigo..." Para aqueles que compreendem a vida, isto pareceria sem dúvida muito mais verdadeiro.
Porque eu não gosto que leiam meu livro levianamente. Dá-me tristeza narrar essas lembranças! Faz já seis anos que meu amigo se foi com seu carneiro. Se tento descrevê-lo aqui, é justamente porque não o quero esquecer. É triste esquecer um amigo. Nem todo o mundo tem amigo. E eu corro o risco de ficar como as pessoas grandes, que só se interessam por números. Foi por causa disso que comprei uma caixa de tintas e alguns lápis também. É duro pôr-se a desenhar na minha idade, quando nunca se fez outra tentativa além das jibóias fechadas e abertas dos longínquos seis anos! Experimentarei, é claro, fazer os retratos mais parecidos que puder. Mas não tenho muita esperança de conseguir. Um desenho parece passável; outro, já é inteiramente diverso. Engano-me também no tamanho. Ora o principezinho está muito grande, ora pequeno demais. Hesito também quanto à cor do seu traje. Vou arriscando então, aqui e ali. Enganar-me-ei provavelmente em detalhes dos mais importantes. Mas é preciso desculpar. Meu amigo nunca dava explicações. Julgava-me talvez semelhante a ele. Mas, infelizmente, não sei ver carneiro através de caixa. Sou um pouco como as pessoas grandes. Acho que envelheci.



quarta-feira, 28 de agosto de 2013

O PERIGO DA GUERRA


BACKHAUS TOCA BEETHOVEN

MÉDICOS CUBANOS VERBALMENTE AGREDIDOS

Aos 50 anos, discurso de Luther King reflete sonho universal por sociedade justa

Aos 50 anos, discurso de Luther King reflete sonho universal por sociedade justa

Por Luciana Alvarez - especial para o iG |                                

'Eu tenho um sonho' continua atual por mensagem pelos direitos civis nos EUA projetar-se para o mundo inteiro

O discurso histórico “Eu tenho um sonho”, que o reverendo Martin Luther King Jr. proferiu durante a Marcha em Washington por Emprego e Liberdade em 28 de agosto de 1963, continua reverberando nos EUA e mundo afora exatos 50 anos depois. Grande parte do seu impacto, dizem analistas, deve-se ao fato de não ter sido um discurso apenas para negros, ou só para cristãos, mas para todos os americanos – e, de certa forma, para todos que buscam uma sociedade mais justa. É por isso também que, passado meio século, ele não envelheceu.
Cronologia: Saiba os principais fatos na luta pelos direitos civis nos EUA
AP
Martin Luther King fax discurso 'Eu tenho um sonho' no Lincoln Memorial, Washington (28/8/2013)

King começou o pronunciamento em ritmo lento, lendo um texto preparado com antecedência com referências à retórica igualitária da Constituição americana e à Declaração de Independência. Ao fim, falando de improviso, ele comoveu a multidão que o ouvia com uma mensagem de esperança. “Digo a vocês hoje, meus amigos, mesmo que enfrentemos dificuldades hoje e amanhã, eu ainda tenho um sonho. Um sonho profundamente enraizado no sonho americano”, declarou. No trecho espontâneo, ele também se apropriou de versos da canção nacionalista popular "My Country ‘Tis of Thee" (Meu País é de Vocês", em tradução livre).
2011: Martin Luther King ganha monumento de homenagem em Washington
Em 1999, um levantamento feito por pesquisadores da Universidade de Wisconsin-Madison com acadêmicos de renome “elegeu” o discurso de King como o mais importante do século 20. Em 2008, uma pesquisa de opinião pública nos EUA mostrou que apenas 4% dos americanos não conheciam o famoso “Eu tenho um sonho” de King, com 68% dos entrevistados o tendo apontado como relevante para sua geração.
Assista aos principais trechos do discurso de Luther King:

A frase-chave do discurso ganhou o mundo e pode ser encontrada em lugares tão díspares como em murais no subúrbio de Sidney (Austrália), em placas de trem em Budapeste (Hungria), ou em cartazes do Dia da Consciência Negra em São Paulo. Durante os protestos de 1989 na Praça da Paz Celestial, China, alguns manifestantes carregaram pôsteres com a foto de King e os dizeres “Eu tenho um sonho”. No muro que separa Israel da Cisjordânia, recentemente alguém pichou “Eu tenho um sonho. E isto aqui é não é parte do sonho”.
Discurso universal
Segundo o historiador Gary Yougue, autor de dois livros sobre King, a força do discurso reside na possibilidade muito ampla de interpretação, fazendo com que todos (ou quase) concordem com o que foi dito. Embora a luta pelo fim da segregação racial nos EUA tenha sido dura e polarizada, a fala do reverendo conseguiu incluir a todos.
Abril: Campanha por não violência marca 45 anos da morte de Luther King
Mensagem: Obama evoca Martin Luther King para superar batalhas políticas
“Mas não importa a interpretação, o discurso continua sendo a mais eloquente e poética articulação pública da vitória do movimento pelos direitos civis”, afirma Youge em seu livro "The Story Behind Martin Luther King’s Dream" ("A História por Trás do Sonho de Martin Luther King", em tradução livre). Ele lembra que, embora o racismo ainda persista, “ninguém hoje em dia faz seriamente campanha pela volta da segregação ou abertamente lamente seu fim”.
AP
Local exato onde reverendo Martin Luther King Jr. proferiu seu famoso discursos 'I have a dream' (Eu tenho um sonho') é marco no Lincoln Memorial (26/8/2010)

