sexta-feira, 25 de dezembro de 2009
Eu não escrevo no escuro
Eu não escrevo no escuro
Rogel Samuel
(Pintura de Jo Murphy)
Calor extremo. Mesmo com o ar condicionado, estou sentindo. Há, no ar da cidade, a paz calma do verão. O peso do verão. O céu está cheio de fuligem, para o lado do Norte. Melhora por aqui, onde moro. Tarde calma lembra "Tarde" de Bilac:
Hino á Tarde
Glória jovem do sol no berço de ouro em chamas,
Alva! natal da luz, primavera do dia,
Não te amo! nem a ti, canícula bravia,
Que a ti mesma te estruis no fogo que derramas!
Amo-te, hora hesitante em que se preludia
O adágio vesperal, - tumba que te recamas
De luto e de esplendor, de crepes e auriflamas,
Moribunda que ris sobre a própria agonia!
Amo-te, ó tarde triste, ó tarde augusta, que, entre
Os primeiros clarões das estrelas, no ventre,
Sob os véus do mistério e da sombra orvalhada,
Trazes a palpitar, como um fruto do outono,
A noite, alma nutriz da volúpia e do sono,
Perpetuação da vida e iniciação do nada.
Que mistérios tem essa glória do sol, esse berço de ouro em chama, que Bilac não ama.
Ele era quase um ser noturno, decadentista, hesitante na tumba do dia, no luto, no rir de sua própria agonia, com a noite em seu ventre de sombria orvalhada. Bilac queria o som das estrelas, a quase noite, a tarde triste, a volúpia dos escondidos e a iniciação do seu nada.
Bilac era o grande poeta do mistério, a voz maior das estrelas incompreensíveis.
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