quinta-feira, 9 de julho de 2009
A escondida
A escondida
Rogel Samuel
Ela tem 103 anos. É isso que me diz o barbeiro que há 50 anos mora por aqui e conhece a todos. "Dizem", acrescenta. Todos os dias ela caminha um pouco, pela manhã, sempre só, toda agasalhada, mesmo no verão. Vai até a esquina, olha o Cristo do Corcovado. Vai até os fundos da igreja, reza para a imagem de uma santa. Outro dia a vi atravessando a rua, coisa rara. Para mim ela é a pessoa mais importante do bairro. Não o Roberto Carlos. Parece que mora só, nunca a vi acompanhada. 103 anos dá para escrever a história de um povo, a história de um Século. Meus Deus, que recordações terá? Eu gostaria de entrevistá-la. 103 anos me diz que ela pode ter conhecido muita coisa, muita gente. Me parece solteira, não tem cara de mãe. Mãe tem cara de mãe, ela não. Tem rosto de moça, de menina, posso imaginá-la menina. Pois anda até rapidamente, e tem uma certa graça, para sua idade. Não usa begala. Só uma capa, com capuz e cachecol. Como se quisesse esconder-se da morte.
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2 comentários:
Amigo, adorei o ar "escondido" de sua crônica que, ao mesmo tempo, tem uma leveza que nos leva ao fim nos deixando a vontade de ler muito mais. Muito bom.
Um abraço.
Jefferson
obrigado, amigo, que tenha lido até o fim e gostado... é tudo o que faz um cronista bem feliz...
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