sábado, 5 de abril de 2014


Rogel Samuel: CRÍTICA DA ESCRITA

            

Na brecha do rio se inscreve a escrita da Fenda, lá há a escrita clandestina, a esquecida de seu miolo, de sua semente.

Esta complexidade das vertentes do texto não se simplifica, mesmo amputando suas partes, os membros da estrutura.

Nem promana dos resultados a complexidade verbal da interpretação, que só faz levantar o pano, e não se trata de conseguir, na leitura, resultados mais complexos, mas confusos.

Durante todo o texto (“nosso pai“), o pai se repete, ele é a poesia do seu imagismo familiar e ecolalia, na tendência do filho de repetir automaticamente as palavras ouvidas.

Esse pai que repete é a pulsão, o ritmo. Seu brilhantismo temático. Repete-se para que não desapareça de todo.

Acresce que o texto interpretativo tem de vir em estado de liberdade, de não compromisso, o que não deixa de ser: Livre com respeito às leituras consideradas corretas.

Só há um endereço: O leitor, na estima e no reconhecimento.

Vamos escrevendo o que nos acorre.

Assim o rio.

Ele tem a dimensão da linguagem que vai aparecendo, sua leitura se vai fazendo à medida que os acontecimentos simbólicos vão ocorrendo, a saber, a linha discreta e segmentada do fluxo inconsciente, que é o discurso das vozes fluviais, das vozes que vêm do rio.

Ali o pai habilita o filho, empresta a sua voz, seu discurso, na cadeia significante do jogo do ir-e-vir da sua casa, da sua causa, da sua canoa.

No seu lugar se levantam incidências imaginárias, aquilo que a leitura vai tecendo, registrando, produzindo:

 

 «A gente teve de se acostumar com aquilo. As penas, que, com aquilo, a gente

             mesmo nunca se acostumou, em si, na verdade. Tiro por mim, que, no que

             queria, e no que não queria, só com nosso pai me achava: assunto que jogava

             para trás meus pensamentos, O severo que era, de não se entender, de maneira

             nenhuma, como ele agüentava. De dia e de noite, com sol ou aguaceiros, calor,

             sereno, e nas friagens terríveis de meio-do-ano, sem arrumo, só com o chapéu

             velho na cabeça, por todas as semanas, e meses, e os anos — sem fazer conta do

             se-ir do viver.» (“A terceira margem do rio”, ver bibliografia).

 

 

Nenhum comentário: