sexta-feira, 26 de abril de 2013

A pequena Paris



















A pequena Paris

NEUZA MACHADO

No entanto, “que belo lugar”! Tão “limpo”! “Lembrava Paris”. O Ribamar até então era apenas um “caboclo mal vestido, calças de brim, camisa de algodão cru de dura goma, chapéu de palha na cabeça e mala de madeira enrolada na mão”. Quem estava a se lembrar de Paris ao apreciar a Cidade? O primeiro ou o segundo narrador? Ou um terceiro viajante-narrador, profundo conhecedor da Cidade de Paris? Como poderia o Ribamar de Sousa da “mala de madeira enrolada na mão”, ou mesmo o segundo narrador, lembrar-se de Paris? Seria a Paris decalcada no “Cosmorama”, aquele interessante aparelhozinho ótico que o acompanhou quando de sua peregrinação até ao Seringal Manixi?


Diz o narrador, ao refletir ficcionalmente o declínio sócio-econômico da Cidade de Manaus: “Tudo o que era sólido se desfazia no ar e ruía como um castelo de cartas. O Teatro Amazonas foi abandonado, transformado em depósito de borracha velha. O que sobrou foi muito pouco, mas era o que eu mais amava”. O Teatro Amazonas, mesmo transformado em depósito de borracha velha, era o local que o narrador “amava”. O Teatro Amazonas, o símbolo da Cidade manauara, se estabeleceu no alto, como marca do poder da era da borracha. Posteriormente, “em ruínas”, significou a decadência de um primitivo Império capitalista, o de base familiar. Uma outra forma de Capitalismo Selvagem estava a surgir no mundo: o Capitalismo sem freios das multinacionais estrangeiras. Naquele instante universalmente dinamizado, o Teatro tornou-se um artigo sem serventia para os manauaras, um monumento do passado em ruínas, abrigado em uma Cidade em ruínas sócio-financeiras. No entanto, para o narrador-cidadão do mundo, ainda era o lugar mais “amado” (não seria de se admirar o fato de que, no momento, neste ano de 2008, o narrador aqui realçado esteja a escrever um romance chamado Teatro Amazonas).
O fogo da labareda da serpente
Sobre O AMANTE DAS AMAZONAS, de Rogel Samuel

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