quinta-feira, 30 de abril de 2009
O poeta Álvaro Maia
O poeta Álvaro Maia
Rogel Samuel
Pois as garças são ângulos móveis, voadores, esparsas são as garças, são graças, finíssimas criaturas que bailam, figurativas, como anjos dos céus... estão tristes? São alegres? Estão em festas? Desenham retas e círculos de farsas, bordam pospontam com seus longos bicos em talagarças, nas tules das florestas... são aladas sensações, asas de mágoas, sobem e descem nas planuras, enfeitando os barrancos de brancura, estão em sonhos sobre as águas, são mães-dágua... rimadas ritmadas no poema de Álvaro Maia:
No azul, em móveis ângulos, esparsas
as penas em finíssimas arestas,
fugindo em tempo às cerrações funestas,
vão em busca do céu bandos de garças ...
Em meio de tristezas e de festas,
fazem retas e círculos de farsas,
ou pospontam sendais nas talagarças
e nas tules ondeantes das florestas...
Na tarde escura, no verdor da aurora,
voam, revoam pelo espaço afora,
- aladas sensações, asas de mágoas...
Descem, depois, aos longes da planura,
e, enfeitando os barrancos de brancura,
lembram Mães-dágua em sonhos sobre as águas...
Álvaro Maia nasceu em 1893, no seringal “Goiabal”, rio Madeira, município de Humaitá. Advogado, professor catedrático de português, jornalista, poeta, romancista, político, deputado, governador e senador pelo Amazonas. Faleceu em 1969. Está vivo entre os seus raros leitores.
quarta-feira, 29 de abril de 2009
Registro
Nosso poema "Gripe suína" ganhou chamada de capa em BLOCOS ONLINE.
Nosso texto "A teoria revelada" apareceu em
Palavra do fingidor.
Nosso texto "A teoria revelada" apareceu em
Palavra do fingidor.
terça-feira, 28 de abril de 2009
A teoria revelada
A teoria revelada
Rogel Samuel
Quando recebi o belo livro de Zemaria Pinto, "O texto nu" (Manaus, Ed. Valer, 2008), logo pensei, pelo título, tratar-se de obra de poesia. Por sabê-lo poeta. Bom poeta. Mas qual surpresa foi a minha ao ver que abria um volume de teoria literária. E mais ainda, um compêndio teórico prático, didático, das diversas teorias literárias, o mais claro possível, o mais facilitado possível, bem escrito, pelo seu bom estilo, para o público em geral e alunos da graduação em letras.
O título não engana, porém. Ali a teoria da literatura - como ele a chama - está nua. Desnudada, sem véu.
Entramos lá num terreno complexo, variado, infinito, que é aquela disciplina plural, entre filosofia e ciência, vasta e renovável.
Poucos são os bons manuais que sobreviveram, por isso. Porque novas teorias sempre aparecem. Localizadas, nacionalizadas. Porque o teórico da literatura deve saber de tudo o muito necessário para dar conta de suas tantas faces daquele conjunto de saberes: a lingüística, as estéticas, as filosofias, as diversas línguas, as diferentes literaturas nacionais, etc.
Eu me lembro de que, quando iniciei por concurso minhas aulas na Faculdade de Letras da UFRJ me jogaram aos leões, e o joguei durante vários anos, numa maluquice, uma infernal disciplina que se chamava "evolução da literatura", aquela loucura, trapalhada, pois o curso ia desde a Idade Média até as Vanguardas!
Quem é capaz de saber, de dominar tudo aquilo?
Depois o curso foi extinto.
Mesmo assim é a teoria literária francesa, norte-americana, alemã etc.
Um dos maiores talentos brasileiros, que foi José Guilerme Merquior, caiu naquela armadilha, a de escrever sobre tudo e sobre todos: Freud, Marx, Hegel, etc. Assim um grande filósofo brasileiro, o Mestre Ivan Lins, comentou que passara a vida inteira lendo Hegel. E no final da vida afirmou: "Estou começando a compreender..."
Mas não caiu no laço desse ardil o escritor e poeta Zemaria Pinto. Ele só expôs, no seu livro, as idéias claras e clássicas e consagradas, as mais conhecidas, mais gerais, de maneira direta, sem viés, sem polêmica. Basta dizer que ele não cita ninguém durante o texto, só na bibliografia, onde nos orgulhamos de estar, com dois títulos.
“O texto nu” pode ser adquirido em:
http://www.livrariavaler.com.br/index.php
As aventuras de Dianna Valente
Rogel Samuel
(Foto de Mirian Ramos: Neuza Machado em sua visita a Manaus)
Neuza Machado tem alguns livros inéditos do maior valor. Finalmente ela disponibiliza o primeiro em seu blog:
http://caffecomlitteratura.blogspot.com/
Trata-se de uma narrativa (?) em versos, ou um poema longo, um épico moderno. É algo muito original e não sei bem ainda como descrevê-lo. Ou tentar classificá-lo (se é que arte necessita de alguma classificação, coisa de professor).
Aqui está o Prólogo, e diz que tudo se vai fazer numa viagem. A Dianna Mineira Valente parece ser a própria narradora fictícia, que em viagem à Serra Futura faz o seu Neo-Narrar Inseguro, ou seja, a Narradora do Nada vai contar algo ainda muito impreciso, uma aventura.
