AMAZÔNIA: O VALOR DA GENUÍNA FICÇÃO
AMAZÔNIA: O VALOR DA GENUÍNA FICÇÃO
NEUZA MACHADO
O valor histórico dos textos de Euclides da Cunha é inestimável. Os textos, sobre a realidade amazonense do início do século XX, são deliberadamente elaborados (não há como contestar a capacidade discursiva do escritor), há ali a marca dos que sabem escrever e transmitir pensamentos e conhecimentos em forma de narrativa, mas, reafirmo, não há o “desconforto” verticalizante do texto artístico (a possibilidade de o leitor interagir com os cogitos superiores do escritor). Por exemplo, a Ilha de Marapatá, para Euclides, é o “mais original dos lazaretos ─ um lazareto de almas! Ali, dizem, o recém-vindo deixa a consciência...” (CUNHA, Euclides. Terra Sem História: Amazônia. À Margem da História. São Paulo: Martin Claret, 2006: 28) . Esta horizontal informação de Euclides não atinge o cogito reflexivo do leitor, em outras palavras, não promove a “eternização” literária do lugar, mesmo que demonstre textualmente que a Ilha de Marapatá é o espaço da angustiante solidão. No entanto, o Pós-Moderno/Modernista de Primeira Geração Mário de Andrade recebeu a informação, com certeza por via euclidiana, avaliou-a, e soube transformá-la em ficção-arte. Com sua capacidade de interagir criativamente com as palavras, Mário de Andrade obsequiou os leitores de seu presente histórico (e os do futuro) com uma lendária Ilha de Marapatá, onde seu personagem Macunaíma havia deixado a consciência ao sair para o espaço universal.
Rogel Samuel foi além: informou-se intelectualmente, viu os problemas e as virtudes de perto (problemas e virtudes amazonenses que sempre fizeram parte de sua vida), pensou e repensou o espaço de concepção de sua obra ficcional e o transformou em singularíssima narrativa. A Grandeza do Mítico-Ficcional (não é o mítico da epopéia em versos), a Floresta Imensurável, o Igarapé do Inferno como Limite do Fim do Mundo, todos os símbolos transmutativos que vigoram e se revigoram no discurso narrativo de Rogel, a partir de sua criativa intuição, desvelam gradativamente a Floresta Mítica (e a Cidade Manaus ou todas as Cidades do Mundo); descobrem-na (a Floresta), enquanto dimensão de normas capitalistas, rodeada nestes tempos pós-modernos por um arcabouço mítico. O amoroso olhar do escritor, nascido e criado ali, conhecedor de todas as frestas e sinuosidades do lugar, “olhar atuante” auxiliado por sua influente mão de criador ficcional e por um terceiro cogito singularíssimo, mapeou, horizontalmente e verticalmente, a Grande Floresta Amazonense e a Cidade de seu nascimento, oferecendo-lhes vida ficcional (a verdade da ficção), por meio de uma singular imaginação dinâmica, duradoura.
MACHADO, Neuza. O Fogo da Labareda da Serpente: Sobre O Amante das Amazonas de Rogel Samuel
NEUZA MACHADO
O valor histórico dos textos de Euclides da Cunha é inestimável. Os textos, sobre a realidade amazonense do início do século XX, são deliberadamente elaborados (não há como contestar a capacidade discursiva do escritor), há ali a marca dos que sabem escrever e transmitir pensamentos e conhecimentos em forma de narrativa, mas, reafirmo, não há o “desconforto” verticalizante do texto artístico (a possibilidade de o leitor interagir com os cogitos superiores do escritor). Por exemplo, a Ilha de Marapatá, para Euclides, é o “mais original dos lazaretos ─ um lazareto de almas! Ali, dizem, o recém-vindo deixa a consciência...” (CUNHA, Euclides. Terra Sem História: Amazônia. À Margem da História. São Paulo: Martin Claret, 2006: 28) . Esta horizontal informação de Euclides não atinge o cogito reflexivo do leitor, em outras palavras, não promove a “eternização” literária do lugar, mesmo que demonstre textualmente que a Ilha de Marapatá é o espaço da angustiante solidão. No entanto, o Pós-Moderno/Modernista de Primeira Geração Mário de Andrade recebeu a informação, com certeza por via euclidiana, avaliou-a, e soube transformá-la em ficção-arte. Com sua capacidade de interagir criativamente com as palavras, Mário de Andrade obsequiou os leitores de seu presente histórico (e os do futuro) com uma lendária Ilha de Marapatá, onde seu personagem Macunaíma havia deixado a consciência ao sair para o espaço universal.
Rogel Samuel foi além: informou-se intelectualmente, viu os problemas e as virtudes de perto (problemas e virtudes amazonenses que sempre fizeram parte de sua vida), pensou e repensou o espaço de concepção de sua obra ficcional e o transformou em singularíssima narrativa. A Grandeza do Mítico-Ficcional (não é o mítico da epopéia em versos), a Floresta Imensurável, o Igarapé do Inferno como Limite do Fim do Mundo, todos os símbolos transmutativos que vigoram e se revigoram no discurso narrativo de Rogel, a partir de sua criativa intuição, desvelam gradativamente a Floresta Mítica (e a Cidade Manaus ou todas as Cidades do Mundo); descobrem-na (a Floresta), enquanto dimensão de normas capitalistas, rodeada nestes tempos pós-modernos por um arcabouço mítico. O amoroso olhar do escritor, nascido e criado ali, conhecedor de todas as frestas e sinuosidades do lugar, “olhar atuante” auxiliado por sua influente mão de criador ficcional e por um terceiro cogito singularíssimo, mapeou, horizontalmente e verticalmente, a Grande Floresta Amazonense e a Cidade de seu nascimento, oferecendo-lhes vida ficcional (a verdade da ficção), por meio de uma singular imaginação dinâmica, duradoura.
MACHADO, Neuza. O Fogo da Labareda da Serpente: Sobre O Amante das Amazonas de Rogel Samuel
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