Claro que Martin Luther King Jr. não era a única voz da luta pelo fim da segregação racial, mas simbolizou como ninguém o movimento que mudou os EUA – e, sem dúvidas, era parte central dessa luta, defende o diretor do Instituto de Pesquisa e Educação Martin Luther King Jr., na Universidade Stanford, Clayborne Carson. De acordo com Carson, o discurso em 28 de agosto de 1963 foi um dos pontos altos da onda de protestos dos negros pelos direitos civis.
“A habilidade de atrair a atenção nacional orquestrando confrontos com autoridades racistas, combinada com sua oratória, tornaram King o negro mais influente da primeira metade dos anos 1960”, opina Carson.
Entrevista: Jackie Kennedy não gostava de De Gaulle, Indira Gandhi e Luther King
Após proferir o famoso discurso, King recebeu várias formas de reconhecimento público. Ele foi considerado “o homem do ano” de 1963 pela revista Time. Em dezembro de 1964, ganhou o Prêmio Nobel da Paz. Com tanta notoriedade, foi alvo de escutas do FBI (polícia federal americana), para tentar encontrar fatos que manchassem sua reputação.
Depois de alguns anos, King acabou no ostracismo, mas até sua morte permaneceu comprometido com a defesa da sociedade americana por meio do ativismo não violento.
O tom conciliador, que levou King a ser marginalizado pelo movimento mais tarde, foi o grande mérito do discurso, avalia Adilson Cabral, professor de comunicação e políticas sociais na Universidade Federal Fluminense. “A grande contribuição desse discurso foi propor uma conciliação nacional que incorporasse os negros como efetivos cidadãos americanos, quando havia um clima que poderia levar a uma maior e conflitiva radicalização por parte do movimento negro”, afirmou ao iG .
Veja galeria com imagens da luta pelos direitos civis nos EUA:
Policial tira impressões digirais de Rosa Parks, que se recusou a ceder lugar no ônibus para passageiro branco em Montgomery, Alabama (22/2/1956). Foto: AP
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“Esse discurso deu o tom do movimento ou, ao menos, possibilitou a compreensão de uma via que buscava construir, tanto no imaginário do povo negro quanto na sociedade do país, a perspectiva de uma sociedade sem diferenças no reconhecimento de suas diferenças”, diz Cabral.
Segundo o professor da UFF, o modelo proposto por King tem reflexos até hoje como matriz de construção política reivindicativa. “Não se trata de luta contra-hegemônica por outro projeto de poder, mas de incorporação de outras dimensões de modos de existir e viver em sociedade, que hoje se refletem na luta dos movimentos LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Trangêneros), por exemplo

HISTÓRIA DO BRASIL DE AFRANIO PEIXOTO


HISTÓRIA DO BRASIL DE AFRANIO PEIXOTO

BRASIL, SEM PROVEITO
O Brasil, de permeio, não tinha gentes industriosas, nem produzia nada. Os próprios Padres Jesuítas que haveriam de dizer, como o Padre Nóbrega: “esta terra he nossa empresa”, discutiam preferência no reino, e cuidavam, como refere um deles, Rúi Pereira, “que vir ao Brasil era perder tempo”. (C. Avulsas, p. 263). A Índia é que era. Aonde os hereges endurecidos a confundir? Nenhum interesse, nem temporal nem espiritual. Contudo, Pero Vaz de Caminha achou a primeira utilidade, além da terra a aproveitar e a gente a fazer cristã: é “que hy non ouvesse mais ca teer aquy esta pousada pera este navegaçon de Calecut abastaria” (op. cit., in fine), o que Dom Manuel ratifica, na comunicação aos Reis de Espanha: “la qual (terra) parece que nuestro Senor milagrosamente quiso se halasse, porque es muy conveniente y necessaria para la navigacion de la India, porque alli reparo sus navios é tomo água” (op. cit.). O tempo ensinaria outros proveitos.

Gaspar de Lemos, que tornou a Portugal, de Santa Cruz, a noticiar o descobrimento, foi o primeiro explorador da terra. Seguiu ao longo da costa, para o Norte, até ponto indeterminado do avanço oriental da terra sobre o mar. É o que explica a notícia citada, de Cretico-Pisani, em julho de 1501, à Senhoria de Veneza, dando notícia do descobrimento: “indichino questa terra esser terra ferma, perché corseno per costa duo mila piu ne mais trovorno fin” (Racolta Colombiana, p. III, v. I, p. 44). Se, na ocasião, Cabral já estava de regresso em Lisboa, a exploração, embora exagerada, só podia ter sido feita por Gaspar de Lemos.
Antes, porém, do retorno de Cabral, Dom Manuel mandava terceira armada à Índia, apenas de intuito comercial, comandando João da Nova quatro navios, sendo uma nau por conta de Dom Álvaro de Bragança e outra armada por Bartolomeu Marchioni, o mercador florentino. Partiu a 1.º ou 5 de março de 1501 e tornou a 11 de setembro de 1502. Fez escala pelo Brasil, percorrendo cento e vinte léguas da costa, diz o Cardeal Saraiva(5) e Duarte Leite(6) atribui a informações dessa armada o planisfério de Cantino, de 1502, feito por cartógrafo português e levado ao duque de Ferrara: aí já vem uma nomenclatura de terras brasileiras: a 29 de Abril de 1501 nomeou-se o Cabo de Sam Jorge. Nesse mapa de Cantino já vem descoberta e batizada a Baía de Todos os Santos.
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Megatherium americanum de Jacobina (Bahia)
Col. do Museu Nacional — Rio