E aparecem alguns estranhos e interessantes personagens, enquanto a narradora prossegue a sua aventura ao Monte Gigante.
Um belo poema narrativo bem humorado, com muitas variações:
AS AVENTURAS PROSOPOPAICAS DE DIANNA VALENTE
NEUZA MACHADO
I
PRÓLOGO
E eis que, naquele deslumbrante dia
de suave letargia,
a Dianna Mineira Valente,
uma Notável Incomum Vidente,
por intermédio do tédio
e de Brilhante Poderosa Lente
e de Registrada Magia,
já havia previsto, a dita,
aventura mui bendita,
aventura por certo! segura,
por certo! muito bonita!,
ao longo da Varredura
da Via um pouco interdita
que vai à Serra Futura,
a qual se chamará Ventania
na próxima nomenclatura
desta narradora Sem-Guia,
pois lá a guedelha eriçada
do tal Mago da Alcaçada
que fica na Serra Vazia,
no alto da espiralada
trilhazinh’abandonada
do Neo-Narrar Inseguro,
que, na Duração Já Sem-Muro,
sem erro!, terá serventia,
pois lá a guedelha eriçada
do Bell Mago da Indomada
recebe a suprema magia
de uma Ventarol’Alada,
um muito! Desordenada!,
também eriçando ela
a Cabeleirinha Branquela
da Narradora do Nada,
pois foi lá que começou,
e a narradora a mim contou,
a Aventura Mui Segura
da Dianna Arthemis Valente,
Honorável Incomum Vidente,
resguardada pl’o Toinzão
Charreteiro Bonitão,
um Charreteiro Eternal,
mas de bom coração,
por oferecer luz sem-igual,
uma luz matricial,
ao pobre’humano vagante
de um passado imortal,
o Toinzão Itinerante,
por ser u’a figura tal,
a tal figura’inflamante,
uma recópi’atual
de Faetonte Gigante,
aquele filho roubante
da Carruagem do Sol,
ou Hélius Apolo Cantante,
um músico itinerante,
por certo!, fenomenal!,
um demiurgo de Escol
que sabe girar o Sol,
um ex-dono incomodante
da Viatura Voante
que no vigor do arrebol
risca a telona gigante
da realidade marcante
do sonho transcendental
com mil paletas faiscantes,
paletas de tons brilhantes,
de cores reverberantes
e muito et cetera e tal.
Então?!
Então, foi nesse dia
de suave letargia
que a Dianna Quiromante
pegou a Carruagem Vazia,
uma Charretona Brilhante,
e foi, com espetacular maestria,
até ao Monte Gigante
com notável companhia,
o tal Faetonte Brilhante,
o seu Charreteiro do dia,
o Charreteiro Importante;
de dia, um Estrello-Guia;
de noite, muito distante.
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As aventuras de Dianna Valente
segunda-feira, 27 de abril de 2009
O cego que vê TV
O cego que vê TV
Rogel Samuel
Pois um dos inúmeros méritos do livro de Leila Míccolis, Passagem de Calabar, é o de revelar, salientar, enfatizar, chamar à cena o leitor para a importância e beleza desse belo poema dramático, talvez o melhor da literatura brasileira, que se equipara ao “Marinheiro” de Fernando Pessoa.
Calabar foi escrito para ser representado. Traz para nós os conceitos de pátria, cidadania, memória. E também de alienação, da alienação da classe média brasileira. Ou seja: “Calabar está onde não está”, o que quer dizer que ele está em toda parte. Quem o diz é “Uma voz”, um personagem fantasma, que deve ser tudo, talvez seja mesmo a Voz da História, a voz das esquerdas, a voz política, a voz crítica.
Como “A viúva de Calabar” é a voz da revolução, da luta armada, a voz que chama para as ruas, para o grito dos excluídos, que diz “que meu ódio esteja em toda a parte”, o ódio revolta, o ódio nordestino.
O poema dramático de Ledo Ivo estampou um país fracionado, dividido, entre Norte/Nordeste e Sul/Sudeste, entre o Brasil que recebe Bolsa Família e o Brasil que não precisa receber, entre o político nordestino analfabeto de esquerda sem um dedo e o político empresário paulista intelectual doutor cosmopolita. O poema mostra a divisão ideológica do Brasil, ainda que a Leila tentou passar por cima disso para não ferir a mesma ferida. Neste poema, extremamente dramático, Ledo Ivo deu voz a quem não a tem, fez falar e mesmo gritar a grande massa da população pobre, pois “quem te fez em pedaços” que lamba as pedras, que beba a água salgada e morra na sua sede.
Para Ledo Ivo, “a História é uma ficção”, ou seja, uma narrativa, um personagem, uma Voz. “Para mim, não há verdade histórica. Há a versão do vencedor, do vencido, do observador, do pesquisador, etc. Como poeta, não estou interessado na verdade, e sim na mentira, no mito, na mitografia, na mitologia. Calabar é uma figura mítica.”
A história é sua versão, a história é uma versão da verdade.
Ledo Ivo criou também a versão dos vencidos, criou a versão dos personagens do poema. Algumas versões são dos vencidos, como do “Alagoano”, que diz:
Assim eu sou coisa grátis,
já que não tenho valor.
