A VOZ
NEUZA MACHADO
“A voz como era?”, indaga o primeiro narrador, maravilhado
com a sua nova direcao ficcional. Paxiuba, o bruto, possui o poder da voz que representa o heroi mitico. Assim, como uma divindade semihumana, possui voz tonitruante. Somente os herois mitificados possuem
voz poderosa. Este “heroi” e o possuidor da chave simbolica que fara o
primeiro narrador, agora tambem mitificado, a percorrer com o proprio
olhar diferenciado, a mao dinamizada e o imaginario fantasticamente
iluminado, os limites magicos do Manixi. “Ah, bem me lembro inteiro
dele sim, a gente fica velho, mas, antes de morrer, a memoria a gente
aviva, e nela vive, ate o tampo do tempo nos apagar”, revela o primeiro
narrador. As lembrancas fazem parte da memoria, e na memoria se
concentra o poder mitico. A memoria mitica so resguarda tempos
heroicos e seres extrarreais, mesmo assim, nao se pode duvidar de sua
verdade. A verdade mitica sera sempre renovada, revestida por novas
roupagens. Neste intervalo narrativo-ficcional, o narrador tera de passar
pela iniciacao do conhecimento primordial e sobrenatural. Paginas
adiante, o segundo e verdadeiro narrador entrara ficcionalmente e
vitoriosamente no “quarto escuro” do repouso fervilhante, para de la
sair renovado. Neste segundo momento ficcional, Paxiuba e o
representante da chave mitica (chave magica). A terceira chave,
transcendental (oriunda do plano da consciencia dinamizada), aquela
que vigorou/vigora no imaginario-em-aberto do escritor Pos-
Moderno/Pos-Modernista de Segunda Geracao, desde o inicio da
narrativa, so sera percebida e interpretada pelos leitores-eleitos
“incomodados” quando o segundo narrador se predispuser a aparecer no
fluxo interativo do recontar renovado.
No entanto, este narrador da pos-modernidade, narrador do
escritor do final do seculo XX e principio do seculo XXI, querendo ou
nao, pois se ve envolvido pelas diferenciadas normas ficcionais de seu
momento social, tera de se valer da técnica do olhar simulador para
apresentar o Manixi, o espaco socio-ficcional de sua narrativa. Assim, o
Palacio do Manixi e as terras que o rodeiam terao de aparecer em toda a
sua grandiosidade e imponencia, a moda dos simulacros televisivos e
cinematograficos que imperaram (imperam) em sua atualidade. Por
enquanto, a saida digna, irrepreensivel, para que, posteriormente, o
verdadeiro narrador possa desmistificar a sua propria realidade vital e a
sua outra diferenciada realidade socio-ficcional, e buscar nos dominios
do mito uma diretriz qualificada que apresente, aos leitores do momento
e aos leitores do futuro, a suntuosidade exigida pelo hodierno momento
historico das grandezas simuladas. O arcabouco mitico sera sempre uma
dimensao que em todo tempo satisfara tais requisitos. Paxiuba e o
guardiao da chave. O narrador tera de eleva-lo a categoria de heroi
mitico-ficcional. No entanto, como semi-humano, o seu aparecer
glorioso, ao longo da segunda etapa da narrativa, nao representara um
simulacro. A verdade da ficcao-arte do Pos-Moderno/Pos-Modernismo
de Segunda Geracao ultrapassa os limites da simulacao do fingir
depreciativo (simulacro), para, em seguida, alcancar a gloria do fingir
da literatura-arte (recriar). E convenhamos: sao poucos os escritores
eleitos para tal missao, neste tempo presente de incomuns calamidades.
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