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Cerâmica da Ilha do Marajó
Col. do Museu Nacional — Rio

Teria sido visitada pela armada de 1501, da qual fez parte Américo Vespúcio e comandante ignorado, (Fernão de Loronha, para Duarte Leite, op. cit., p. 173, Gonçalo Coelho, para Fortunato de Almeida, Hist. de Port., Coimbra, 1924, t. II, p. 255) que, antes da chegada de Cabral, mandara Dom Manuel a explorar a terra descoberta.
Valentim Fernandes de Moravia, em documento público, de 20 de maio de 1503, diz: “Passados dois anos (de 1500) uma outra armada do mesmo cristianíssimo rei, destinada a esse fim, tendo seguido o litoral daquela terra por quase 760 léguas encontrou nos povos uma só língua, batizou a muitos e avançando para o sul chegou até a altura do pólo antártico, a 53° e tendo encontrado grandes frios no mar voltou à pátria”. Esta viagem de 1502-3 teria sido a em que fora Américo Vespúcio(7), comandada por Gonçalo Coelho (F. de Almeida) ou por Fernão de Loronha (Duarte Leite). Fernandes atesta que o colegiu “mediante a narração de dois homens da terra acima referida e abaixo assinado que durante 20 meses lá moravam e afirmo que tudo isto é verdadeiro pelo que vi e me relataram”. Teriam sido estes dois homens dos quatro que no Brasil ficaram da armada de Cabral (dois degredados e dois grumetes). (Cf. A. Fontoura da Costa — Cartas das Ilhas de Cabo Verde de Valentim Fernandes, 1506-1508, Lisboa, 1939, p. 93.
As coisas teriam passado de outra maneira. Aqui, em 1501 ou 1502, teria estado Fernão de Loronha, que descobrira, a 23 de junho desse ano, uma ilha perto de Santa Cruz, também explorada. Dom Manuel arrendava-lhe as terras exploradas, associado a outros, cristãos novos e ricos, obrigados a mandar todos os anos seis caravelas descobrir 300 léguas de costa anualmente, fazer uma fortaleza mantida nos três anos do contrato: no primeiro ano nada pagariam, no segundo um sexto, no terceiro um quarto; contam trazer brasil e escravos e outras coisas de proveito que achassem. (Carta de Piero Rondinelli, de Sevilha, a 3 de outubro de 1502, in Racolta Colombiana, III p., vol. II, p. 120-1). No mapa de Cantino vem no cotovelo da costa brasileira uma ilha com a inscrição Quaresma, posta por colaborador anônimo. Seria a ilha descoberta por Fernão de Loronha em 1501 ou 1502, da qual fala um diploma de Dom Manuel, doando-lhe a ilha de Sam Joham “que ele hora novamente achou e descobryo cincoenta leguas alla mar de nossa terra de Santa Cruz que lhe temos arrendada”. Essa ilha, chamada Quaresma no planisfério de Cantino, por Loronha S. João, por tê-la descoberto no dia deste santo, foi também chamada S. Lourenço, e, por fim, Fernando Noronha, por corruptela do nome do descobridor.
De passagem para a Índia, uma armada sob o comando de Afonso de Albuquerque, quatro navios, Sant’Iago, São Cristóvão, Espírito Santo e Catarina Dias, toca no Brasil, segundo depõe em carta Giovanni da Empoli, que descreve os selvagens e a escassez de produtos da terra (Racolta Colombiana, Roma, 1893, parte III, vol. II, carta de 16 de setembro 1504: “La nostra partida de Lisbona...” 6 de abril de 1503).
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Carta Quinhentista da Baía de Todos os Santos

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Carta Quinhentista da Baía do Rio de Janeiro

O contrato com Fernão de Loronha estipulava a remessa anual de seis caravelas o que, diz Damião de Góes, “ocorreu no primeiro ano, 1503, despachando Dom Manuel a Gonçalo Coelho com seis naus à terra de Santa Cruz, com que partiu do porto de Lisboa aos dez dias do mês de junho, das quais por terem pouca notícia da terra, perdeu quatro e as outras duas trouxe ao reino com mercadorias da terra, que então não eram outras que o pau vermelho a que chamavam brasil, bugios e papagaios”. (Crôn. de El-Rei D. Manuel, p. 1, cap. LXV, fl. 65). Vespúcio teria volvido nesta armada. Para exploração e tráfico dividir-se-ia em dois grupos, e Vespúcio, feitor de Marchioni, diz Duarte Leite, teria ficado ao norte, nada nos podendo informar dos descobrimentos de Gonçalo Coelho, a que não assistiu. Vespúcio teria rumado à baía de Todos os Santos descoberta na sua precedente viagem, teria construído um fortim em Porto Seguro, não passara porém de Cabo Frio e, carregado, tornara a Lisboa, crendo que seu comandante Gonçalo Coelho se perdera, vítima de “sua muita soberba”.
Foi Gonçalo Coelho, para Duarte Leite, que, “calendário na mão”, foi dando os nomes que Varnhagen atribuirá a Vespúcio, na viagem anterior: “perfeita concordância cronológica e topográfica que falta a análoga de Varnhagen e liberta de outros vícios.” (op. cit., 182). A saber:
Angra de São Roque — 16 de agosto.
Santa Maria da Arrábida.
Cabo de Santo Agostinho — 28 de agosto.
Rio das Onze Mil Virgens — 21 de outubro.
Rio de São João (de Tiba) — 14 de novembro.
Ilha de Santa Bárbara — 4 de dezembro.
Rio de S. Luzia — 13 de dezembro.
Serra de S. Tomé — 21 dezembro.
Cabo Frio —
Angra dos Reis — 6 de janeiro.
Rio Jordão — 13 de janeiro.
Rio de S. Antão — 17 de janeiro.
Porto de S. Sebastião — 20 de janeiro.
Porto de S. Vicente — 22 de fevereiro.
Pináculo da Tentação — 25 de fevereiro.
Rio da Cananea — 29 de fevereiro.