E criou a versão da classe média brasileira, enriquecida, alienada, que não vê nada, que não sabe de nada, que nada pensa, que não é capaz de ver o que não está na TV:
Quem vê nem sempre vê.
O melhor cego é aquele
que vê na TV.
Que esses versos valem por um poema inteiro e são da maior atualidade!
domingo, 26 de abril de 2009
Cantos de Ezra Pound
Rogel Samuel
NO início dos "Cantos", Ezra Pound diz:
E pois com a nau no mar,
Assestamos a quilha contra as vagas
E frente ao mar divino içamos vela
No mastro sobre aquela nave escura,
Levamos as ovelhas a bordo e
Nossos corpos também no pranto aflito,
E ventos vindos pela popa nos
Impeliam adiante, velas cheias,
Por artifício de Circe,
A deusa benecomata.
Tradução de José Lino Grünewald. Foi-me dada por minha amiga Helena. O texto se move para frente, nau no mar quilha contra vagas impelindo adiante. O adjetivo "divino" cobre tudo, ambiente de mito. A "nave escura" veste o leitor de sugestão de destino. Trágico. Ovelhas a bordo ("e os nossos corpos") se abre ao sacrifício. Vem "o pranto aflito". Velas cheias. Deusa benecomata (tradução de "the trim-coifed", vestida de sua própria cabeleira(?)). Atmosfera homérica. O original reza:
And then went down to the ship,
Set keel to breakers, forth on the godly sea, and
We set up mast and sail on that swart ship,
Bore sheep aboard her, and our bodies also
Heavy with weeping, and winds from sternward
Bore us onward with bellying canvas,
Circe's this craft, the trim-coifed goddess.
Prossegue a tradução:
Assim no barco assentados
Cana do leme sacudida em vento
Então com vela tensa, pelo mar
Fomos até o término do dia.
É o sol. É o Barco no mar. É o horizonte até o Término do dia. Bela imagem:
Sol indo ao sono, sombras sobre o oceano
Chegamos aos confins das águas mais profundas.
O tradutor abusou da maestria, compôs tudo em "O", do Sol, do sol-maior: "Sol indo ao sono, sombras sobre o oceano" - (Sun to his slumber, shadows o'er all the ocean)
E cidades povoadas envolvidas
Por um denso nevoeiro, inacessível
Ao cintilar dos raios do sol, nem a
O luzir das estrelas estendido,
Nem quando torna o olhar do firmamento
Noite, a mais negra sobre os homens fúnebres.
sábado, 25 de abril de 2009
As garças
As garças
(Afresco do Teatro Amazonas, possivelmente de De Angelis)
Rogel Samuel
Eu me lembro. Na década de 50 o Rio Negro invadiu o centro de Manaus. A antiga Drogaria Flink ficou debaixo dágua. As águas entraram pela praça da Matriz. Creio que foi em 1953.
Agora leio que a enchente é grande. Calamidade. "A medição do nível das águas do rio Negro, feita no principal porto de Manaus, é realizada desde 1902. Desde que começou essa medição, 1953 foi marcado pela maior enchente da história do Estado. Naquele ano, em junho, o mês de pico das cheias dos rios da região atingiu 29,69 metros", diz a Agência Estado. 3 mil casas serão afetadas. O Rio Negro atinge a maior marca em 106 anos.
O maior poeta daquelas águas é Álvaro Maia:
GARÇAS
No azul, em móveis ângulos, esparsas
as penas em finíssimas arestas,
fugindo em tempo às cerrações funestas,
vão em busca do céu bandos de garças ...
Em meio de tristezas e de festas,
fazem retas e círculos de farças,
ou pospontam sendais nas talagarças
e nas tules ondeantes das florestas...
Na tarde escura, no verdor da aurora,
voam, revoam pelo espaço afora,
- aladas sensações, asas de mágoas...
Descem, depois, aos longes da planura,
e, enfeitando os barrancosde brancura,
lembram Mães-dágua em sonhos sobre as águas...
sexta-feira, 24 de abril de 2009
Hino á tarde
Hino á tarde
Rogel Samuel
Bilac escreveu um glorioso hino à tarde, mas não aquela tarde cheia de brilho, de sol, de ouro em chama, luz e primavera .
A tarde que ele ama é a do fim, do pôr-do-sol, do adágio vesperal, tumba de luto e esplendor do fim do dia, cheia crepes e auriflamas, a tarde triste, mas augusta, meio envolta no vulto da noite, das estrelas, ventre da noite, e dos seus mistérios, a noite das volúpias, do sono, da continuação da vida e do nada.
Glória jovem do sol no berço de ouro em chamas,
Alva! natal da luz, primavera do dia,
Não te amo! nem a ti, canícula bravia,
Que a ti mesma te estruis no fogo que derramas!
Amo-te, hora hesitante em que se preludia
O adágio vesperal, - tumba que te recamas
De luto e de esplendor, de crepes e auriflamas,
Moribunda que ris sobre a própria agonia!
