terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

COMEÇO DE TARDE - CLARISSE DE OLIVEIRA

CLARISSE DE OLIVEIRA



COMEÇO DE TARDE 

O novo horário do Rio, despertou minha fome. 
Sentei-me à mesa rústica, de vinhático, enquanto 
o caseiro fritava pastéis de queijo, que, seriam 
acompanhados por batatas em salada e tomates,
também em salada. 
Pela porta aberta da sala, eu via o jardim. 
A bananeira-em-leque, deixava passar as manchas 
de sol sobre a água da pequena piscina. 
Os cachorros se acomodaram aos meus pés, no 
aguardo da minha refeição, onde iam degustar 
as pontas dos pastéis. 

Eu ouvia o barulho da diarista lavando roupa no
tanque, na parte de trás da casa. 

As moscas, em volta, anunciavam chuva para o 
começo da noite. 

Após o almoço, escurecí o quarto, liguei o venti- 
lador e repousei no bárbaro calor. 
Ouvindo um ou outro galo cantar, me veio a ima- 
gem da grande Fazenda que ora é o lugar onde 
resido. 
Vi, de imediato, uma estrada de terra; nela passava 
uma africana com uma bacia de metal na cabeça, 
cheia de roupa lavada em um dos ribeirões que 
descem das montanhas, em direção aos rios en- 
caixoeirados que se unem no centro do vale que é 
a Vargem. 
Atrás da mulher, vinham umas crianças nuas e uns 
cachorros. 
Ela se dirigiu para um pátio calçado de pedra, e 
começou a estender a roupa, que erguia depois, 
sustentada por varáis de bambú. 

Para o vegetariano, a Fazenda é cruel. 
A matança dos animais, o cheiro do sangue empas- 
tado no chão da degola e da esfoladura das peles, 
os miudos dos porcos para as linguiças de fumeiro 
penduradas sobre a fumaça dos fogões de lenha, 
mas, 
era bom ver o queijo defumado embalançando 
sobre um dos fogões, pois, as cozinhas das casas 
grandes, tinham mais de um fogão - o bule de café 
sobre a chapa, sempre quente para um gole, as 
cercaduras de madeira aguardando o cozimento 
lento no alguidar de cobre, das goiabas cortadas 
em combuquinhas, vazias de seu miolo molhe 
cheio de carocinhos, que iam compor a calda, 
que ia unir a massa para a goiabada então, apa- 
nhada por uma imensa pá de madeira, enchendo 
os moldes para os tijolos de goiabada. 

As redes penduradas nas compridas varandas. 

Os oratórios perdidos entre as grandes salas. 

E tudo isso emoldurado pelo passado e do terreno 
onde moro e que já foi Fazenda, só sei de um 
morto: 
Vitória, a filha de Gonçalo de Sá, 
sobrinho do fundador do Rio de 
Janeiro, e que está enterrada 
bem longe daqui, na Praça Mauá, 
nos jardin do Mosteiro de São 
Bento. 

As tardes induzem à meditação e à nostalgia. 

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