sexta-feira, 20 de abril de 2012

CRÔNICA ROMÂNTICA DE ADEUS AO ROADWAY.

CRÔNICA ROMÂNTICA DE ADEUS AO ROADWAY.


padre Luiz Ruas


Posto que, sendo porto,

Sempre foste caminho de partida

Ou barco de ferro e pinho

Que os ingleses ancoraram

Nas margens do rio Negro.

Era “roadway” britânico caminho

Flutuando

Nas índias águas do rio

Que viu, espantado, surgir

No meio da selva bruta

Onde ainda ecoavam nítidos

Os rudes sons dos Manaus,

Uma clareira de sonhos,

De látex e de libras esterlinas


Foste “roadway” e “rodo”


Mas, posto que sempre foste

Porto – caminho de partida

Também foste caminho de chegada.

(De chegada mas, talvez, que de partida).

Pela ponte de pinho

Louro e de negro ferro

Legiões de marujos desfilaram

E de artistas, empresários e turistas

De além-mar chegados, fascinados

Pelo encanto da floresta-mãe

Onde se arrancava das tetas vegetais

O leite branco que se mudava em ouro


Francesas, espanholas e polacas,

Para gozar nas camas dos bordéis

O ouro fácil em que se transmudara

O sangue, o suor, a febre delirante

Dos seringueiros – párias do Nordeste.


E foi por tua ponte flutuante

Que chegaram as “levas” nordestinas

Dos “brabos”, dos “soldados da borracha”

Que seguiam encantados, enganados,

Para os “centros” – distantes seringais

Do Purus, Acre, Madeira e Juruá

Onde findavam – finavam – escravizados.


Passarelas de dor e sofrimento!

Passarela de luxo, amor e sonho!

No teu ritmo binário que acompanha

O ritmo binário deste rio

Que todo ano sempre sobe e desce,

Também foste termômetro da morte

E da vida que todas as enchentes

E vazantes ofertam fatalmente

Aos homens e as mulheres ribeirinhos

E às roças e animais da várzea.

Mas, que importa! Ficaste, Flutuante

Lembrança de um tempo que ficou,

Também, em vários outros monumentos

Erguidos sobre as bases do martírio

De milhares, devorados pela selva

E pela ambição do lucro fácil.


Que importa!

Ancorado ficaste tanto tempo

Mas, também, nas páginas da história

De um povo que, aqui nesta cidade

Dos extintos Manau, sempre viveu

A longa espera de um amanhã melhor.


Caminho da terra para a água;

Caminho da cidade para o rio;

E caminho do rio para o mar;

No macio balanço da tua ponte.


Todos nós de Manaus, em ti, deixamos

Uma pegada da vida que partimos

Dentro em pouco será simples lembrança,

Pois, tuas linhas arquitetônicas serão

Destruídas, apagadas, distorcidas

Em nome de um progresso que une poucos

Gozarão. Toda a história se repete.


“Roadway” dos ingleses engenheiros

Ou “rodo” dos cablocos de Manaus!


Aqui fica este adeus de quem te viu, menino

E, por ti – uma vez – partiu sonhando

Os mais belos sonhos que sonhar eu pude.

Adeus, velho roadway flutuante,

Docemente embalado pelos ritmos

Das morenas águas do rio Negro. É

Chegado teu fim. Exige-a assim

Este rude imperativo do progresso.

Mas, em mim, como te vi, hás de ficar;

Dourado pelos raios do sol quente

Ou banhado pelas pratas do luar.


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