Eu não sei há quanto tempo já que estou aqui. Perdi
a consciência da vida e espaço, na letargia de espera, felicidade calma,
apática tristeza. Nem sei mesmo onde estou, entre essas imensas árvores, onde
os verdes pássaros gritam, os silvestres silvam, estilete no silêncio morno do
calor úmido do mormaço da tarde.
Em frente, o lago dourado se abre, largo, sinistro,
sem nome. Minha companheira pesca, ela está imóvel, como estátua nua no ar, levantada
a lança.
Talvez eu já esteja louco, isolado aqui há muitos
anos.
Talvez não.
O mundo desapareceu, mudou-se, fechou-se. O tempo
morto, lembranças mortas, espaço morto, verde incompreensível.
Por que de nada me lembro ou de nada me quero lembrar além da espera da morte, da
guerra final.
Quando o
som de arco perfura, sei que ela não
erra. Ela é jovem, bela, ombros largos, pernas longas, barriga torneada.
Está aqui há algum tempo, silenciosa, atenta,
misteriosa, meiga. Perigosa. Protetora, amante ou inimiga, não sei. Os velhos permitiram
que ela ficasse comigo, não sei por quê. Acho que ela pediu, quando apareceu. Ficou.
Vieram depois guerreiros, dias depois, buscá-la.
Ela não foi, gostou de mim, fizemos sexo, selvagem e louco.
Eles desapareceram. Nem olharam para mim.
Agora Jara é atalaia, está aqui para alertar sobre
aproximação do exército inimigo. Será mesmo que virá o exército inimigo? Talvez
Jara esteja planejando matar-me. Talvez eu seja o seu inimigo. Mas minha letargia,
minha apatia, minha indiferença faz Jara permanecer em paz.
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