ROGEL SAMUEL
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Nós nos despedimos na última luz de uma serena tarde
do mês de maio de 1964 - vinte e um dias depois do golpe militar - e de lá
partimos para Cabo Frio onde um barco
alugado nos esperava no cais do canal - entretanto choveu persistentemente
durante quase toda aquela nossa viagem de lua de mel ("onda de mel",
contava Val; "luz de mel", corrigia eu) e Val relatava que naquelas
vagas pelo resto de nossas vidas ouviríamos aquela música da ventania nos
nossos ouvidos, a chuva, e nos afogaríamos naqueles golfões do sentimento mole
e maciço do fundo do mar de nós mesmos, porque era aquela sensação de claridade
no meio daquela chuva no espaço do mar, naquele espaço verde por onde o barco
penetrava como num labirinto selvagem, e onde nos introduzíamos num horizonte
desconhecido e invisível - Val nua no convés: e assim que ainda a vejo hoje
cantar aquela canção de amor daqueles heróicos tempos de mar e de vendaVals
roqueiros que eu ouvia - tentando avançar com cautela por esta pormenorizada
narração - e para tornar o rumo de mais seguro porto devo dizer que naquela
época a situação nos colocava no pátio do paraíso que eu não divisava bem, um furo,
algo significante e que tem força decisiva: porque aquela minha temporada com
Val me deixava radiante, me empurrando para a glória de mim mesmo, a brisa
corrente que nos trazia de volta como se lancha fosse um veleiro e nos
conduzisse pelo mar - ficamos no hotel, o colo cheio dos jornais sobre o golpe,
a beber um coquetel de frutas sobre as notícias, as notícias cada vez mais
terríveis, mas os olhos de Val recolhiam os reflexos daquele mar com sua
superioridade lunar e esmeralda, ela mais parecia uma Marilyn Monroe morena
naquele tempo, dourada, a vida toda simulava ali estar em sua homenagem - e no
dia seguinte de lá partimos para Búzios, a camisa branca, larga feito uma
bandeira de sol luminosa, meio ávida, adejava, o tórax à mostra sobre a curva da
anca suave, os homens se surpreendiam de vê-la tão loura, tão artificialmente
loura e límpida que nem parecia que comigo estivera ressonando levíssima no seu
leitoso perfume depois de se debater no gozo selvagem dos seus sonhos nos meus
ombros durante a noite anterior: o veículo saía soprado pela mágica do vento e
nós íamos para a casa de Búzios emprestada de um amigo meu - passamos velozes
pela ponte do canal (Val dirigia) e ao longo da estrada litorânea se ouvia a
areia da estrada de terra batida na fuselagem enquanto minha mão se introduzia
por suas belas coxas.
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