domingo, 23 de abril de 2017

A SABEDORIA DO ANDAR



A SABEDORIA DO ANDAR

Rogel Samuel


Tivesse tempo, talento, saber, escreveria um livro de auto-
ajuda intitulado ' A sabedoria do andar'.
Como caminhar cidades.
Há cidades de caminhar. 
Paris, é claro. 
Não meter-se num 'Panorama' (creio que se chama assim), ônibus de conhecer os pontos turísticos. 
Paris para ser degustada a pé, vagarosamente, mesmo que
só se disponha de um dia. 
Andar sem destino. Benjamin escreveu um ensaio a respeito. 
Penso em Poços de Caldas.
Poços é para ser percorrida a pé, ver seus jardins, suas 
montanhas, o horizonte verde e azul, o vale das montanhas distantes que cercam a cratera desse vulcão extinto, Poços é a cratera de um vulcão, de onde saem águas sulfurosas, ares limpos,flores o ano inteiro, gente bonita.
É preciso ter a sabedoria do andar. 
Não só olhar vitrine, entrar em livraria e cafés. Que é bom. Mas o andar meditativo, o desfilar lento, sem finalidade, sem 
nada buscar, querer. 

'As coisas boas do mundo
Tu podes ter sem comprar'

Escreveu Olegario Mariano numa revista. Nunca mais encontrei este soneto. Não está nas suas Obras Completas.
Ser sem finalidade desnorteia, apavora as gentes. 'Você
não sabe o que quer!' - diz a voz da experiência. 
Mas todo prazer é sem finalidade. 
A ação visando a um fim, de que falava Weber, gera compromisso, é trabalho, esforço, ansiedade, frustração. 
Estar de férias, ser feliz, é ser sem finalidade.
- Para onde vai? pergunta-se logo. Que vai fazer? Seria bom 
responder: 'Não sei, apenas vou'. 
Entra-se na loja, o vendedor logo chega: 'Que deseja? Posso 
ajudar?' E se disser que não quer nada? 
O zen fala da não-finalidade da ação. 
Isso tem um nome.
Chama-se liberdade.

Mas Clarice vai além: "Liberdade ainda é pouco. O que eu desejo ainda não tem nome"

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