segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

NEUZA MACHADO: O FOGO DA LABAREDA DA SERPENTE


NEUZA MACHADO: O FOGO DA LABAREDA DA SERPENTE
SOBRE O AMANTE DAS AMAZONAS DE ROGEL SAMUEL


Se os leitores acompanharam até o momento o meu raciocínio interpretativo, lembrar-se-ão do primeiro personagem-narrador Ribamar de Sousa, logo depois do fogo mítico, agente ígneo providencial ao desaparecimento dos personagens tio Genaro e Antônio, a mergulhar “na invisível água do igarapé de treva fria e rápida” e “[sendo] levado e se [afastando] dali”. Foi nesse momento que a apresentação do arcabouço histórico-ficcional se “dissolveu” para ceder o espaço ao mediador do relato mítico, onde se sobressaiu/se sobressai, conforme já foi refletido, a poderosa figura do bugre Paxiúba, iluminado pelo interregno simbólico do relato pós-moderno da Segunda Geração. Esta segunda fase de O Amante das Amazonas, relacionada ao bugre Paxiúba, resguardada pela construção do recontar mítico indígena, também revelará, seguidamente, um novo momento de impasse ficcional, na busca dos valores ficcionais da pós-modernidade. Para referendar minhas deduções reflexivas, auxiliadas pela crítica cientificista analítica, retomo o trecho da página 35 (op. cit.), no qual o narrador fundamental (oculto, disfarçado de Ribamar de Sousa) anuncia reptadoramente, sublinearmente, por intermédio de seu próprio sonho (“sonho de meia-noite psíquica, onde germinam virtudes de origem” ), que, dali por diante, a narrativa não prosseguirá pelo mesmo procedimento inicial.
O sonho do narrador Ribamar de Sousa, aqui, é um importante referente, pois, por meio dele, o verdadeiro dono do narrar ficcional, o segundo narrador, à moda deleuziana, está temporariamente oculto, distanciado da propagação cultural burra, e processará o seu ato de narrar, estruturando sublinearmente a edificação intelectual-espiritual de um Seringal Manixi idealizado, mitificado, sem evidências exercidas. A partir do “sonho na noite velada”, “muito burra e muito cega”, “entre sombras, segredos e lágrimas”, o narrador principal procura revelar a seus leitores a verdadeira e primitiva história do Estado do Amazonas, cujos vestígios foram consumidos pelos relatos oficiais ou reduzidos em frações simplificadas pela veemência do código. A narrativa O Amante das Amazonas poderá ser classificada futuramente como a história de uma representação/criação mental, valiosamente ficcional (não é épica) do arquétipo poderoso e sensível da Grande Mãe associado ao poder bélico do Grande Pai (o poder feminino/masculino do mito andrógino), bem sinalizado por intermédio do mito das amazonas guerreiras.




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