Uma
antologia do Amazonas
Rogel
Samuel
Tenho
em mãos, seis anos depois de sua publicação, a “Poesia e poetas do Amazonas”, dos
senhores Tenorio Telles e Marcos Frederico (Valer, Manaus, 2006).
Comprei,
através da “Estante Virtual”, de um sebo de Cuiabá (Bazar do Livro), mas o
livro veio quase novo.
De
saída, fui atraído pela beleza do projeto gráfico. A bela capa sobre um quadro
de Afranio de Castro é magnífica.
Deve
ser a melhor antologia do tema publicada até hoje.
Como
o assunto é de minha predileção, ouso dar aqui algum depoimento sobre poucas
omissões e escolhas de alguns poetas e textos, que em nada diminui a obra.
Afinal,
criticar é fácil; fazer é difícil.
Logo
deu pela ausência de um poeta importante: Djalma Passos, que, apesar de
acreano, viveu em Manaus e publicou livros importantes como As Vozes amargas - 1952; Bazar
de angústia Miscelânea 1972; Poemas do tempo perdido - 1947; Tempo e distância 1955.
Quem
quiser conferir leia-o em
http://historiadosamantes.blogspot.com.br/search/label/DJALMA%20PASSOS
De Hemetério Cabrinha eu publicaria dois
clássicos: “Falando a meu coveiro” e “O Cristo do Corcovado” (o melhor poema já
escrito sobre o símbolo da cidade do Rio de Janeiro):
Falando
a meu coveiro
É aqui neste lugar, ao pé deste cipreste,
junto a este mausoléu. Pega uma enxada, cava
sete palmas de chão! Anda depressa, grava
no teu semblante mudo o riso que escondeste!
Abre o meu leito eterno... O meu lugar é este!
Quero nele abafar minha paixão escrava!
Quero enterrar-me logo... a vida já me agrava...
Depressa! A minha dor de dores se reveste!
Alarga-a mais um pouco, afasta mais a areia!
Ela, assim como está, torna-se muito feia, profunda-a mais... trabalha! Este dinheiro é teu!
Que é isso? Um crânio aí? Dá-mo, quero beijá-lo.
Limpa-lhe bem o pó! Dá cá, quero estudá-lo
Como alguém algum dia há de estudar o meu!
(Vereda iluminada! 1932 )
O Cristo do Corcovado (alguns versos)
No escalavrado píncaro da serra,
Que o luar alveja e a luz do sol estanha;
E onde a cidade, abençoando a terra,
Se espreguiça na falda da montanha;
Ergue-se o Cristo-Redentor, coitado!
Braços ao ar, o triste olhar cravado
Na base de granito que o suporta
De alma apagada e a consciência morta.
O Cristo cujo busto alvinitente,
Granítico, imponente
E lavado de sol;
Aureolando de alvura o Corcovado,
Qual Prometeu, virado
Para o horizonte, a medir o arrebol;
E, de distância imensurável, visto
Qual uma forma etérea
É apenas um Cristo
Feito à custa de angústias e miséria.
É aqui neste lugar, ao pé deste cipreste,
junto a este mausoléu. Pega uma enxada, cava
sete palmas de chão! Anda depressa, grava
no teu semblante mudo o riso que escondeste!
Abre o meu leito eterno... O meu lugar é este!
Quero nele abafar minha paixão escrava!
Quero enterrar-me logo... a vida já me agrava...
Depressa! A minha dor de dores se reveste!
Alarga-a mais um pouco, afasta mais a areia!
Ela, assim como está, torna-se muito feia, profunda-a mais... trabalha! Este dinheiro é teu!
Que é isso? Um crânio aí? Dá-mo, quero beijá-lo.
Limpa-lhe bem o pó! Dá cá, quero estudá-lo
Como alguém algum dia há de estudar o meu!
(Vereda iluminada! 1932 )
O Cristo do Corcovado (alguns versos)
No escalavrado píncaro da serra,
Que o luar alveja e a luz do sol estanha;
E onde a cidade, abençoando a terra,
Se espreguiça na falda da montanha;
Ergue-se o Cristo-Redentor, coitado!
Braços ao ar, o triste olhar cravado
Na base de granito que o suporta
De alma apagada e a consciência morta.
O Cristo cujo busto alvinitente,
Granítico, imponente
E lavado de sol;
Aureolando de alvura o Corcovado,
Qual Prometeu, virado
Para o horizonte, a medir o arrebol;
E, de distância imensurável, visto
Qual uma forma etérea
É apenas um Cristo
Feito à custa de angústias e miséria.
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De
Ernesto Penafort faltou o soberbo soneto:
noutros tempos, olinda, eras futuro.
sob sol e silêncio se descia
ao vale, e o vale fértil pressentia
a intenção dos abraços, além-muro.
vieram ventos. choveu do intento puro
o desejo de ser, no qual se cria:
pronta a rosa entendida falecia
sob sol e silêncio no chão duro.
várias chuvas passaram, hoje banho
noutras águas a vida, pois, de antanho,
só a luz do teu rosto é que me ocorre,
entre silêncio e sol, mas como tudo,
se incorpora, no tempo, a um fruto mudo:
sob sol e silêncio nasce e morre.
noutros tempos, olinda, eras futuro.
sob sol e silêncio se descia
ao vale, e o vale fértil pressentia
a intenção dos abraços, além-muro.
vieram ventos. choveu do intento puro
o desejo de ser, no qual se cria:
pronta a rosa entendida falecia
sob sol e silêncio no chão duro.
várias chuvas passaram, hoje banho
noutras águas a vida, pois, de antanho,
só a luz do teu rosto é que me ocorre,
entre silêncio e sol, mas como tudo,
se incorpora, no tempo, a um fruto mudo:
sob sol e silêncio nasce e morre.
De
Farias de Carvalho é imperdoável não se ler os famosos:
Desses
mortos ocasos esquecidos
chega-me agora o pássaro de cinza;
de ontem são suas asas, de silêncio
o seu bico pousado sobre a ponte
entre o vencido vale e o bosque a entrar,
bica-me o peito onde marés antigas
jogam restos de mastros e fantasmas
desses velhos piratas que ficaram
tatuados na penumbra de olhos idos.
E sem saber talvez do inútil intento
ninha o vazio do momento, à espera
da comida do sonho que ontem davam
essas mãos que se foram, consumidas
nesses mortos ocasos esquecidos...
chega-me agora o pássaro de cinza;
de ontem são suas asas, de silêncio
o seu bico pousado sobre a ponte
entre o vencido vale e o bosque a entrar,
bica-me o peito onde marés antigas
jogam restos de mastros e fantasmas
desses velhos piratas que ficaram
tatuados na penumbra de olhos idos.
E sem saber talvez do inútil intento
ninha o vazio do momento, à espera
da comida do sonho que ontem davam
essas mãos que se foram, consumidas
nesses mortos ocasos esquecidos...
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Meus mortos hão de vir no fim da tarde
molhados da ferrugem liquida do rio
que banha as margens deste meu silencio,
deste silencio lúcido e sonoro
que embala na praia ao fim das tardes
os olhos de éter dos defuntos tortos
que lambem com o olhar a praia longe.
Meus mortos hão de vir no fim da tarde
mordendo a pele aquática do vento;
(vento, vento de tíbias descarnadas
arrepiando o pelo das vidraças).
Meus mortos hão de vir no fim da tarde.
Aguçai vossos dentes, cães do tempo,
vamos comer a morte no crepúsculo.
Meus mortos hão de vir no fim da tarde
molhados da ferrugem liquida do rio
que banha as margens deste meu silencio,
deste silencio lúcido e sonoro
que embala na praia ao fim das tardes
os olhos de éter dos defuntos tortos
que lambem com o olhar a praia longe.
Meus mortos hão de vir no fim da tarde
mordendo a pele aquática do vento;
(vento, vento de tíbias descarnadas
arrepiando o pelo das vidraças).
Meus mortos hão de vir no fim da tarde.
Aguçai vossos dentes, cães do tempo,
vamos comer a morte no crepúsculo.
Mas
são algumas omissões que não depreciam a obra, que se pode ler gratuitamente
em:
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