segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Receita de Ano Novo



Receita de Ano Novo

Rogel Samuel

Drummond escreveu um poema com o título acima que eu leio na Internet – mãe de todos os textos – e que transcrevo aqui:

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação como todo o tempo já vivido
(mal vivido ou talvez sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser,
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?).
Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto da esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um ano-novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

Carlos Drummond de Andrade, "Jornal do Brasil", dezembro de 1997. http://www.releituras.com/drummond_dezembro.asp

Eis que o poeta enfim nos diz que temos de recomeçar, de merecer de novo, de fazer de novo o tempo novo, de renovar o ano no interior da gente, que o ano novo deve acordar é no interior da gente mesmo.
Eu conheci Drummond. Nós o entrevistamos na Faculdade. Ele visitou a nossa turma – coisa rara. Depois o vi passar pela rua em Copacabana. Aqui deixo o meu protesto – nada mais ridículo do que aquela estátua de Drummond no banco da praia. Drummond não era assim. Era magro, mas imponente; tímido, mas altivo. Jamais se poderia imaginar o grande poeta sentado daquela maneira!

Um comentário:

Maria Azenha disse...

Amigo,
um ano novo como Drummond.

grata pela sua companhia durante o 2008,

mariah