sexta-feira, 1 de janeiro de 2010
NARRATIVAS FICCIONAIS PÓS-MODERNAS
NARRATIVAS FICCIONAIS PÓS-MODERNAS
NEUZA MACHADO
As citações ao longo dos textos ficcionais pós-modernistas, inclusive as não nomeadas, sustentam o fluxo narrativo diferenciado do escritor da Era Pós-Moderna. Augusto Abelaira, ficcionista português, revelado para o mundo a partir dos anos cinqüenta do século XX, valeu-se de uns versos de Carlos de Oliveira intitulados “Bolor”, para escrever o seu diferente romance pós-modernista, inclusive, apropriando-se criativamente do título. O romance Bolor, publicado em 1968, exibe, na página inicial, o poema de Carlos de Oliveira, colocando-o como parte integrante da ficção. Ali, segundo Theodor Adorno (que faz a apresentação da edição brasileira de 1999 da Editora Lacerda, leia-se Editora Nova Aguillar), observa-se “um livro inteligente”. Para Theodor Adorno, conceituado crítico literário, “Bolor exibe à tona do enredo uma armadilha: quem escreve o diário? Pois de um diário se trata, embora não se paute exatamente pelas convenções do gênero”. O ficcionista mineiro Roberto Drummond, escritor que passou a ser conhecido no início dos anos 70, ao editar a sua coletânea de contos A Morte de D. J. em Paris, contos que procuravam “derrubar padrões pré-estabelecidos”, segundo palavras do autor, inaugura a coletânea com versos de Bob Dylan: Os grandes livros foram escritos / os grandes ditos foram ditos / e eu só quero tentar pintar um quadro / ainda que não entenda bem o que se passa / sei que morreremos algum dia / e que nenhuma morte deterá o mundo. Naquele momento, o Brasil vivia o período da ditadura militar e as mortes políticas não poderiam ser contestadas por meio da palavra. A criatividade ficcional de Roberto Drummond permanecerá dinâmica, graças à sua diferenciada infração narrativa ao se apropriar ativamente dos versos de Bob Dylan, colocando-os de forma duradoura em seu livro e, com esta atitude, denunciando, com arte e sutileza, as “crueldades” das normas ditatoriais de seu momento histórico. E os versos de Bob Dylan se perpetuarão como parte integrante destas nomeadas e diferentes narrativas ficcionais de Roberto Drummond.
Há outros ficcionistas, conceituados como pós-modernos, que se valeram de influências não reveladas ao longo de suas narrativas. Colocar-se como analista e/ou intérprete da própria obra (desmitificando-as ou defendendo-as), é característica defensiva desses escritores, inclusive os do passado. José de Alencar, escritor que posteriormente se tornou o mais dignificado de nosso período romântico, viu-se envolvido nas malhas dos críticos pré-realistas de sua época, os quais procuravam desmerecer o seu talento literário. Mário de Andrade, ao referir-se ao Macunaíma, se posicionou, afirmando que “copiara” inclusive o modelo discursivo de Rui Barbosa na “Carta às Icamiabas”, além de se valer do folclore nacional para a elaboração de sua incomum narrativa. Robbe-Grillet, no Prefácio de seu livro Por Um Novo Romance, procura explicar o fato pelo qual se incomodou com as críticas feitas aos seus romances, escritos a partir dos anos cinqüenta. As críticas desfavoráveis induziram-no a desenvolver uma posição de protetor de suas obras ficcionais diferenciadas. Submetido a ataques e poucos elogios, quando da publicação de alguns de seus romances (Lês Gommes, Lê Voyeur, La Jalousie), conscientizou-se de que “o que mais o surpreendia, tanto nas censuras quanto nos elogios, era encontrar por toda a parte uma referência implícita ─ ou mesmo explícita ─ aos grandes romances do passado, que eram apresentados como o modelo para o qual o jovem escritor devia manter os olhos voltados” (Alain Robbe-Grillet).
MACHADO, Neuza. O Fogo da Labareda da Serpente: Sobre O Amante das Amazonas de Rogel Samuel
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