Ninguém
pode prender um homem livre
Escreveu ele:
“Você
nunca pode se preparar para meditar: ela deve acontecer sem que você a busque.
Se você a busca, ou pergunta como meditar, então o método não só o condicionará
mais, mas também fortalecerá o seu atual condicionamento. A meditação, em
verdade, é a negação de toda a estrutura do pensamento. O pensamento é
estrutural, razoável ou não, objetivo ou doentio, e quando tenta meditar com
base na razão ou a partir de um estado neurótico e contraditório, projetará
inevitavelmente o que ele próprio é e tomará, à sério, sua própria estrutura
por realidade. É como um crente meditando em sua própria crença; ele fortalece
e santifica aquilo que, por medo, ele próprio criou. A palavra é a
representação ou a imagem cuja idolatria se torna um fim.
O
som constrói sua própria gaiola, e o barulho que o pensamento faz procede dessa
gaiola, e é essa palavra e seu som que separam o observador e a coisa
observada. A palavra não é apenas uma unidade da linguagem, não apenas um som,
mas é também um símbolo, uma lembrança de qualquer evento, o qual põe em
movimento a memória, o pensamento. Meditação é a total ausência da palavra. A
raiz do medo é o mecanismo da palavra.
Era o início da
primavera, e no Bois era especialmente
suave. Havia poucas folhas novas, e o céu não tinha ainda aquele azul intenso
que acompanha as delícias da primavera. As folhas dos castanheiros ainda não
tinham brotado, mas os primeiros aromas da primavera estavam no ar. Naquela parte do Bois quase
não se via ninguém e você podia ouvir os carros que passavam ao longe.
Estávamos passeando no começo da manhã, e havia aquela suave pungência do
começo da primavera. Ele veio conversando, questionando e perguntando o que ele
deveria fazer.
"Parece
uma coisa interminável, esta constante análise, este exame introspectivo, esta
vigilância. Já tentei de tudo; os gurus bem barbeados, e os gurus barbudos, e
muitos sistemas de meditação — você sabe, todos os truques cartola. E isso
deixa a gente de boca vazia e oco por dentro."
Por
que você não começa pelo outro lado, o
lado que você não conhece — da outra margem, a qual você não tem possibilidade
de ver desta margem? Comece com o desconhecido, ao invés de começar com
conhecido, pois esse constante exame e análise somente fortalece e condiciona
ainda mais o conhecido. Se a mente vive a partir do outro lado, então esses
problemas não irão existir.
"Mas,
como que eu vou começar do outro lado? Eu não
o conheço, não posso vê-lo."
Quando
você pergunta — como que eu vou começar do outro lado? — você está ainda
perguntando a partir deste lado. Portanto, não pergunte isto, mas comece do
outro lado, do lado que você não conhece nada, de uma outra dimensão que o
pensamento, por mais astuto que seja, não pode apreender.
Permaneceu
em silêncio por algum tempo, e um faisão macho passou voando, ele reluzia ao
sol, e desapareceu por baixo de umas moitas. Quando reapareceu, pouco depois,
vinha acompanhado de uma meia dúzia de fêmeas quase da mesma cor que as folhas
mortas; e no meio delas, o grande macho tinha um ar majestoso.
Ele
estava tão ocupado que nem notou o faisão e, quando nós chamamos sua atenção
para isso, exclamou: "Que bonito!" — o que eram meras palavras,
porque sua mente estava ocupada com o problema de como começar de um ponto de
partida que ele não conhecia. Um lagarto madrugador, comprido e verde,
aquecia-se ao sol, sobre uma pedra.
"Não
posso ver como que eu vou começar daquele lado. Em verdade, não compreendo essa
asserção vaga, essa afirmação, que, pelo menos para mim, não tem significado
nenhum. Eu só posso ir aonde eu conheço."
Mas,
que é que você conhece? Você só conhece uma coisa que já está terminada,
acabada. Você só conhece o ontem, e nós estamos dizendo: comece daquilo que
você não conhece, e viva a partir dali. Se você diz: "Como que eu vou
viver a partir dali?" —então você está convidando o padrão de ontem. Mas,
se você vive com o desconhecido, você está vivendo em liberdade, agindo a
partir da liberdade, e isso, afinal, é amor. Se você diz: "Eu sei o que é
o amor" —então você não sabe o que ele é. Certamente, isso não é uma memória, uma lembrança de um
prazer. Já que não é isso, então viva com aquilo que você não conhece.
"Eu
realmente não sei do que você está falando. Você está tornando o problema ainda
pior".
Estou
fazendo uma pergunta muito simples. Estou dizendo que, quanto mais você cava,
mais você tem para cavar. O próprio cavar é o condicionamento, e cada cavada
forma um degrau que não leva a parte alguma. Você quer novos degraus feitos
para você, ou você quer fazer os seus próprios degraus que o levarão a uma
dimensão totalmente diferente.Mas se você não sabe o que aquela dimensão é,
––de fato, não especulativamente–– então sejam quais forem os degraus que você
faça ou trilhe, só poderão levá-lo àquilo que já é conhecido. Assim, largue
tudo isso e comece pelo outro lado. Fique em silêncio, e você vai descobrir.
"Mas
eu não sei como ficar em silêncio!"
Aí
está você de novo no "como", e não há um fim para o "como".
Todo saber está do lado errado. Se você sabe, você já está no seu túmulo. Ser
não é saber.
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