Amo-te, ó tarde triste, ó tarde augusta, que, entre
Os primeiros clarões das estrelas, no ventre,
Sob os véus do mistério e da sombra orvalhada,
Trazes a palpitar, como um fruto do outono,
A noite, alma nutriz da volúpia e do sono,
Perpetuação da vida e iniciação do nada.
quinta-feira, 23 de abril de 2009
quarta-feira, 22 de abril de 2009
Abertura
Rogel Samuel
Foi bela. Abertura do ano da França no Brasil. Grandiosa. Sou meio francês. Meu pai era francês. Amo Paris. Já gostei mais. Paris agora parece poluída, suja. Tem assalto. Muita gente pedindo no metrô. Desemprego, que com esta crise deve ter aumentado. Ou estou ficando velho, cansado de viagem. Geralmente sozinho. Há poucos anos passei 15 dias em Paris. Foi 2006. Frio intenso. Hotel Petit Louvre. Dirigido por árabes. Perto, a Torre. Linda, iluminada. E o Sena, com sua estátua da liberdade, que os americanos copiaram. Algumas livrarias e cafés. O mundo chic. A Escola Militar, o Campo de Marte. A solidão. A saudade do Rio. Fico por aqui.
terça-feira, 21 de abril de 2009
A beleza aruinada
Rogel Samuel
Graças a Amelia Pais conheci o poeta português Rui Pires Cabral, nascido em 1967 em Vila Real. Publicou:
Geografia das Estações, edição de autor, Vila Real, 1994
A Super-Realidade, edição do autor, Vila Real, 1995
Música Antológica & Onze Cidades, Presença, Lisboa, 1997
Praças e Quintais, Averno, Lisboa, 2003
Longe da Aldeia, Averno, Lisboa, 2005
Ele trabalha seus textos e os modifica, mesmo depois de publicados, como neste:
Gostava dessa espécie de beleza
que podemos surpreender a cada passo,
desvelada pelo acaso numa esquina
de arrabalde; a beleza de uma casa devoluta
que foi toda a infância de alguém,
com visitas ao domingo e tardes no quintal
depois da escola; a beleza crepuscular
de alguns rostos num retrato de família
a preto e branco, ou a de certos hotéis
que conheceram há muito os seus dias de fulgor
e foram perdendo as estrelas; a beleza condenada
que nos toma de repente, como um verso
ou o desejo, como um copo que se parte
e dispersa no soalho a frágil luz de um instante.
Gostava de tudo isso que o deixava muito a sós
consigo mesmo, essa espécie de beleza arruinada
onde a vida encontra o espelho mais fiel.
Esta é a beleza crepuscular ou velha, suburbana, gasta. Pobre, cansada. Anônima. "Com visitas de domingo e tardes no quintal depois da escola". Esta a beleza de rostos e paisagem, em preto e branco, a dos hotéis decadentes, como a das estrelas no chão de um copo partido, aquilo que o deixava a sós consigo mesmo, a beleza fiel a si mesma, a beleza da vida em si.
segunda-feira, 20 de abril de 2009
Pobre elegia
Rogel Samuel
O ter sido publicado em Manaus o meu prefacio ao livro de Djalma Passos, AS VOZES AMARGAS, me leva a comentar o seu poema:
POBRE ELEGIA
Eu não te trago nem flores nem auroras,
Nem a mensagem de outro céu
Nem a terra meiga de novos caminhos ...
Eu não te trago o clarão de outras estrelas
Nem a luz de novos pensamentos,
Nem a coroa da suave esperança
Pela qual te sacrificaste...
Eu não te trago a recompensa
Do sofrimento que absorveu
Num crepúsculo de fogo, num por de sol sangrento,
Sem o ú1timo beijo dos que te amavam,
Sem o olhar dos que foram a tua propria vida
Sem os adeuses do coração que amaste ...
O que eu te trago nesta pobre elegia
É a noticia da ambição que não extinguiste,
Do ódio que não apagaste,
Da incompreensão que nao destruíste,
Da dolorosa inutilidade do teu sacrificio ...
De que trata o poema? De certo modo é um poema religioso, ou quase. Falará ele ao Cristo sacrificado? Ele nada diz, mas sugere. Como Passos era um político "de esquerda", ou melhor, do PTB da época de Jango, é possível que o poeta esteja falando de um líder sacrificado, talvez de Che Guevara. Mas não pode ser, o livro de Passos é de 52, e naquele ano Guevara ainda estava vivo e jovem.
Portanto o poema fala de algum outro revolucionário, ou santo, ou mártir.
A ambição não se extinguiu, nem o ódio, nem a incompreensão... falo "da dolorora inutilidade do teu sacrifício..."
Pobre, triste elegia!
domingo, 19 de abril de 2009
Calabar – o grito de um mito
Calabar – o grito de um mito
Rogel Samuel
Começo a comentar o excelente livro de Leila Miccolis, “Passagem de Calabar”. E o vou fazer por etapas, em várias observações aqui postadas.
Segundo ela, o que se vê em Calabar é o mito da traição.
A quem traiu Calabar? A Portugal? Ao Brasil? Calabar escolheu lutar pelos invasores holandeses, e não pelos invasores portugueses/espanhóis. É por isso um traidor? O mito da traição se expõe ironicamente nos versos de Ledo Ivo:
Major Calabar
soldado de que pátria
na Pátria sem pátria
.........................
Mal perguntado, pergunto
A quem traiu Calabar?
A que pátria traiu aquele
que não tem pátria nenhuma
Leila nos oferece um panorama do Brasil apresentando o poema de Ledo Ivo e abre a cortina de suas possibilidades com uma grande variedade de temas. Por exemplo, a questão dos gêneros, os meandros do dramático, do poema dramático. Além de literário, o ponto que ela desenvolve é o político.
