QUEM NESTE NATAL SE EU
GRITASSE ME OUVIRIA DENTRE AS LEGIÕES DE ANJOS CELESTES?
Rogel Samuel
Neste ano, neste Natal
de tantas guerras, dá para compreender o significado do nascimento, do
renascimento de Cristo, relendo o Capítulo 10, do Evangelho de São João, onde
está: «Minha vida, ninguém a pode tirar; ao contrário, eu espontaneamente a
dou». O que Ele diz ali é encontrado também em outro lugar, em Jó, 3-16:
“Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para
que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.” Pois,
repetia Ele: «Dou a minha vida pelas minhas ovelhas» (João, 10-16),
significando que as protegeria, com seu próprio corpo, contra si, e a todo
custo. Naquela hora, depois de ter exposto aquilo, alguns homens pegaram em
pedras para o apedrejar, ao que Jesus respondeu-lhes, segundo o texto bíblico:
«pegaram pela segunda vez em pedras para o apedrejar. Disse-lhes Jesus:
Tenho-vos mostrado muitas obras boas da parte de meu Pai. Por qual dessas obras
me apedrejais? Eles responderam-lhe: Não é por causa de alguma boa obra que te
queremos apedrejar, mas por uma blasfêmia, porque, sendo homem, te fazes Deus.
Replicou-lhes Jesus: Não está escrito na vossa lei: Eu disse: Vós sois deuses
(Sl 81,6)?».
Ora, pratico e estudo
algumas das diversas formas de budismo há quase quarenta anos - theravada, zen
e tibetano - e quanto mais estudo o budismo mais cresce minha admiração - minha
veneração - pela figura e ensinamento de Cristo, dos maiores de todos os
compassivos, dentre os mais legítimos representantes da pura compaixão, da mais
pura compaixão pelos seres que ele chamava de «ovelhas», e a si pastor.
«Em verdade vos digo
que eu sou a porta das ovelhas», ele falava. Ou seja, com seu exemplo máximo, a
doação à causa humana, ele sabia que iria tornar-se símbolo, um líder. Pois,
que é um líder, senão aquele a que todos seguem? «A este o porteiro abre, e as
ovelhas ouvem a sua voz, e chama pelo nome às suas ovelhas, e as traz para
fora. E, quando tira para fora as suas ovelhas, vai adiante delas, e as ovelhas
o seguem, porque conhecem a sua voz». Assim reconhecem a sua voz, a voz do
amor, da compaixão e da bondade.
* * *
Mas que significa
aquilo: « Vós sois deuses»?
Que somos seres
humanos, capazes de tudo, até mesmo do amor, da compaixão e da bondade?
* * *
Pois ameaçaram
apedrejá-lo ao que ele replicou: Tenho-vos mostrado muitas obras boas. Por qual dessas obras me apedrejais? Os
homens responderam que era pela blasfêmia - afinal ele dizia «Sou o filho de
Deus», ou «Eu e o Pai somos um». E ele:
«Como acusais de blasfemo aquele a quem o Pai santificou e enviou ao mundo,
porque eu disse: Sou o Filho de Deus?» «Procuraram então prendê-lo, mas ele se
esquivou das suas mãos. Ele se retirou novamente para além do Jordão, para o
lugar onde João começara a batizar, e lá permaneceu. Muitos foram a ele e
diziam: João não fez milagre algum, mas tudo o que João falou deste homem era
verdade. E muitos acreditaram nele».
* *
*
Neste fim de ano de tantas
mortes, - de guerras políticas, religiosas, ideológicas, econômicas, - dá para
compreender o significado, dá para ter esperança no significado, na herança do
significado do nascimento, do renascimento dos sentimentos humanos, do
renascimento do sentido de Cristo, porque reconhecemos a sua nossa voz como a
sua nossa voz do amor, a sua nossa voz da compaixão e da bondade ilimitada, da
suavidade, ilimitada, pois, como escreveu Rilke, na «Primeira elegia»:
Quem se eu gritasse,
dentre as legiões de Anjos
me ouviria? E mesmo que um deles me tomasse
inesperadamente em seu coração, aniquilar-me-ia
sua existência demasiado forte.
me ouviria? E mesmo que um deles me tomasse
inesperadamente em seu coração, aniquilar-me-ia
sua existência demasiado forte.
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