sexta-feira, 14 de maio de 2010

Baltasar Garzón é afastado


O escritor José Saramago lamentou hoje com “lágrimas” o afastamento do juiz espanhol Baltasar Garzón das suas funções devido à investigação que pretendia realizar sobre os desaparecidos da Guerra Civil (1936-1939) e os primeiros anos da ditadura franquista.
O juiz Baltasar Garzón foi hoje suspenso das suas funções pelo Conselho Geral do Poder Judiciário Espanhol, numa reunião extraordinária deste órgão de governo dos juízes espanhóis, após ter sido indiciado por querer investigar crimes amnistiados da época franquista.

“As lágrimas do Juiz Garzón hoje são as minhas lágrimas. Há anos, a um meio-dia, tomei conhecimento de uma notícia que foi uma das maiores alegrias da minha vida: a acusação a Pinochet”, antigo ditador chileno, refere Saramago numa nota enviada à Agência Lusa.

“Este meio-dia recebi outra notícia, esta das mais tristes e desesperançadas: que quem se atreveu com os ditadores foi afastado da magistratura pelos seus pares. Ou melhor dito, por juízes que nunca processaram Pinochet nem ouviram as vítimas do franquismo”, critica Saramago.

No entender do Prémio Nobel de Literatura de 1998, Garzón é o “exemplo de que o camponês de Florença não tinha razão quando, em plena Idade Média, fez dobrar os sinos a finados porque, dizia, a justiça havia morrido”.

“Com Garzón sabíamos que as leis e o seu espírito estavam vivos porque as víamos actuar”, frisa.

Com o afastamento de Garzón “os sinos, depois do repique a glória que farão os falangistas, os implicados no caso Gürtell, os narcotraficantes, os terroristas e os nostálgicos das ditaduras, voltarão a dobrar a finados, porque a justiça e o estado de direito não avançaram, nem terão ganho em transparência e quem não avança, retrocede”, refere.

“Dobrarão a finados, sim, mas milhões de pessoas sabem reconhecer o cadáver, que não é o de Garzón, esclarecido, respeitado e querido em todo o mundo, mas o daqueles que, com todo o tipo de argúcias, não querem uma sociedade com memória, sã, livre e valente”, conclui o escritor português.

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