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Calabar – o grito dê um mito
sábado, 18 de abril de 2009
Cascalho
Este Cascalho de Herberto Sales me acompanha há muitos anos. Não a edição, que perdi. Mas o livro. A primeira edição é de 1944, portanto tinha eu 1 ano de idade, não sabia ler. Mas na década de 60/70 li o livro, apressadamente, como tudo o que eu fazia na época, vítima da sobrecarga de sala-de-aula. Cascalho foi uma boa leitura. Esstou, agora, relendo.
Muito me admira que o livro só se encontre em sebos.
Será que a literatura brasileira está realmente envolvida nesta crise?
Porque o mundo da ficção é deveras evanescente, e o romance um objeto de consumo. Até barato.
Escrever um romance dá muitíssimo trabalho. Físico, mental, emocional. Quantos jovens talentos se dedicam a esse ingrato mister?
Escrever um romance é como o garimpador de cascalho. Trabalha a vida inteira e quem sabe nunca encontra ouro.
O ouro é um mistério. Dilson Lages o descobriu. Seu estilo é muito semelhante ao de Herberto.
sexta-feira, 17 de abril de 2009
A prosa soberana
A prosa soberana
Rogel Samuel
Eu gosto dos escritores à moda antiga: Euclides da Cunha, Rui Barbosa. São textos fortes, camaleônicos, enrustidos, vulcânicos. O campeão é Antonio Vieira. O imperador da prosa. O monstro sagrado da escritura. Quem se mete a imitá-los, hoje, é rotulado de acadêmico, antiquado. Os escritores amazonenses do passado os imitavam, e até hoje prosadores como Saramago fazem uso dessa estética do texto retumbante, relâmpagos de sonoridades poéticas. De certo modo Guimarães Rosa. Ele também construía um palácio de assonâncias, como quando disse: “Sábio não é quem sempre ensina. Mas quem de repente aprende”.
São seis vezes o som de EM, que lembra o questionamento de “hein?”. Rosa constrói um romance em cima de sonoridades.
Alguns bons prosadores hoje estão esquecidos. Exemplo de Herberto Sales. Seu romance “Cascalho” tem uma “tessitura artística”, uma “arquitetura e a linguagem”, uma “densidade” estilística, no dizer de Adonias Filho.
São escritores de prosa soberana.
quinta-feira, 16 de abril de 2009
O texto secreto
Estou surpreso: meu próprio computador bloqueou o meu blog! Fico imaginando quantos leitores estarão impedidos de me ler, se eu mesmo tive a maior dificuldade de a mim me ver. O Internet Explorer me bloqueou como "site inseguro", " impróprio" para mim mesmo. E eu pensei, eis aí o grande barato, o escritor não deve ficar lendo e relendo o que rabiscou. A dúvida é o maior impedimento à nossa produção literária. Por que temos dúvidas à respeito dos nossos textos?
Mas eu precisava postar, não ler!
Alguns escritores dependiam da aprovação dos outros, da esposa, de alguém. Sem isso, não publicavam nada.
Outros escreviam com frenesi e nunca burilavam seu texto.
Flaubert trabalhava tanto a prosa que a desfigurava. Ele escrevia frases. Trabalhava frases. Modificava palavras.
Proust ampliava o escrito, acrescentava considerações, situações.
Pois bem. Todos os escritores devem ter um computador como o meu. Neurótico. Que esconde o que escreveu.
quarta-feira, 15 de abril de 2009
novo poema
Novo poema escrito e postado em 15 de abril de 2009 em:
ROGEL SAMUEL, novos poemas.
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terça-feira, 14 de abril de 2009
Chuva fina, em Tiradentes
Chuva fina, em Tiradentes
Rogel Samuel
Chove. Chuva fina, em Tiradentes. Dia muito nublado, tipicamente inglês. Minha amiga X. diz que fica deprimida, com um dia assim, escuro. Sem sol. Mas nada há de depressivo neste clima meio frio, bom para dormir, para se bem vestir. Entro na única livraria da cidade. Na porta, de saída, um ex-ministro, grande intelectual e escritor. Tem casa por aqui. O livreiro me diz que também o filósofo tal por aqui está. Olho muitos livros e nada compro. Os preços elevados. Caríssimos. “O diabo na livraria do cônego”, de Eduardo Frieiro, da Itatiaia, que custa 21,00 no catálogo, em Tiradentes sai por 49,00. Mais do dobro. Gosto muito de Frieiro. Grande escritor, melhor crítico. Eu sempre quis ler este livro, que nunca li, da conjuração mineira. Chove. Chuva fina, em Tiradentes. No hotel, escrevo e posto esta crônica.
segunda-feira, 13 de abril de 2009
A morte do papel
A morte do papel
Rogel Samuel
Ziraldo escreveu no JB que o jornal de papel morrerá. Creio que sim. Em alguns países, o jornal impresso já perdeu a capacidade de influenciar os leitores, que já lêem o jornal ao contrário, buscando saber o que ele esconde, quais suas intenções secretas. Não, não há notícia isenta, desinteressada. Há sempre uma sutil mensagem política escondida no texto. E uma ciência da linguagem se especializou em desmascará-lo.
