QUE IMPORTA O AREAL E A MORTE E A DESVENTURA?
Rogel Samuel
A leitura do romance histórico de Aydano Roriz, «O Desejado», me fez reler a terceira parte da MENSAGEM de Fernando Pessoa.
'Sperai! Cai no areal e na hora adversa
Que Deus concede aos seus
O romance me surpreendeu. Em vários pontos.
O autor diz que o jovem rei era hermafrodita, e por isso não se casou.
Seu cadáver foi embalsamado em Marrocos, e anos mais tarde resgatado por Felipe de Espanha.
Oh, tudo é mistério, e não «haverá rasgões no espaço / que dêem para outro lado»...
Romance intrigante, momentos de rara beleza. Mas volto ao mito. Prefiro o mito.
Sou, a meu modo, um sebastianista (mais seria se não fosse, para tanto viver tão curta a vida...). Por isso Camões entregou seu poema a D. Sebastião.
O jovem rei, no livro, é rapaz extremamente religioso, pudico, puritano, se delicia a matar porcos na cozinha, a assistir às sessões de tortura, ao suplicio dos condenados. Havia condenados pelos mais extremos e hediondos crimes, como o crime da masturbação, por exemplo.
A obsessão do rei em matar-mouros lembra certo presidente de nação distante, hoje. Conflito que vem de longe, entre nossa boníssima e caridosa civilização cristã e a dos cruéis árabes pagãos. Mas:
Triste de quem vive em casa,
Contente com o seu lar,
Sem que um sonho, no erguer de asa
Faça até mais rubra a brasa
Da lareira a abandonar!
Devemos a D. Sebastião o nome da nossa cidade do Rio de Janeiro.
Quem vem viver a verdade
Que morreu D. Sebastião?
Talvez seja Mito.
Prefiro o Mito.
«No imenso espaço seu de meditar,
Constelado de forma e de visão,
Surge, prenúncio claro do luar,
El-Rei D. Sebastião».
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