segunda-feira, 11 de maio de 2009
Gilka Machado
Rogel Samuel
Depois de uns bons e frios dias em Tiradentes, volto ao Rio de Janeiro e sua atmosfera mais quente.
Por que amamos o Rio de Janeiro?
Apesar de ser uma cidade que se tornou complicada, ainda é o lugar ideal para viver. Algo há no ar que respira alegria. Difícil ser triste por aqui. Talvez as praias, as montanhas, as pessoas colaborem para o ambiente festivo.
O Rio e suas pessoas que passam... sempre lembram o poema de Gilka Machado (1893-1980), a precursora da Garota de Ipanema:
LÉPIDA E LEVE
Lépida e leve
em teu labor que, de expressões à míngua,
o verso não descreve...
Lépida e leve,
Guardas, ó língua, em teu labor,
gostos de afago e afagos de sabor.
És tão mansa e macia,
que teu nome a ti mesma acaricia,
que teu nome por ti roça, flexuosamente,
como rítmica serpente,
e se faz menos rudo,
o vocábulo, ao teu contacto de veludo.
Dominadora do desejo humano,
Estatuária da palavra,
ódio, paixão, mentira, desengano,
por ti que incêndio no Universo lavra!...
És o réptil que voa,
o divino pecado
que as asas musicais, às vezes , solta, à toa,
e que a Terra povoa e despovoa,
quando é de seu agrado.
Sol dos ouvidos, sabiá de tato,
ó língua-idéia, ó língua-sensação ,
em que olvido insensato,
em que tolo recato,
te hão deixado o louvor, a exaltação!
- Tu que irradiar pudeste os mais formosos poemas!
- Tu que orquestrar soubeste as carícias supremas!
Dás corpo ao beijo, dás antera à boca, és um tateio de alucinação,
és o elastério da alma... Ó minha louca
língua, do meu Amor penetra a boca,
passa-lhe em todo senso tua mão,
enche-o de mim, deixa-me oca...
- Tenho certeza, minha louca,
de lhe dar a morder em ti meu coração!...
Língua do meu Amor velosa e doce,
que me convences de que sou frase,
que me contornas, que me vestes quase,
como se o corpo meu de ti vindo me fosse.
Língua que me cativas, que me enleias
os surtos de ave estranha,
em linhas longas de invisíveis teias,
de que és, há tanto, habilidosa aranha...
Língua-lâmina, língua-labareda,
Língua-linfa, coleando, em deslizes de seda...
Força inferia e divina
faz com que o bem e o mal resumas,
língua-cáustica, língua-cocaína,
língua de mel, língua de plumas?...
Amo-te as sugestões gloriosas e funestas,
amo-te como todas as mulheres
te amam, ó língua-lama, ó língua-resplendor,
pela carne de som que à idéia emprestas
e pelas frases mudas que proferes
nos silêncios de Amor!...
Assinar:
Postar comentários (Atom)
2 comentários:
Muitas línguas a língua guarda. Por ela falamos e sentimos muitas coisas. Obrigado pelo texto de Gilka Machado, amigo.
Um abraço.
Jefferson.
Gilka Machado era uma grande artista, amigo, ela fazia uma poesia erótica no sentido estético... obrigado pela leitura...
Postar um comentário