O texto do Ziraldo está reproduzido em “ENTRE-TEXTOS”. Ele diz que o livro impresso não morrerá. Tenho minhas dúvidas. As novas mídias do livro estão cada vez mais sofisticadas. Mesmo no Brasil já existem editoras online, como as seguintes:
http://www.livrofalante.com.br/
http://www.audiolivro.com.br/sistema/home.asp?IDLoja=6491&1ST=1&Y=3887645298176
Eu, modesto escritor, agora só escrevo pela Internet. Vários livros meus estão completamente on-line.
Há tempos escrevi que o futuro da poesia está no celular. Imagine a maravilha: seus pequenos poemas serem lidos por milhões de leitores no celular...
sábado, 11 de abril de 2009
O sol
O sol
Rogel Samuel
O sol fica fraco, o verão. O brilho intenso cai, os ares claros, as nuvens raras. O outono. O abril se vai para maio, mês das noivas. Do amor. Quando eu era garoto, havia uma canção:
Rosa de Maio
É meu desejo
Mandar-te um beijo
Nesta canção.
Não sei, creio que era Francisco Alves. Aqueles cantores: Orlando Silva, Vicente Celestino. Conheci, pessoalmente, Albenzio Perrone. No fim da vida, gerente de restaurante vegetariano. E pobre, e digno. Elegante, magro, educado. Contou-me que, um dia, quando era grande sucesso, uma "fã" lhe telefona. Uma senhora, do em hospital. Dizia que, antes de morrer, queria conhecê-lo. Perrone mandou um amigo. Ela deixou toda a fortuna para aquele amigo. Rica. Sem herdeiros. Na época do rádio, não da TV - ela não sabia que o amigo era um impostor. Um falso Perrone.
Gosto de vozeirões, escandalosos, Agnaldo Rayol, Timóteo, Caubi. Gosto de Miltinho. Encontrei Agnaldo Rayol em casa de amigos. Me disse que seu ídolo era Altemar Dutra. Espanta como Agnaldo era jovem, para sua idade. Alto, bonitão. Sorriso aberto. Me disse quão amigo é da Hebe. Por causa dela tinha-se incompatibilizado, na época, com a Globo, o que lhe custava muito caro. Caubi era meu vizinho, em Copacabana. Digo, sua "boite", creio que "Drink". Caubi posava, aos domingos de sol, na porta. Via o movimento da garotada passar. Timóteo desfilava com seu conversível, emplacado em Timóteo, uma cidade. Passava glorioso pela Avenida Atlântica. Morava perto do Arpoador, num luxuoso prédio. Tinha predileção pelos domingos de sol, de verão.
Minha avó cantava uma canção que ouvi de sua boca refrão: "eu morro, eu perco vida, mas o amor dela não hei de deixar". Meu pai entoava uma estranha canção amazonense: "Cabocla do Caxangá, vem cá, cabocla, vem cá". E canções folclóricas alsacianas. O sol está ficando fraco, vai-se o verão, a vida, as canções. Mas o brilho intenso do passado estandartiza, nos ares, as claras visões dos cânticos do outono. Abril se vai para maio, quando se espera amar.
sexta-feira, 10 de abril de 2009
poços de luz
Poços de luz
Rogel Samuel
A mais bela contradição. Aquela luz da escuridão do poço? Azenha inverte os sentidos do poético, em:
poços de luz
maria azenha
fui à procura da palavra
que sonhei esta noite
há um espelho nas paredes da rua
um espelho gigante
as letras chegam-me por poços rodeados
de diamantes
crescem dos braços para a lua
o silêncio
uma ciência que se prolonga
no sangue
há praças onde esculpir o sol
Azenha faz da arena da rua um espelho, gigante espelho, nas paredes. O escuro poço é feito de luzes de diamantes esculpidos, onde se mergulha na solidão da alma. Estendem os braços para o céu, estão vindo do sangue, - o mundo de Azenha é todo multirefletido de espelhos - ela já escreveu um livro assim - são as alças de alcançar o brilho do sol, de um sol esculpido nas ruas, publicitário, exposto, onde a escritora está nua e em sangue... E onde estará a palavra sonhada?
quinta-feira, 9 de abril de 2009
A outra profecia
A outra profecia
Rogel Samuel
A semana foi dominada pela tragédia em L´Aquila. Refugiei-me na Kizz. Gosto dessa banda. Como eu disse, eu tive um amigo, Carlos de Souza Neves, pesquisador das profecias. Principalmente Nostradamus. Ele é autor de um gigantesco livro, “As profecias do nosso tempo”. Eu tenho esse livro, mas não o encontro. Desorganização minha.
Ele dizia que o mar vai invadir a terra. Isto é possível, com o aquecimento global. No fim da vida, ele construiu uma casa, com cerca de 15 quartos, em Caxambu. Não é luxuosa. Eu a conheço. Após a sua morte, foi deixada, por herança, a um grupo da Sociedade Teosófica. A sua imensa biblioteca lá está.
Mas não é uma casa comum.
Ela está preparada para o fim do mundo. Souza Neves estocou tudo para sobreviver ali durante muito tempo: fósforo, álcool, lenha, óleo, etc. A própria localização, numa elevação, mostra que ele construiu um refúgio. Uma fortaleza.