“Varnhagen quere — diz Duarte Leite — que o Rio de Janeiro fosse descoberto a 1 de janeiro de 1501, mas engana-se no ano e talvez no dia, pois na hipótese era natural escolher-se o nome de rio de ano bom”. “Joaquim Caetano da Silva e Varnhagen ignorando (como nós) quando Coelho regressou a Portugal, imaginaram-no estacionado durante anos no Rio de Janeiro, onde fez arraial: fundavam-se principalmente em que o mapa Kunstmann II, nas vizinhanças da Guanabara, inscreve Piñachullo detetio, onde leram Coelho detentio. É fantasia pura: a verdadeira lição, transtornada pelo cartógrafo italiano, é Pináculo da tentação (assim no Mapa anônimo de Turim, de 1523), nome imposto a um alto monte a 25 de fevereiro de 1504, pois a este dia se refere o evangelho de S. Mateus à tentação de Cristo no cume de uma elevada eminência. Dos evangelhos saíram também os nomes dos rios de Jordão e de Cananéa, o primeiro imposto em 13 de janeiro, quando se celebra o batismo de Cristo no rio Jordão; e o segundo em 29 de fevereiro, dia de 1504 em que se comemorou o encontro de Cristo com a mulher de Cananéa, cuja filha milagrosamente sarou” (op. cit. p. 183). (Também Wieser [op. cit.] e o Barão do Rio Branco [Esquisse de l’histoire du Brésil] por motivos, paleográfico um, outro lingüístico, discordam de Varnhagen neste ponto). Deve-se dizer que o sistema de identificar os descobrimentos portugueses pela folhinha, desde Frei Gaspar da Madre de Deus (Memórias para a história da Capitania de S. Vicente, S. Paulo-Rio, 1920, p. 116-19) é às vezes precário: por ele Gaspar Corrêa errou a data do descobrimento do Brasil... Hümmerich afirma, por ele ainda, que a 18 de maio de 1502 foi descoberta, — pela armada de D. Estêvão de Gama, (cinco navios atrasados da esquadra de Vasco da Gama, na sua 2.ª viagem) em trânsito para a Índia, — a Ilha da Trindade.
A 22 de Setembro de 1502(8) chegara a Lisboa o primeiro carregamento de pau-brasil, a que se deu o preço de dois cruzados ou 400$000 nossos, por arroba. Também peles de animais, bugios, papagaios, algodão, pimenta da terra, começaram a ser apreciados. Talvez já alguma especiaria. O P.e Antônio Vieira, em carta de 1675, escreveu: “em tempo de el-rei D. Manuel e logo no princípio dos descobrimentos do Brasil, transportaram os Portugueses para lá algumas plantas da Índia e entre elas a da pimenta, as quais muito prosperaram; mas que julgando el-Rei, que esta cultura viria a prejudicar os interesses do comércio oriental, mandara arrancar as novas plantas, e proibira, sob graves penas, a sua cultura, que assim se executou, escapando tão somente a este mal pensado extermínio o “gengive”, que, por ser raiz, se meteu por debaixo da terra, e não pôde ser extinto”. (Cartas, ed. J. Lúcio de Azevedo, Coimbra, 1928, t. III, p. 147).
Com os Portugueses de Fernão de Noronha começaram, antes de 1504, a concorrer navegantes Franceses; estes entraram em entendimento com os Índios, que lhes chamavam “Mairs” para os distinguir dos Lusitanos, a quem chamavam “Peirós”. O brasil era o interesse da terra, além das curiosidades dos mesmos índios, que não custavam a embarcar, supondo ir, com eles, ao céu(9). Para estes Franceses a nova terra era designada pelo seu produto, terre du brésil, donde, por menor esforço, le brésil ou le Brésil, como vieram a chamar-lhe. Os Portugueses, diz Varnhagen, chamavam “brasileiros” aos que tiravam e se ocupavam com o brasil, como baleeiros se diz dos que pescam baleias, negreiros dos que fazem o tráfico dos negros: o gentílico substituir-se-ia ao epíteto profissional (o mesmo dar-se-ia com os “mineiros”). Estaria assim, desde aí, antes de 1504, admitido o Brasil e os Brasileiros, que depois viriam à escrita e à geral admissão. No seu Esmeraldo, começado a escrever em 1505, Duarte Pacheco já escrevia “as gentes que habitam na terra do Brasil”. .. (op. cit., cap. II, 2.º 1.).
Portugal soube logo dessas incursões francesas. Binot Paulmier de Gonneville, em 1505, depôs perante o Almirantado de Normandia ter estado no Brasil, região que os navegantes de Dieppe e St. Malo freqüentavam. Anchieta escreveu: “Na era de 1504 vieram os Franceses ao Brasil a primeira vez ao porto da Baía e entraram em Paraguassú” (Cartas, cit. p. 310). D’Avezac publicou documentos relativos ao navio “Espoir”, de Honfleur, comandado por Binot Paulmier de Gonneville, que aqui esteve em 1504 (Annales de voyages, Paris, 1869). Em 1509 foram levados a Ruão sete índios do Brasil. Dom Manuel protestou, junto à Corte de França, contra armadores e corsários, que escapavam à mesma jurisdição do seu país, e foi levado, ao cabo de transigências e reclamações vãs, à vindita armada contra esses intrusos.
Em 1508 coloca-se a aventura de João Ramalho, o aventureiro de S. Paulo que veremos adiante. Dele disse Tomé de Sousa a el-Rei D. João III, que Martim Afonso aqui o achara: Varnhagen (op. cit., t. I, p. 115-6) apura que era o homem que há 60 anos aí estivera em 1568, segundo depôs em carta o P.e Baltasar Fernandes, escrita por comissão de Anchieta: (1568 -60=1508).
Em 1509 ou 1511 será a de Diogo Álvares, de Viana, o “Caramurú” dos índios, náufrago nas costas da Baía, a quem a lenda emprestou uma espingarda, com que assombrou os íncolas: depois a lingüística interveiu e o “caramurú” foi assimilado à moreia grande, peixe entocado nas pedras, comparado ao náufrago encontrado entre os rochedos do Rio Vermelho. (Um neto, descobridor das minas de Itabaiana, traduzira no próprio nome a alcunha avoenga, Belchior Dias Moreia). D. Rodrigo de Acuña achou na Baía, em 1526, um cristão que havia 15 anos aí estava, de uma nau perdida (Navarrete, Collecion de los Viages y descubrimientos, Madrid, 1837, t. V, p. 170, nota 231: deve ter sido o Caramurú, diz-nos Rodolfo Garcia; portanto 1526-15=1511. Mas, no Roteiro de Pero Lopes [cf. Hist. de Colon. Port., cit. t. III, p. 143] se diz de “hu homem portuguez q avia xxij (22) anos q estava nesta terra” e seria o Caramurú, dissera Varnhagen. Portanto 1531-22=1509. Portanto ainda, 1509 ou 1511). Diogo Álvares conseguiu boas relações com os Índios, casando com a filha dum cacique, chamada Paraguassú. A tradição deu-lhe o nome de Catarina, mas Frei Vicente do Salvador, que ainda a alcançou “viúva, mui honrada, amiga de fazer esmola aos pobres e outras obras de piedade”, dá-lhe o nome de Luíza (Hist. do Brasil, l. III, cap. I). Diogo Álvares e os seus habitavam onde é hoje o bairro da Graça e seria próximo da Barra, ou arraial do Pereira (nome do donatário Francisco Pereira Coutinho) a “Vila Velha”, substituída, em 1549, pela cidade nova, a Baía de Tomé de Sousa, fundada no interior da baía de Todos os Santos. (Diogo Álvares inspirou o poema de Santa Rita Durão “O Caramurú”, onde vem a lenda de Moema, balbucio do romantismo nacional).
Publicou Varnhagen o “Llyuro da naao bertoa que vay para a terra do brazyll... que partio deste porto de Lixª (Lisboa) a 22 de fevº (fevereiro) de 1511”. Essa nau Bretoa (houve mais de uma com tal nome em Portugal, o que presume ter sido construída na Bretanha, terra de marítimos), foi armada por Bertolomeu Merchioni (de Bertô-lomeu não se faria Bertoa?), Benedito Moselli, Fernão de Loronha e Francisco Martins, e mandada a Cabo Frio: partiu do Tejo a 22 de fevereiro, fundeou a 12 de maio na baía de Todos os Santos, a 26 chegou a Cabo Frio, carregou e a 28 de julho tornou para Portugal, conduzindo cinco mil toros de brasil, vinte e dois tuins, dezasseis sagüins, dezasseis gatos, quinze papagaios, três macacos, tudo avaliado em 4$220 (ou 2:110$000 de hoje), e 40 peças de escravos, mulheres na maioria, avaliados ao preço médio de 4$000 (2 contos de hoje). Crê Varnhagen que os Índios foram “resgatados” legitimamente, isto é, trocados por facas, machados, espelhos, cascavéis e avelórios, artigos de resgate, como se chamava e se praticava em África. Dessa viagem fizera parte João Lopes de Carvalho, que demorara quatro anos no Rio, havendo um filho de uma índia e tornando ao Brasil, como um dos pilotos de Fernão de Magalhães.
