domingo, 19 de julho de 2015

Hino á tarde




Hino á tarde

Rogel Samuel

Bilac escreveu um glorioso hino à tarde, mas não aquela tarde cheia de brilho, de sol, de ouro em chama, luz e primavera .
A tarde que ele ama é a do fim, do pôr-do-sol, do adágio vesperal, tumba de luto e esplendor do fim do dia, cheia crepes e auriflamas, a tarde triste, mas augusta, meio envolta no vulto da noite, das estrelas, ventre da noite, e dos seus mistérios, a noite das volúpias, do sono, da continuação da vida e do nada.

Glória jovem do sol no berço de ouro em chamas,
Alva! natal da luz, primavera do dia,
Não te amo! nem a ti, canícula bravia,
Que a ti mesma te estruis no fogo que derramas!
Amo-te, hora hesitante em que se preludia
O adágio vesperal, - tumba que te recamas
De luto e de esplendor, de crepes e auriflamas,
Moribunda que ris sobre a própria agonia!
Amo-te, ó tarde triste, ó tarde augusta, que, entre
Os primeiros clarões das estrelas, no ventre,
Sob os véus do mistério e da sombra orvalhada,
Trazes a palpitar, como um fruto do outono,
A noite, alma nutriz da volúpia e do sono,
Perpetuação da vida e iniciação do nada.

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