Ele acreditava que a terceira guerra mundial viria do Oriente Médio. Na época nós só pensávamos no confronto entre a União Soviética e os Estados Unidos. Ele dizia que o perigo viria da zona árabe. Na época, ninguém falava em terrorismo. Mas ele sim.
Mas o pior seria a invasão do mar. Moro a beira mar. No primeiro andar.
Refugio-me na banda Kizz.
Profecias do nosso tempo
Profecias do nosso tempo
Rogel Samuel
Eu tive um grande amigo, chamava-se Carlos de Souza Neves, escritor, teosofista, especializado nas profecias. Ele escreveu um gigantesco livro, “As profecias do nosso tempo” (eu tenho esse livro, só não acho).
Dizia ele que a China ia invadir a Europa e o mundo. Eu, certamente cético, pensava que era militarmente, que o exército vermelho viria, com seus tanques... Hoje vejo que realmente os produtos industriais baratos da China dominaram o mundo e abalaram a economia dos Estados Unidos, e que o dinheiro barato chinês liquidou com o resto, os subprimes, que são as aplicações chinesas em títulos do tesouro americano. A opinião não é minha, mas do famoso Chico Oliveira e de Ben Bernanke, presidente do FED.
“Já em março de 2005, Ben Bernanke, então importante economista de Princeton, alertava para o risco da utilização dos empréstimos chineses para financiar os pesados gastos das famílias norte-americanas, em hipotecas de casas e carros. Ben é hoje o todo-poderoso presidente do FED, e de crítico converteu-se em administrador da bancarrota”. Isto está escrito em Mark Landler, do The New York Times, no artigo “Somente os bolsos chineses se enchiam”, publicado na Folha de S.Paulo, em 5/jan/2009, apud Francisco de Oliveira.
Enfim, a China invadiu o mundo com produtos e com dinheiro baratos. Souza Neves tinha razão.
Amanhã tratarei da outra “profecia” do saudoso amigo. Esta bem mais terrível.
quarta-feira, 8 de abril de 2009
Leonard Cohen
Poeta urbano
Rogel Samuel
Urbanos poetas os que nos falam da vida das grandes cidades, suas avenidas, trânsito intenso, com o ruído do mundo das armações de cimento e vidraça, longe das florestas, o mar poluído, o ar poluído, as pessoas anônimas, o metrô, os trens, os automóveis. Mas não longe da poesia, para esses poetas urbanos. A solidão pode ser um dos seus temas, a solidão anônima:
Leonard Cohen
PERGUNTO-ME QUANTA GENTE NESTA CIDADE
Pergunto-me quanta gente nesta cidade
vive em apartamentos mobilhados.
Altas horas da noite quando olho os outros prédios
juro que vejo um rosto em cada janela
que me olha também
e quando volto para dentro
pergunto-me quantos se sentam às suas escrivaninhas
a escreverem isto mesmo.
Leonard Cohen
(Em “Filhos da Neve - Antologia Poética”, versões de Jorge Sousa Braga e Carlos Tê, Assírio e Alvim, 2ª ed: 1997 - colecção Rei Lagarto, enviado por Amelia Pais).
Ele é mais conhecido como músico, cantor, compositor, escritor canadense, nasceu em Montreal em 1934. Quase foi monge budista. Morou no Mount Baldy Zen Center, próximo de Los Angeles.
segunda-feira, 6 de abril de 2009
Duas traduções
Duas traduções
Rogel Samuel
Traduzir, além de ser uma arte, exercício útil ao escritor, para excitá-lo. Traduzir o poeta que mais amamos faz do trabalho um extremo prazer. Traduzir faz aprender, mergulhar no misterioso subterrâneo do texto e das duas línguas. Poucos tradutores agigantaram o texto original, em colaboração com a origem. No meu insignificante caso digo: ainda hei de tentar traduzir “ Le bateau ivre”, de Rimbaud, com seus 100 versos de ouro puro.
Vejamos um caso de tradução comparada, de Rainer Maria Rilke, mas sem comentário:
O torso arcaico de Apolo,
Não conhecemos sua cabeça inaudita
Onde as pupilas amadureciam. Mas
Seu torso brilha ainda como um candelabro
No qual o seu olhar, sobre si mesmo voltado
Detém-se e brilha. Do contrário não poderia
Seu mamilo cegar-te e nem à leve curva
Dos rins poderia chegar um sorriso
Até aquele centro, donde o sexo pendia.
De outro modo erger-se-ia esta pedra breve e mutilada
Sob a queda translúcida dos ombros.
E não tremeria assim, como pele selvagem.
E nem explodiria para além de todas as fronteiras
Tal como uma estrela. Pois nela não há lugar
Que não te mire: precisas mudar de vida.
(Tradução: Paulo Quintela)
Não, não sabemos como era a cabeça, que falta,
De pupilas amadurecidas, porém
O torso arde ainda como um candelabro e tem,
Só que meio apagada, a luz do olhar, que salta
E brilha. Se não fosse assim a curva rara
Do peito não deslumbraria, nem achar
Caminho poderia um sorriso e baixar
Da anca suave ao centro, onde o sexo se alteara.
Não fosse assim, seria essa estátua uma mera
Pedra, um desfigurado mármore, e nem já
Resplandecera mais como pele de fera.
Seus limites não transporia desmedida
Como uma estrela; pois ali ponto não há
Que não te mire. Força é mudares de vida.