Em 1512, será a viagem da caravela de Cristóvão de Haro que em requerimento de 1519 lembrava “puede haber seis años poco más ó menos”, armou a embarcação em Lisboa para resgate no Brasil: Estêvão Fróes, que a comandava, foi levado do Brasil a Porto Rico, pelos ventos, onde foi preso pelos Espanhóis e daí pediu proteção a el-Rei. (“As datas concordam”, diz J. F. de Almeida Prado, Primeiros Povoadores do Brasil 1500-1530, São Paulo, 1935, p. 53, as da viagem de Fróes e a dos dizeres do requerimento).
Refere-se Damião de Góes (Crônica del-Rei Dom Manuel, p. I, cap. LVII, fl. 56, verso) a Jorge Lopes Bixorda que, em 1513, tinha o trato do “pau-brasil” e viera falar a el-Rei trazendo três índios frecheiros, cujas habilidades o cronista viu.
Será de 1514 a viagem de Dom Nuno Manuel e Cristóvão de Haro, mercador de Burgos e Antuérpia, então ao serviço de Portugal, os quais armaram um navio, levando por piloto a João de Lisboa, o outro da Coroa, pois dela será notícia a Gazeta Alemã, datada desse ano, segundo o manuscrito achado por Haebler nos arquivos do Príncipe Fugger, em Augsburgo. A Zeitung aus Presilig Landt é um fólio escrito da Madeira para Antuérpia, por feitor de alguma casa importante, com as notícias da terra do Brasil. O “Nono”, do documento, foi, por Capistrano, identificado a D. Nuno Manuel. (Cf. Clemente Brandenburger, A nova gazeta da terra do Brasil, S. Paulo, Rio, 1922).
Em 1515 João Dias de Solis, dito Bofes de Bagaço, piloto português (cf. Varnhagen, nota de Garcia, op. cit., t. I, p. 122), criminoso e refugiado em Castela, a primeira vez pelo roubo de uma caravela, a segunda porque matara a mulher no reino, tendo a Espanha aproveitado os seus serviços, vai descobrir o Rio da Prata, tocando no Brasil entre os Cabos de São Roque e Santo Agostinho, que avista, buscando Cabo Frio; e, pelo Rio de Janeiro e Cananéa, tocando para diante, descobre o estuário do grande rio do sul. Aí mataram-no os índios em que se fiara e os companheiros rumaram ao norte, carregando brasil e tomando onze portugueses de uma feitoria de Pernambuco. Ao protesto de Portugal, Castela troca esses prisioneiros por sete espanhóis, presos na baía dos Inocentes, ao norte de Cananéa.
Varnhagen cita, em 1516, a solicitude de Portugal pelo Brasil, mandando, por alvará ao feitor e oficiais de Casa da Índia, que dessem “machados e enchadas e toda a mais ferramenta às pessoas que fossem a povoar o Brasil”. Por outro alvará, ordem ao mesmo feitor e oficiais que “procurassem e elegessem um homem prático e capaz de ir ao Brasil dar princípio a um engenho de açúcar; e que lhe desse sua ajuda de custo e também todo o cobre e ferro e mais cousas necessárias” (op. cit. p. 106). Também o espiritual não era descurado: a bula do Pontífice Leão X, de 1514, tornava as novas terras sufragâneas do bispado de Funchal, na Madeira. O bispado do Funchal foi o primeiro de que, depois da vigararia de Tomar, sede do Mestrado de Cristo a que pertenciam as novas terras, e consideraram espiritualmente dependentes os primeiros colonos e índios cristãos do Brasil(10).
Em 1516, diz ainda Varnhagen, haviam chegado tais notícias das suas navegações (dos Franceses) no Brasil, que el-Rei Dom Manuel mandava por agentes seus representar contra elas à Corte de França. A primeira viagem de Cristóvão Jacques, neste ano, de reconhecimento à costa do Brasil, prende-se à necessidade de conhecer os meios de vencer os corsários franceses, que infestavam o litoral, e punham em perigo a própria soberania de Portugal(11). Nessa viagem Cristóvão Jacques gastou os dias que vão de 21 de junho de 1516 a 9 de maio de 1519, dois anos, dez meses e dezoito dias, fundando uma feitoria em Pernambuco, explorando o sul de Santa Catarina ao Rio da Prata. (Cf. Esteves Pereira, História da Colonização Portugueza do Brasil, cit. t. II, p. 361-4). Esse Capitão virá a ser enviado em expedição decisiva mais tarde, a dar caça aos intrusos.
O fato mais importante de que em seguida temos notícia é a viagem de circunavegação de Fernão de Magalhães, que tocou no Brasil, de rota para o Sul, entrando no Rio de Janeiro(12) a 13 de dezembro de 1519, dia de Santa Luzia, donde o dar à baía essa invocação. Diz Gaspar Corrêa (op. cit. II, 628): “Partiu-se das Canárias de Tenerife e foi demandar o Cabo Verde, donde atravessou a Costa do Brasil e foi entrar em um rio que se chama Janeiro. Ia por piloto-mor um português chamado João Lopes Carvalhinho, o qual neste rio já estivera e levou um filho que aí fizera em uma mulher da terra e daí foram navegando até chegarem ao Cabo de Santa Maria.” Pigafetta, o escrivão do périplo, diz que João Lopes de Carvalho, “nosso piloto”, passara quatro anos no Brasil; referiu-lhe os costumes de antropofagia dos aborígenes, e, certamente, as palavras regionais, os 12 primeiros americanismos apontados: rei, cacique; bom, tum; casa, boi; cama (rede), hamac; pente, chipag; foca, tarsi; chocalho, itanimaracá; tesouras, pirame; anzol, pindá; milho, maiz; farinha, auí (13). (Francisco António Pigafetta, Viagem ao redor do mundo, ed. de Carlos Amoretti, trad. em francês do manuscrito que possui a Ambrosiana, de Milão).
Às reclamações de Dom Manuel, em 1516, a Francisco I, por seu embaixador Jácome Monteiro, sucederam as de Dom João III por João da Silveira, relativas às tomadas de naus por Franceses, em 1521; em 26 Silveira comunicava que uma armada de dez navios se aprestava para outra agressão. Foi então nomeado o “Governador das partes do Brasil”, sucessor de Pero Capico, “Capitão de uma das Capitanias do dito Brasil” (prova de que havia mais de uma, diz muito bem Varnhagen), cujo tempo terminara e que queria recolher-se ao reino. Assim, diz Fr. Luiz de Sousa: “No mesmo (ano de 26) despachou El-Rey (D. João III) a primeira armada que foy em seu tempo ao Brasil; Capitão-mor Cristóvão Jacques. Foy correr aquela costa e alimpalla de cossarios, que com teyma a continuavão pollo proveito que tinhão do pau brasil. E erão os mais dos portos de França do Mar Oceano” (Anais de El-Rei D. João Terceiro, Lisboa, 1844, p. 178).
No fim do ano estava Jacques na costa do Brasil, fundeado no canal que separa a ilha de Itamaracá do continente, onde fundou uma feitoria, a de Pernambuco, bem necessária à defesa da região, por muito freqüentada pelos Franceses, que chegaram a chamar, ao brasil, bois de Pernambouc. Desse pau carregou a nau, enviada ao reino e, com cinco caravelas, endireitou rumo do sul, a percorrer a costa. Na baía de Todos os Santos, diz a tradição que, na ilha dos Franceses, à foz do Paraguassú, encontrou três navios bretões, que faziam carregamentos, e com eles travou peleja, vencendo-os, e fazendo trezentos prisioneiros, que levou à feitoria de Pernambuco. Recolhido ao reino, além dos prisioneiros e carga, levou Cristóvão Jacques noções da terra explorada, propondo-se a colonizador, e oferecendo-se para tornar ao Brasil com mil colonos. Francisco I reclamaria, contra o dano sofrido, indenizações e, não atendido, assinava carta de corso, contra Portugal, a João Angô.
As idéias de colonização de Cristóvão Jacques tiveram o apoio de Diogo de Gouveia, sábio teólogo, reitor do Colégio de Sainte Barbe em Paris e, depois, da Universidade de Bordéus, que escreveu a el-Rei, em reforço desse povoamento por capitanias. Mas a idéia não amadurecera no ânimo de D. João III.
Em 1530 parte uma expedição comandada por Martim Afonso de Sousa, para reconhecimento do Brasil, exploração e defesa da costa, e primeiro estabelecimento de sesmarias, a quem as pedisse. Seria evolução para as capitanias hereditárias, que não eram novidade, já existentes na Madeira e nos Açores. Com Martim Afonso veio seu irmão Pero Lopes de Sousa, a quem se deve a obra memorável de um Roteiro da Costa do Brasil.
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Capitão de nau portuguesa do século XVI, segundo uma escultura do British Museum, Londres.]

