sexta-feira, 3 de junho de 2016

A PANTERA 14 DE ROGEL SAMUEL

14. A PANTERA (Rogel Samuel)

Foi quando chegou o lama tibetano, Korchen Tulku.
-Tashi Delek! – falou.
Sorridente como sempre, sábio, humilde, morava num quarto sórdido sem banheiro, onde cozinhava num fogareiro a querosene. O quarto todo rescendia a querosene e a tinta. Ele era pintor, excelente pintor de thankas detalhadas e minuciosas. 
Korchen Tulku era um gênio da pintura de deidades. Depois de estudar, praticar, ele as pintava como as visualizava. No seu quarto havia nas paredes os grandes painéis dos 16 Aharats, em tamanho real. A grande obra estava inconclusa, à espera de um patrocinador. 
Korchen Tulku vinha buscar-nos para ir a Parping, montanha próxima, visitar os lugares santos daquela montanha.
Fomos de táxi até certo lugar onde pegamos um ônibus.
Dali só a pé.
No caminho encontramos um tibetano que tinha acabado de descer do Tibet e tentava vender alguns objetos pessoais.
Eu logo me interessei por uma purba, que é uma adaga, um punhal ritual, do rito de Vajrakylaia.
- Quanto custa, eu perguntei.
Ele respondeu em rúpias nepalesas. 
Eu não tinha suficientes rúpias comigo, ainda que fosse um preço irrisório.
Não comprei. Saímos, fomos à montanha, passamos o dia todo lá. No fim do dia estávamos de volta no mesmo lugar, para esperarmos o ônibus de Katmandhu.
O tibetano continuava lá. Era um tibetano jovem e sorridente. Fui vê-lo. Lá, ele me deu a purba.
- É um presente para você, disse-me ele.
Eu não podia aceitar. 
Peguei a purba e fui até ao lama, onde pedi emprestado as rúpias.
Voltei e paguei aquele homem.
Senti que era meu irmão.


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