(Trad. de Manuel Bandeira)
domingo, 5 de abril de 2009
O naufrágio no Amazonas
O naufrágio no Amazonas
Rogel Samuel
Ontem, perto de Itacoatiara, de madrugada, o "Dona Zilda" naufragou com 47 pessoas a bordo. Como sempre, o mesmo problema, superlotação. Eu já passei por isso. Ia atravessar o rio, de volta para Manaus. Quando o pequeno barco começou a viagem eu vi o perigo e fiz, aos gritos, que voltassem para o porto para me deixar. Mas tive de fazer um escândalo! A irresponsabilidade é total, com a vida humana. As
pessoas têm medo de parecer medrosas e não protestam. E morrem. Meu falecido pai, navegador experimentado no Amazonas, dizia que existem mais barcos no fundo dos rios do que sobre as águas, navegando. No meu romance "O amante das amazonas", eu arrolei vários desastres.
No " Dona Zilda" havia crianças e até 2 bebês de 2 e 6 meses. Desaparecidos. O mundo amazônico é assim, selvagem e terrível. O rio Amazonas perto de Itacoatiara é tumultuso e largo como um braço de mar. O rio está cheio, quase não se vê o outro lado.
sábado, 4 de abril de 2009
que quando entrei do patamar no espaço
que quando entrei do patamar no espaço
no comando gritavam pulsações de alarme
e o repuxo das terras punham plácidas tábuas
esboroado o farol a ímpeto último.
e coloridas voavam no patamar da estupa
bandeiras de rezas estandartes de graças
e era quando ali recebíamos forças
do aro de metal tão plano quanto aço.
mas do mormaço apareciam taças
bye-rung kha-shor amorosa puro néctar túmido
no fomento do som de trompas que sobre o azul colore
levadas a pulso poderosas e em bando.
ó grande tarde de Padmasambhava
ó grande área aquela de palácio!
rufam tambores encastelados deuses
refregas rumores talássicas ameaças
de Mahakhalas de khatvangas de espadas!
quem me dera estar de volta em poema
e lá não me perder no azul do céu da cena
ROGEL SAMUEL
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que quando entrei do patamar no espaço
sexta-feira, 3 de abril de 2009
"Esse é o cara!", esse é o Brasil!
"Esse é o cara!", esse é o Brasil!
Rogel Samuel
"Esse é o cara!", disse Obama sobre Lula. Eu nem sei se o Jornal Nacional deu isso. Só leio as notícias pela Internet. Os internautas brasileiros não gostam de Lula. É a classe média. Que o rejeita. Mas esta classe representa somente 10 % da população. Basta ler os "comentários" dos jornais para ver como Lula é rejeitado ali. Há muita desinformação, ataques diários na imprensa. Criticam o problema dos hospitais públicos. Mas pouca gente se lembra que foi a oposição quem acabou com a CPMF - um crime - tirando bilhões da verba que ia para a saúde pública. A CPMF era o imposto mais justo do Brasil: não dava para sonegar, e somente os ricos pagavam. A classe média pagava uma ninharia, pobre não pagava. "Esse é o cara!" é uma frase emblemática, dito por alguém que também sabe o que é discriminação. Obama era atacado de todas as formas e lados, na campanha. Minha amiga X., que trabalhou na campanha dele, me disse. Mas, ao contrário do Brasil, houve uma onda invisível de internautas trabalhando a favor dele. Obama foi eleito pela grande massa da população americana. Se Obama conseguir debelar a crise, nós podemos dizer a seu respeito: "Esse é o cara!" E não seremos odiados por isso.
quinta-feira, 2 de abril de 2009
A palavra como navalha
A palavra como navalha
Rogel Samuel
O terrivelmente belo poema de Zemaria Pinto, “O exercício da crueldade” acusa desse modo:
palavras são serpentes, são navalhas
são balas que explodem dentro do peito
de quem ouve e de quem fala!
Ai palavras! Ai palavras! Estranha potência essa das palavras cruéis, enganosas, ferinas, irônicas, venenosas. Zemaria Pinto diz que elas cortam como navalhas com suas falas, falácias, que trazem espinhos venenosos escondidos, balas explosivas que vão fundo, que lá no íntimo ferem quando querem ferir, e que ulceram a boca de quem diz, de quem dispara. O veneno mais terrível não mata a serpente, mas destrói a alma da humanidade de quem as profere, as palavras danadas infernais. Todos nós já as ouvimos e as sofremos. E até mesmo as proferimos contra nossos inimigos e desafetos! Às vezes elas vêm adocicadas com o invólucro do venenoso mel dos sorrisos falsos, perigosamente afáveis, corteses, finórios.
Onde os venenos e as gozações mais ácidas aparecem é na vida parlamentar, no Parlamento, ali onde reina a esperteza, a sagacidade das inteligências maléficas e malignas prontas para tudo destruir, usurpar, danar, profanar.
Até parece que o homem não merece o sagrado e misterioso dom da fala, da linguagem, mas não é verdade. São demônios falantes, em bom português, em correto inglês etc.
Zemaria Pinto é meu amigo, um homem afável e cortês, poeta e escritor fecundo da Academia Amazonense de Letras, autor de numerosos livros.
Leia mais Zemaria Pinto em:
http://ofingidor2008.blogspot.com/
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