A 31 de Janeiro de 1531 estavam diante do Cabo de Santo Agostinho e já na costa de Pernambuco; encontrando navios franceses deram-lhes caça, tomando três, um queimado, outro enviado ao reino carregado de brasil, o terceiro encorporado à armada, que ia a caminho do Rio da Prata. Na Bahia foram acolhidos por Diogo Álvares, o Caramurú, e Pero Lopes achou, das baianas, que “eram mui fermosas e não haviam nenhuma inveja às da rua Nova, de Lisboa”. (Diário de Navegação, ed. de E. de Castro, Rio, 1927, p. 154). Depois no Rio de Janeiro, (p. 174) onde se demoraram, fizeram desembarque(14) e exploração, terra a dentro: “a gente deste rio é como a da Baía de Todos os Santos, senão quanto é mais gentil gente”, diz ainda Pero Lopes. Do Rio foram a Cananéa; em terra encontraram um bacharel português, (p. 205), que “havia trinta anos que estava degredado” e por aí vivia. Tocando para o Sul, foram vítimas de pampeiro e tempestade, à foz do Chui, destacando Martim Afonso a Pero Lopes e outros destemidos para explorarem o Rio da Prata, subindo o Paraná e Uruguai.
Martim Afonso tornara do sul a S. Vicente, onde fundou a colônia, que tão famosa veio a ser, núcleo de povoação dessas partes e ponto de penetração do litoral ao sertão. Aí encontraram o português João Ramalho, o Caramurú de S. Paulo, há longos anos domiciliado na terra, aliado com o gentio e genro do cacique Tibiriçá. Na colônia interior de Piratininga, João Ramalho assumiria mando e governo. As colônias prosperaram, as sementes trazidas do Reino vingaram, a cana de açúcar foi plantada e daria para o primeiro engenho. Pero Lopes que, tornado, assistira e colaborara na fundação das duas vilas, relata a civilização pegava de galho nestas regiões do sul do Brasil: “repartiu (o Capitão-mor) a gente nestas duas vilas e fez nelas oficiaes; e poz tudo em boa ordem de justiça; do que a gente toda tomou muito consolaçom com verem povoar vilas e ter leis e sacrificios, e celebrar matrimonios e viverem em comunicaçam das artes; a ser cada um senhor do seu; e vestir as injurias particulares; e ter todos outros bens de vida segura e conservavel.“ (Op. cit., p. 342).
CAPITANIAS
Esta experiência, corroborando as opiniões manifestadas anteriormente, sobretudo a tenacidade e amplitude que os Franceses estavam dando a suas empresas de corso no litoral brasileiro, provocaram nova insistência de Diogo de Gouvêa, e el-Rei decidiu-se a criar as capitanias do Brasil. Vimos que algumas já existiam sem sistema, e já aludimos ao sistema, que vingara na Madeira. Desde 1433 que Dom Duarte ratificara ao irmão, a doação de D. João I ao Príncipe Dom Henrique. Este dividira a dádiva em duas capitanias, a de Funchal e a de Machico. A doação é válida pela vida do soberano: Afonso V corrobora na doação, ao tio. O mesmo acontecerá à sucessão do Infante Navegador. Dom Manuel doou a Fernão de Loronha a capitania da ilha de S. João, que ele descobrira. Falou-se em sistema feudal: Alexandre Herculano combateu tal idéia; Portugal, que não conheceu o feudalismo, na sua época, não iria reinventá-lo tardiamente. Como tudo é pretexto a controvérsia, discute-se... O rei guarda a jurisdição, o cunho de moeda, e a prestação do serviço militar; apenas a capitania vem a ser hereditária, para justificar e promover o zelo e o emprego de capitais, de outra maneira sem compensação. No Brasil a Coroa reservou o monopólio do pau-brasil, das especiarias, drogas e escravos, o quinto dos metais preciosos e o dízimo de todos os produtos da terra. Os donatários não batem moeda, não têm soldados, nem julgam os criminosos.

