quarta-feira, 11 de abril de 2012

Adana Kambeba tem muito orgulho de suas raízes indígenas.

Foto: Eduardo Vessoni/Divulgação


Adana Kambeba tem muito orgulho de suas raízes indígenas. É pesquisadora, compositora e cantora dos costumes de seu povo, o Kambeba (Omágua). Apesar disso, não se esquiva de sua outra identidade, a “brasileira”, que está registrada na certidão em português como Danielle Soprano Pereira. Na vida dela, essa mistura não é apenas formal. É uma “missão”.


A jovem nascida na área rural de Manaus cresceu em contato com a cidade. Sente-se uma intermediária para seu povo. Por isso, tomou a corajosa decisão de morar a quase 4 mil quilômetros de casa. Adana, ou Danielle, é a primeira indígena do Amazonas a ingressar no curso de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Adana Kambeba é compositora e cantora do seu povo. Aprovada em Medicina na UFMG, quer unir os conhecimentos científicos à medicina tradicional da aldeia

A amazonense pretende estudar a medicina “ocidental”, como chama, para unir a prática desses conhecimentos aos da medicina tradicional do povo Kambeba. Adana quer estudar a possibilidade de unir a visão de cura de seu povo, que envolve o uso de plantas e presenças espirituais, e a ciência ocidental.

“Nem sempre os agentes de saúde sabem lidar com a prática dos indígenas. Às vezes, impõem sua medicina, o que soa até como desrespeito, atropelando detalhes e valores próprios da cultura ou o Pajé. Por isso, é importante que o indígena estude e se capacite, se prepare para trabalhar no meio do povo. Hoje, as lideranças indígenas querem que nós, jovens, estudemos porque querem indígena cuidando de indígena”, afirma.


Com o apoio de sua comunidade – e o sonho de trabalhar para ela no futuro –, Danielle está encarando o desafio de viver tão longe de casa. A estrutura oferecida na universidade para os indígenas a animou. A UFMG tem uma seleção específica para os indígenas. Foram oferecidas duas vagas, com a possibilidade de os aprovados escolherem entre seis cursos. “O povo hospitaleiro, acolhedor e muito família ameniza a saudade da minha terra”, admite.

Há um mês na capital mineira, Adana conta que foi bem acolhida pelos colegas. Mas, na verdade, ela mal teve tempo de curtir a vida de “caloura” de Medicina. Danielle já se tornou “caloura” em outra atividade: nas telas do cinema. Bem antes de pensar na carreira de médica, Adana participou das gravações do filme Xingu, de Cao Hamburger, que estreia nesta sexta-feira em todo o País.

Foto: Danielle Nazareno/Divulgação Ampliar

Adana Kambeba faz o par romântico de um dos irmãos Villas Bôas, interpretado pelo ator João Miguel


Interpretando a vida real

A produtora procurava atores indígenas em diferentes estados, como Mato Grosso e Amazonas. O filme conta a história dos irmãos Villas Bôas, idealizadores da reserva do Parque do Xingu. Uma amiga de Adana, que é bailarina e coreógrafa, foi quem insistiu para que ela fizesse o teste (fotos e uma pequena apresentação). “Eu não queria participar de nenhum filme, pois estava muito envolvida com o movimento indígena”, recorda.

Depois de três semanas, a convidaram para assumir o papel da índia Kaiulú, par romântico do de Claudio Villas Bôas, interpretado pelo ator João Miguel. “A personagem não tem falas. Ela utiliza expressões do olhar e do corpo como linguagem”, conta. Para ela, a experiência foi fascinante. Além de ter conhecido “irmãos e irmãs do Parque Xingu”, Adana se sentiu feliz por interpretar “a mulher indígena guerreira”.

“Não imaginava que a vida de caloura de cinema fosse tão agitada!”, brinca. Para ela, as duas estreias são um desafio. “São lições que ficarão marcadas para sempre na minha vida. Se surgirem bons papéis, que não prejudiquem meus estudos de Medicina, tudo bem. Mas tenho consciência de que serei bem mais útil na Amazônia como médica”, analisa.

Danielle, alfabetizadora bilíngue (os Kambeba falam tupi amazônico), só pensa em voltar para casa. “Eu me vejo, no futuro, trabalhando, pesquisando e lutando pelo meu povo e por outros povos indígenas que compartilham do mesmo ideal. Quando me formar, vou voltar. Quero viver e morrer no Amazonas. É lá que quero que meu espírito habite, junto com os meus ancestrais”, garante.

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