quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Drummond entrou pela porta dos fundos!


Drummond entrou pela porta dos fundos!

Rogel Samuel


Lembro-me de Drummond. Um dia, quando éramos aluno da FNFi, e como estudássemos sua obra, conseguimos que Drummond aceitasse a vir, na nossa sala, para conversar. Ele exigiu que ninguém soubesse, e que pudesse entrar pela porta dos fundos!
Incrível: um dos maiores poetas entrou pela porta dos fundos da nossa faculdade de letras. Mas Drummond não grande coisa. Parecia um funcionário público (que era), conversando. Trazia um guarda-chuva preto e vestia um terno cinzento. Sério, magro, seco, quase mal humorado. Disse, por exemplo, que perdia belas imagens e versos que lhe ocorriam no caminho de casa para o trabalho. Parece que ele andava de ônibus, de Copacabana para o Centro, no Rio. Quando eu lhe perguntei por que ele não tinha consigo um caderninho de notas, ele respondeu que "não fica bem alguém ficar escrevendo". Lembro-me de que nossa professora, D. Cleonice Berardinelli, que ia passando no corredor, o viu e, espantada, logo entrou na sala. Drummond, o gênio da nossa poesia, discorria singelamente, prosaicamente sobre sua obra. Nenhum brilho, nada de demonstrações de grandeza. Disse: "não sei por que fazem tanto barulho pela minha poesia, eu não vejo nada de especial nela" (as palavras eram mais ou menos assim). Disse horrores sobre o verso "no meio do caminho tinha uma pedra". E no fim, quando se despediu, eu lhe pedi um autógrafo. Ele logo se irritou comigo ao ver, na folha de rosto do seu livro, após o seu nome, que eu tinha escrito, a mão: (1920 - ..... ). "Esse aqui já está esperando a minha morte!", disse.
A última vez que o vi, foi em Copacabana. Eu bebia um cafezinho num botequim do Posto Seis que existe até hoje, quando ele passou. A cabeça pensativa, meio cabisbaixo. Eu fiquei extático, boquiaberto, imóvel, reverente, e mentalmente me curvava à Grande Poesia que passava.

3 comentários:

Amélia disse...

Aprendi a gostar de Drummond- sobretudo dos seus primeiros livros - graças a um amigo dele e meu professor em Coimbra -esteve uns anos por cá e depois re«gressou à sua universidade em Porto Alegre,onde faleceu. Chamava-se Guilhermino César - e também era poeta.Não se consegue hoje encontrar qualquer livro dele...De Drummond,«o gauche na vida», tenho a obra completa da Aguilar.Há +poemas de que gosto muito -outros nem tanto.Mas para quem escreveu tanto isso é natural, não é?

ROGEL DE SOUZA SAMUEL disse...

Obrigado, Amiga, pela visita. Conheço G. Cesar de nome.
Drummond tem a poetica do ciotidiano...

Jefferson Bessa disse...

É sempre bacana ouvir relatos sobre os poetas. Espero que coloque outros! Apesar de Drummond não me despertar entusiasmo, certamente sua obra é grande.

Abraços.
Jefferson.