sábado, 7 de junho de 2014

O amante das amazonas: o ciclo sob o olhar de um analista-autor

 

O amante das amazonas: o ciclo sob o olhar de um analista-autor

Lucilene Gomes Lima
 
 
( Lucilene Gomes Lima. FICÇÒES DO CICLO DA BORRACHA NO AMAZONAS. Estudo comparativo dos romances A selva (FERREIRA DE CASTRO), Beiradão (ÁLVARO MAIA) e O amante das amazonas (ROGEL SAMUEL). Edua. Manaus. 2009.)
 
 
 Essa passagem norteia a própria leitura que devemos fazer do romance, pois a ficção se auto-define:

[...] esta narrativa-paródia de romance histórico que define com boa precisão esta minha tardia confissão - vai-lhe revelar a vida tão surpreendente de Ribamar de Souza, aquele adolescente que eu era aparecido num inesperado dia de inverno da Amazônia dentro da chuva compacta de um ostinato extremamente percussivo em comandos de improvisação de uma partitura imaginária, ecológica, de acordes politonais sobre o que sentado estava num banco de madeira no alpendre do tapiri ao som do suporte de compassos 5/4 do Igarapé do Inferno, que sai no Igarapé Bom Jardim que sai no Rio Jordão, que sai no Rio Tarauacá, que sai no Rio Juruá, afluente do Rio Amazonas, o Solimões, aonde estamos retornando. 



 O entendimento do caráter parodístico atribuído pelo narrador ao romance requer algumas considerações sobre a especificidade desse tipo de discurso. Em seu estudo acerca da tipologia do discurso na prosa, Bakhtin  argumenta que o procedimento parodístico do discurso se caracteriza não somente por uma remissão ao objeto referencial da fala, como também a um segundo contexto, um ato de fala de outro emissor, sendo por isso um discurso duplamente orientado ou de duas vozes. Bakhtin estabelece também a diferença entre a paródia e a imitação, fazendo notar que enquanto aquela cria um antagonismo em relação à voz na qual se aloja, essa torna própria a palavra do outro, fundindo-se a ela. Outra peculiaridade que deve ser considerada, segundo o autor, é que a fala parodiada é apenas subentendida. Bakhtin destaca que o campo de possibilidades do discurso parodístico é bastante amplo, pode lançar mão de um estilo enquanto estilo, de modos típicos de pensar social ou individualmente. A construção parodística pode se limitar a níveis da superfície verbal ou atingir níveis mais profundos. O uso parodístico da palavra do outro, lembra o autor, não se dá apenas no campo literário, ele ocorre sempre que há intenção de pôr um acento irônico nas palavras de um outro emissor, criando uma ambivalência em relação a essas palavras: “[...] Em nossa fala cotidiana, é extremamente comum este uso das palavras do outro, especialmente no diálogo em que, freqüentemente um interlocutor repete de modo textual a afirmação de outro interlocutor, investindo-a de outra intenção e enunciando-a a seu próprio modo: com uma expressão de dúvida, de indignação, de ironia, de zombaria, de troça ou algo semelhante.” 
 

Nenhum comentário: