TEATRO AMAZONAS, 16
SHAKESPEARE NO TEATRO AMAZONAS
Jantar no Restaurante Francês, no centro de Manaus. Todos foram convidados por Scholz, após “Otelo”, no Teatro Amazonas, com a Companhia Italiana de Dramas e Tragédias e o famoso Emanuel.
Giovanni Emanuel desembarcou no cais da Ponte dos Catraieiros, em Manaus, no dia 12 de maio de 1899, acompanhado de "formosíssima dama", Nella Montagna, primeira atriz da Companhia Italiana de Dramas e Tragédias.
- Além do vinho, querem refresco? – perguntou o garçom.
- Livros há, hoje, e teses sobre ele, disse Lima Silva.
- Sim?
Grande intérprete de Shakespeare, Giovanni Emanuel (Morano Po, Casale, 1848 – Torino 1902) revolucionou a cena italiana.
- Você o conhecia antes?
- Sim, respondeu Lima Silva. Emanuel escreveu que usa o cérebro e o coração de Otelo.
- Ele revolucionou a dramaturgia, acrescentou.
- Sim, respondeu o Maestro Franco. Ele tinha a consciência de que seguia por um caminho artístico novo, uma novidade.
- O seu caráter original e o ecletismo do seu método são incomparáveis, disse Crispim do Amaral.
- Ele é inconstante, descontínuo, passa do sublime para o familiar, acrescentou Scholz.
- Contraditório, opinou Crispim do Amaral.
- Ele faz o contrário do modo de interpretar de Rossi e de Thomas Salvini. O primeiro faz Shakespeare romântico, o segundo faz trágico.
- O ator, continuou Scholz, não tem que ser romântico na recitação trágica, mas tem que recitar a “verdade”. Shakespeare não tem nem romantismo nem tragédia, sua grandeza está nos caracteres, na verdade.
O maestro Adelelmo na cabeceira da mesa sacudiu a cabeça e acrescentou:
- Emanuel começa por traduzir-se a si mesmo, exagera a modernidade vulgar de certas expressões, o que lhe dá um efeito diferente.
- Ele é conhecido como o líder do naturalismo teatral na Itália, disse o maestro Franco, como ator experimentalista, como uma escola nova.
- Sim, disse Crispim, o dramático representa o caráter do homem, sem fantasias e afetação.
- Sua preocupação principal no palco, acrescentou Lima Silva, consiste em humanizar o herói trágico. Naturalidade interpretativa.
- Contra o convencionalismo, acrescentou Crispim, já vermelho de vinho. Mas, como todos os artistas, sabia que mesmo no naturalismo o teatro não é capaz de reproduzir a realidade.
- Emanuel faz uma arte neurótica e moderna, disse o maestro Adelelmo.
- O sucesso de público de Emanuel, acrescentou Crispim, mostra que o público aceita isso.
- Ele não recita, mas fala, grita, não como um ator, mas como um homem. Sem convencionalismo.
- Otelo parecia para mim um homem vivo, de carne e osso, disse Scholz.
- Mas com grande efetividade, disse Crispim.
- Ele é um Otelo dos nossos dias, era como se estivesse real, em carne e osso. Ele estava lá, realmente, em cena.
Manaus era uma cidade de 50 mil habitantes, encravada no meio da floresta, mas tinha uma sociedade de nível cultural elevado. O governo estadual pagou duzentos contos de réis para que a Companhia Italiana de Dramas e Tragédias apresentasse vinte e nove espetáculos no Teatro Amazonas: "Otelo", "Romeu e Julieta", "Rei Lear", "Hamlet" (3 vezes) e "O mercador de Veneza" de Shakespeare; A Dama das Camélias" (2 vezes), de Dumas, filho etc.
Partiram de Manaus a 6 de julho do mesmo ano de 1899, no vapor "Continente", depois de quase dois meses em Manaus. O nome de Emanuel está gravado numa placa de mármore, nos corredores do Teatro Amazonas, como a pedir mais respeito, mais veneração por aquela casa ilustre, que soubera entender e aplaudir o teatro shakespeariano.
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