Entretanto Diogo de Gouvêa alvitrara em 1529 ao irmão do Capitão de São Miguel, João de Melo da Câmara e a Cristóvão Jacques, que se propunham a povoar o Brasil com dois mil moradores, um, e mil, o outro. Em 32, insiste, dizendo a el-Rei: “E se vos estorvaram, senhor, por dizerem que enriqueciam muito. Quando vossos vassalos forem ricos, os reinos não se perdem por isso, mas se ganham...” (Essa razão não procede só no Brasil colonial, mas continua no independente: o ganho possivel de alguns ativos é impedido pela passividade ciumenta de todos: capitanias, ferro, petróleo. ..).
Martim Afonso, ainda em Pernambuco, recebia a notícia de divisão do Brasil em grandes capitanias, demarcadas, de muito ao norte de Pernambuco ao Rio da Prata, cinqüenta léguas de costa a cada capitania, apartadas logo cem léguas para o Capitão-mor e cinqüenta para o irmão Pero Lopes, que depois teve três quinhões. A resolução foi de 32, as primeiras doações a 33, os diplomas a partir de 34. El-rei confessa a Martim Afonso que não o esperou, para a deliberação, não só porque ”algumas pessoas me requeriam capitanias”, como “algumas partes faziam fundamento de povoar a terra do dito Brasil e seria grande trabalho lançar fora a gente que a povoasse depois de estar assentada na terra e ter nela feitas algumas forças, como já em Pernambuco começava a fazer”... Não foi deliberação, senão homologação. Pelo menos, faze, antes que façam. E foi feito. A colonização fazia-se, sem sistema: tinha agora um sistema. Os primeiros donatários foram:
Martim Afonso de Sousa, dois quinhões, de doze léguas abaixo de Cananéa, até pouco acima de Cabo Frio. Só a parte de S. Vicente foi colonizada, servindo de núcleo as duas vilas fundadas anteriormente, de S. Vicente e Piratininga. A cana de açúcar trazida para aí, da Madeira (Gabriel Soares diz que viera primeiro de Cabo Verde para os Ilhéus) deu o primeiro engenho de açúcar, que chegou a ser próspero, sob o nome engenho dos “Erasmos”, de uma firma de ricos homens de Flandres, Erasmo Schetz, a cujos feitores se refere Anchieta. Na futura vila de Santos, junto a S. Vicente, Braz Cubas estabeleceu o primeiro monjolo, ou engenhoca, de pilar cereais.
Pero Lopes de Sousa teve três quinhões separados: Sant’Ana, de Paranaguá a Laguna, não colonizado; Santo Amaro, da barra de Santos à ponta do norte do canal da ilha de S. Sebastião; Itamaracá que ia do rio Igarassú a Paraíba: ao todo somavam 80 léguas de costa. Tanto este, como o irmão, geriram por delegados.
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Demarcação das Capitanias

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Carta Quinhentista de São Vicente e Santos