quarta-feira, 20 de novembro de 2013

O Amante das Amazonas: Personagens-Narradores

 
 
 
 
O Amante das Amazonas: Personagens-Narradores
 
NEUZA MACHADO
 
 
O(s) Personagem(ns)-Narrador(es) Pós-Moderno(s)/Pós-Modernista(s) de Segunda Geração de Rogel Samuel
“Hoje, nosso mundo está menos seguro de si mesmo, mais modesto talvez, uma vez que renunciou à pessoa todo-poderosa, mas também mais ambicioso, uma vez que olha para além. O culto exclusivo do “humano” cedeu lugar a uma tomada de consciência mais ampla, menos antropocentrista. O romance parece vacilar, tendo perdido seu melhor sustentáculo de outrora, o heroi. Se não consegue pôr-se de pé novamente é porque sua vida estava ligada à vida de uma sociedade agora extinta. Se conseguir, pelo contrário, um novo caminho se abrirá para ele, com a promessa de novas descobertas”.
 
Por que o mundo já começa a enxergar o talento ficcional desse escritor pós-moderno, em especial, a partir desta instigante narrativa?
Sem o receio dos prováveis contra-ataques (contra-ataques daqueles que não leram a obra e, por isso, dela não gostaram, ou leram mal), posso afirmar: o romance O Amante das Amazonas, enquanto forma literária
diferenciada, não é somente a recriação ficcional de estratos múltiplos de realidades amazonenses (sociais, míticas e ficcionais). É muito mais.
É uma narrativa que reflete a problemática do mundo, em seus aspectos dilatados. Os Narradores, a Floresta Amazônica, o Palácio Manixi, os Numas, os Caxinauás, Pierre Bataillon, Paxiúba, Zilda, Laurie Costa, o
Comendador Gabriel Gonçalves da Cunha e a filha Glorinha Lambisgoia, Ifigênia Vellarde, Zequinha Bataillon, Maria Caxinauá,
João Beleza, Júlia, Frei Lothar, Benito Botelho, Estella de Sousa, Mirandinha, Leonildo Calaça, Sabá Vintém, Du Bará, Conchita Del Carmen, e todos os outros importantes personagens (porque são todos importantes e insubstituíveis), poderão ser reconhecidos por leitores de outras partes do mundo. (Certamente, o romance será traduzido em
outras línguas, por meio de bons tradutores, os quais saberão respeitar a qualidade do texto ficcional de Rogel Samuel). As traduções, que
certamente acontecerão, vão propiciar o reconhecimento desta criação literária-ficcional ímpar, porque os conflitos, ali revelados, são as
altercações do homem pós-moderno, atribulado (herança da Era Moderna), suas tentativas de reconstrução sócio-cultural em um mundo
globalizado em vias de perder importantes fronteiras culturais. Assim, percebo este romance de Rogel Samuel como criação ficcional ímpar, expondo interlinearmente o contemporâneo meio social, globalizado e
caótico, entrópico, e, em se tratando do futuro, enxergo-o como refletor replicante de conflitos atemporais e universais.
Pelo meu ângulo visual interativo, o narrador pós-moderno/pós-modernista (e neste momento refiro-me ao escritor-ficcionista enquanto
personalidade ativa adstrita ao seu momento histórico) sintetiza a união da forma de narrar tradicional com a forma de narrar modernista,
paradigmática, insólita, dos anos trinta do século XX (início da segunda fase do modernismo no Brasil) ao final dos anos sessenta. (Tradicional aqui significa a forma de narrar sintagmática, linear, heroica, dos
narradores antigos e medievais, até ao final do século XVI, e alguns posteriores, com aparecimentos esporádicos – sem criatividade – nas escolas literárias que foram surgindo. É importante o esclarecimento de que não estou a referir-me ao narrador da Era Moderna, das narrativas complexas, nascido a partir das páginas notáveis de Miguel de Cervantes, no início do século XVII, o qual vigorou até ao final do século XIX, com as variações próprias de cada momento histórico e suas respectivas estéticas literárias).
Reportando-me à tese de Anaxágoras de Clazomene, de que “o homem pensa porque tem mãos” , revisitada por José Américo da
Motta Pessanha, no Prefácio ao Direito de tSonhar, de autoria do filósofo francês Gaston Bachelard, repenso esta assertiva de Anaxágoras, permitindo-me transferi-la ao aludido narrador tradicional, anterior à Era Moderna. Por este prisma, procuro reavaliar aquele narrador horizontal, que se esforçou por pensar a realidade (recopilando-a literariamente) resguardado por mãos trabalhadoras, ligadas ao prazeroso exercício de “bem narrar” (bem escrever), mas, ainda, preso a uma “perspectiva anulada”, uma perspectiva
exteriorizada, superficial, fenomênica. Assim, o pensar em profundidade ficou interditado, porque as “mãos trabalhadoras” dos narradores antigos e medievais, e dos novelistas eram mais poderosas e só alcançavam pensar as aparências (não me refiro aos romancistas das seguintes estéticas literárias da Era Moderna). Será importante recuperar o fato de que as novelas em prosa (sintagmáticas, sempre conceituais), diferentes dos romances paradigmáticos da Era Moderna, em seu caminhar histórico até ao momento, não lograram transformar-se em ficção-arte, continuaram lineares, e, aos poucos, perderam aquela graça própria dos narradores iniciais, das novelas ou romances de cavalaria em versos, atualmente, já reconhecidos como narradores épico-medievais.

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