sábado, 26 de janeiro de 2013

J. G. de Araujo Jorge

" Criação "

O diabo é que não sou complicado
sempre sei o que sinto, o que quero,
pelo menos no momento que passa.

Por isso não tenho dificuldade em meu verso,
na verdade, não tenho nenhum trabalho,
ele vem e me diz: aqui estou!

Pois bem: que cante!

( Poema de JG de Araujo Jorge  extraído
do livro " Harpa Submersa " 1a ed. 1952 )





" Canto Banal "

Não te quero dizer palavras difíceis e deformantes
nem inventar imagens que embelezam talvez
mas que não reconheces.

Não tocarei música para os teus ouvidos
nem criarei poesia para a tua imaginação,
nem nada esculpirei que já não estejas em ti...

Nesse instante serei banal,
não respeitarei nem mesmo o silêncio,
nada que nos eleve além do plano em que estamos,
não serás estrela, não serás a nuvem, não serás a flor...

Quando chegares, e eu tomar teu corpo
em meus braços nervosos, te direi apenas:
- meu amor!


( Poema de JG de Araujo Jorge  extraído
do livro " Harpa Submersa " 1a ed. 1952 )





" Estranho Instrumento "

Meu coração, como uma harpa submersa,
jaz no fundo de que ignorado oceano?

Que estranhas correntes arrancam de suas cordas
sons líquidos e redondos que se perdem côncavos
antes de chegar à tona?...

Que peixes cegos tiram notas imprevistas
e se vão tontos na ondulação do canto que despertam
entre espectros calcários e verdes algas trementes?

Que músicas borbulhantes se agitam, nascidas
de que movimentos sem origens, incognoscíveis,
marcando um tempo morto e imensurável?

Meu coração é como uma harpa submersa,
sem dedos, sem cordas, tocando sozinha
uma canção que desvenda os mistérios da vida
para os peixes ouvirem.


( Poema de JG de Araujo Jorge  extraído
do livro " Harpa Submersa " 1a ed. 1952 )






Amo !"


     Amo a terra ! Amo o sol ! Amo o céu ! Amo o mar !
Amo a vida ! Amo a luz ! Amo as árvores ! Amo
a poesia que escrevo e entusiasta declamo
aos que sentem como eu a alegria de amar !

Amo a noite ! Amo a antiga palidez do luar !
A flor presa aos cabelos soltos de algum ramo !
Uma folha que cai ! Um perfume no ar
onde um desejo extinto sem querer inflamo !

Amo os rios ! E a estranha solidão em festa,
dessa alma que possuo multiforme e inquieta
como a alma multiforme e inquieta da floresta !

Amo a cor que há nos sons ! Amo os sons que há na cor !
E em mim mesmo - amo a glória de sentir-me um Poeta
e amar imensamente o meu imenso amor !.


( Poema de JG de Araujo Jorge extraído do livro
"Os Mais Belos Poemas Que O Amor Inspirou"
Vol. I -  1a edição 1965 )







Soneto


Bom o tempo que ficou, — amei-te na alegria
de uma tarde azulada e linda de Setembro,
— disso tudo hoje triste eu muita vez me lembro
enquanto uma saudade o peito crucia...

Amei-te, como nunca outro alguém te amaria,
eras o meu sonhar de Janeiro à Dezembro...
Depois... Tu me deixas-te, e ainda hoje se relembro,
Amargo a mesma dor cruel daquele dia...

Agora sem viver, — sou um corpo sem alma, —
conformo-me com tudo, e vou chegando ao fim
— como a tarde que cai bem suavemente em calma.

Já não sinto... não sofro... já nem vivo até.
— Se a vida ainda era vida ao ter-te junto à mim
hoje, longe de ti, - nem vida ao menos é!

                                                           J. G. de Araujo Jorge


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