domingo, 2 de março de 2008

A COPA DE JOÃO CABRAL




Em três poemas podemos dizer que João Cabral está presente nesta Copa. O Primeiro é:



ADEMIR DA GUIA

Ademir impõe com seu jogo
o ritmo do chumbo (e o peso),
da lesma, da câmara lenta,
do homem dentro do pesadelo.

Ritmo líquido se infiltrando
no adversário, grosso, de dentro,
impondo-lhe o que ele deseja,
mandando nele, apodrecendo-o.

Ritmo morno, de andar na areia,
de água doente de alagados,
entorpecendo e então atando
o mais irrequieto adversário.


O Segundo poema fala do:


O TORCEDOR DO AMÉRICA F.C.

O desábito de vencer
não cria o calo da vitória;
não dá à vitória o fio cego
nem lhe cansa as molas nervosas.
Guarda-a sem mofo: coisa fresca,
pele sensível, núbil, nova,
ácida à língua qual cajá,
salto do sol no Cais da Aurora.


O terceiro poema lembra os Ronaldos europeus:


O FUTEBOL BRASILEIRO EVOCADO DA EUROPA

A bola não é a inimiga
como o touro, numa corrida;
e embora seja um utensílio
caseiro e que se usa sem risco,
não é o utensílio impessoal,
sempre manso, de gesto usual:
é um utensílio semivivo,
de reações próprias como bicho,
e que, como bicho, é mister
(mais que bicho, como mulher)
usar com malícia e atenção
dando aos pés astúcias de mão.

A bola não é impessoal, tem vida e alma. Não é inimiga, mas amante. A bola de futebol tem malícia e manha, tem reações perigosas, e não se usa sem risco. Não. Como a mulher, ou um touro. Não reclame: Cabral era nordestino. Não: o Jogador é um toureiro, que amansa a bola. O time perdedor não se corta com o afiado.

O primeiro poema é o Jogador; o segundo o Clube, o time; o terceiro a bola.

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