domingo, 6 de fevereiro de 2011

África, o continente de todos





Emir Sader

Grande parte da humanidade olha para a África como quem oha pela janela (de um hotel de 5 estrelas) e não como quem olha para o espelho. No entanto, toda a história mundial tem seu espelho na Africa. Todos os outros continentes - América, Ásia - foram espoliados para que a Europa pudesse trilhar as chamadas revoluções comercial e industrial, no processo de acumulação primitiva. Mas nenhum continente sofreu, além da dilapidação dos seus recursos naturais, da opressão das suas culturas e dos seus povos, a escravidão nas proporções de genocídio que ela assumiu na Africa.

Praticamente toda a população adulta da Africa foi submetida à degradante situação de serem levados como gado para trabalhar como escravos, como seres inferiores, para produzir riquezas para a elite branca europeia. O destino da África ficou comprometido pelo colonialismo, pela escravidão e pelas diversas formas de imperialismo. Foi também vítima privilegiada do racismo, da discriminação contra os negros, disseminada pela elite branca por todo o mundo.

A África do Sul, o país economicamente mais desenvolvido do continente, até pouco tempo ainda sofria o apartheid. Mas as elites brancas do mundo consideram a África um caso de continente vítima de si mesma: do tribalismo, do atraso, dos conflitos étnicos, dos massacres, das epidemias, das catástrofes. Tentam fazer a África vítima da natureza e não vítima da história - da colonização, da escravidão, do imperialismo. Um caso perdido, para as potências imperiais. Um caso de opressão, exploração, discriminação.

Hoje a África tornou-se abastecedor de matérias primas para as potências da globalização, que continuam a extrair os recursos naturais por meio de grandes corporações ou diretamente de governos. As mesmas potências que, na Conferência de 1890 concluíram a repartição do continente entre eles, fatiando-o com regra e compasso, hoje disputam entre si os recursos que alimentam seus processos de industrialização e de consumismo exacerbado.

Os colonizadores e os imperialistas não consideram que sejam devedores da África, que devam contemplar como continente privilegiado no apoio dos outros, por tudo ao que submeteram os países e os povos africanos.

Podemos julgar a política externa de cada governo e a visão de cada povo do mundo pela atitude que têm com a África. Ao invés de continente marginal, deveria ocupar o lugar central nas relações internacionais contemporâneas. Toda politica externa que não privilegia a Africa, está errada.

Postado por Emir Sader às 16:05

2 comentários:

Gustavo disse...

"Toda politica externa que não privilegia a Africa, está errada."

Mas para poder passar para o outro lado, o

"Toda politica externa que privilegia a Africa, está certa."

há que garantir que os agentes implementadores, aqueles que traduzem em ações concretas os termos abstratos de cooperação das relações bilaterais, sejam acompanhados e fiscalizados. Senão, o que no início parece ser ajuda para o povo africano, pode acabar resultando apenas numa iniciativa imperialista concentradora de renda.
Quando se pensa em quem são esses agentes brasileiros em África, e no poder de influência que adquiriram, deveríamos, no mínimo, garantir que fossem fiéis ao discurso original de sincera cooperação (que lhes abriu as portas, e lhes permitiu operar nesses países). Ou seja, que o resultado das suas ações garanta um efetivo ganho para o povo do país a que se destina a cooperação, e não apenas para o próprio agente e, eventualmente, para uma elite minoritária local.
Para isso, deveriam existir mecanismos de controle que dessem mais transparência ao processo efetivo de implementação das políticas de cooperação, e que garantissem a constante aderência aos valores originais que motivaram a cooperação.
Por aqui, tudo o que se sabe a respeito é apenas que os tais agentes aumentam o ganho e o poder de influência. Já com relação ao real benefício das suas ações, precisaríamos talvez de mais informações.
Apenas para poder fechar o ciclo e afirmar, sem titubear,
“ESTA política externa privilegia a África, E está certa”

ROGEL DE SOUZA SAMUEL disse...

OBRIGADO PELO COMENTARIO DESAFIADOR, AMIGO