segunda-feira, 6 de abril de 2009
Duas traduções
Duas traduções
Rogel Samuel
Traduzir, além de ser uma arte, exercício útil ao escritor, para excitá-lo. Traduzir o poeta que mais amamos faz do trabalho um extremo prazer. Traduzir faz aprender, mergulhar no misterioso subterrâneo do texto e das duas línguas. Poucos tradutores agigantaram o texto original, em colaboração com a origem. No meu insignificante caso digo: ainda hei de tentar traduzir “ Le bateau ivre”, de Rimbaud, com seus 100 versos de ouro puro.
Vejamos um caso de tradução comparada, de Rainer Maria Rilke, mas sem comentário:
O torso arcaico de Apolo,
Não conhecemos sua cabeça inaudita
Onde as pupilas amadureciam. Mas
Seu torso brilha ainda como um candelabro
No qual o seu olhar, sobre si mesmo voltado
Detém-se e brilha. Do contrário não poderia
Seu mamilo cegar-te e nem à leve curva
Dos rins poderia chegar um sorriso
Até aquele centro, donde o sexo pendia.
De outro modo erger-se-ia esta pedra breve e mutilada
Sob a queda translúcida dos ombros.
E não tremeria assim, como pele selvagem.
E nem explodiria para além de todas as fronteiras
Tal como uma estrela. Pois nela não há lugar
Que não te mire: precisas mudar de vida.
(Tradução: Paulo Quintela)
Não, não sabemos como era a cabeça, que falta,
De pupilas amadurecidas, porém
O torso arde ainda como um candelabro e tem,
Só que meio apagada, a luz do olhar, que salta
E brilha. Se não fosse assim a curva rara
Do peito não deslumbraria, nem achar
Caminho poderia um sorriso e baixar
Da anca suave ao centro, onde o sexo se alteara.
Não fosse assim, seria essa estátua uma mera
Pedra, um desfigurado mármore, e nem já
Resplandecera mais como pele de fera.
Seus limites não transporia desmedida
Como uma estrela; pois ali ponto não há
Que não te mire. Força é mudares de vida.
(Trad. de Manuel Bandeira)
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5 comentários:
Amigo, linda postagem! O exercício de traduzir é realmente fantástico.
Abraços.
Jefferson.
OBRIGADO,
principalmente um poeta do porte de Rainer Maria Rilke, cujas Elegias são releituras constantes.
Abraço, Rogel
Sim, amigo, você tem toda razão. Nunca deixo de reler as Elegias de Duíno. Deixarei um trecho - os primeiros versos - da oitava elegia das Elegias (na minha opinião, uma das melhores) para participar de sua linda postagem. Texto traduzido por Karlos Rischbieter.
"Com todos os olhos a criatura percebe/ a Aberto. Somente nosso olhar é / como que invertido e colocado, / como armadilha, em torno de sua livre saída. / O que há lá fora, o sabemos apenas pela / expressão do animal; pois até a criança, muito cedo, / invertemos e a obrigamos a olhar por trás a / configuração, e não o Aberto, que / é tão profundo na face do animal. Livre de morte. (...)
Abraços!
Jefferson
Sim, mas esta primeira tradução do Paulo Quintela é dele mesmo ou é do Mario Faustino??? Quanto a do Bandeira, não resta dúvida!
tem razão, é de MÁRIO FAUSTINO
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