quarta-feira, 23 de julho de 2008
A poesia de Sonia Sales
Rogel Samuel
“Enquanto eu estiver viva, faça-me
a única vontade, deixa-me ouvir minhas músicas
preferidas, no meu canto solitário, minhas margaridas repousantes, tão amigas, e as violetas em festa.
O meu cavalete encoberto de poeira e saudades, deixem ao meu lado, terei tempo e ainda sobra de fazer
mais um quadro, réplica de mim mesma, alegre
e sempre viva, de esperanças e anseios, escondendo
o que ficar feio, num sentimento de entrega
de uma alma ainda alerta.
Mesmo que o meu corpo esteja gasto e não mais
responda às suas mãos, faça-me a vontade,
a última, beija-me então.”
Leio com prazer a antologia de Sonia Sales: “50 poemas escolhidos pelo autor” (Rio de Janeiro, E. Galo Branco, 2007). Já no primeiro poema, ‘Última vontade”, transcrito acima, se revela o sentido da poesia de Sonia: poesia sobre a vida e a morte, poesia da sensibilidade feminina. Ali se descreve as últimas vontades, as vontades do poeta, suas músicas, suas margaridas e violetas, o cavalete de pintura, tão cheio de esperanças e desejos, desejos de uma alma inquieta, alerta, viva, ainda que o corpo gasto não mais responda à altura, não mais responda àquelas mãos amorosas. (”Acabou-se o carnaval, / foram-se os sonhos. Rasgamos / as fantasias”). Mesmo assim, ainda assim:
Na morte de minha face
fujo de mim
procurando em outros caminhos
encontrar sem lágrimas
a paz que tanto desejo
a alegria de cantar sem pressa
cabelos soltos de sol
pés calçados de mar
Como diz a poesia de Sonia Sales, “sem a esperança do eterno / não há o sentido da vida”. Poesia do sentido da vida.
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