sexta-feira, 16 de agosto de 2013

AS MULHERES PRIMITIVAS


Pablo Cid (Moacyr Rosas, 1918-1998) As amazonas amerígenas

AS MULHERES PRIMITIVAS. Aqui, não será extemporâneo dizer algo sôbre as amazonas primitivas.
Justino, baseado nos documentos de Trogno Pompeu (Hist. L. 2 e 4), conta que Scolopito e Ylinos, príncipes citas, expulsos de sua pátria, foram habitar a Capadócia, à margem do rio Termodonte, com um grande número de jovens que levavam consigo. Constituíram família e foram, um dia, vítimas de uma emboscada preparada pelos seus inimigos. As infelizes viúvas - aqui se iniciam os primeiros dias das amazonas - mataram os poucos homens que lhes restaram, maridos de suas companheiras, as quais a desgraça não havia ferido, para que fôsse a dor igual no coração de tôdas. Então ofereceram combate aos inimigos, a princípio em defesa das fronteiras de suas terras e logo mais para estabelecer a paz. Repudiaram por completo o matrimônio, mas uma vez ou outra permitiam aos vizinhos compartilhar de seu leito. Os filhos, frutos destas aventuras, vinham à luz sob um triste signo: tiravam-lhes a vida logo ao nascer, enquanto as filhas eram educadas para a equitação, para a caça e mormente para as armas. Todavia antes de as entregarem a êste escabroso mister, queimavam-lhes o peito direito para não causar obstáculo algum ao lançamento da seta. Existe também outra versão, segundo a qual os seios das amazonas eram atrofiados através do uso contínuo de um aparelho de cobre, fabricado especialmente para .êste fim. Ângelo Guido, já citado neste trabalho, contraria êste fato, argumentando assim: “Para se ter uma impressão de como os gregos representavam as Amazonas, sem a mutilação do seio, basta passar os olhos nas numerosas reproduções de frisos e estátuas sôbre o assunto, reproduzidas na obra de Salomon Reinach”.
Prosseguindo, todavia, dentro da narração de Justino. As Amazonas fizeram várias rainhas; concluindo a dinastia com Talestris, a qual conseguiu a presença do próprio Alexandre Magno em seu leito durante treze noites, a fim de ter um filho. Foi porém frustrada ‘a esperança. Parca lhe tirou a vida pouco tempo depois. E com ela extinguiu-se o original e turbulento reino. Xenofonte, que viveu antes de Alexandre, fala nas terras em que se acredita que viveram as amazonas, mas não toca,. mesmo de passagem, na existência das mesmas. Será que em sua época eram já uma fábula ou ainda não existiam? Outro fato que milita contra a intimidade de Alexandre e as amazonas é Ptolomeu e Aristóbulo, que acompanharam o insuperável conquistador, não relatarem coisa alguma relacionada com as belicosas cavaleiras, e que consolide a suposição de haver Alexandre passado noitadas em orgia com Minithya, como também chamavam a última soberana das amazonas.
Deodoro de Sicília, historiador grego e coevo de Augusto, nos livros III e V, conta as façanhas dêste exército feminino em várias partes do mundo em que habitaram, enquanto Apolônio — C .1. — explica assim a razão de sua independência: “deusa irritada (Vênus) as tornou aborrecidas a seus maridos, que, abandonando-as, procuraram novos prazeres nos braços das escravas que cativaram; dissolvendo a Thrácia e ardendo de ódio e ciúme, assassinaram os seus próprios maridos e rivais, na mesma noite de infidelidade”. Em tôrno dêste poema, & imortal vate maranhense Gonçalves Dias escreveu que,
à falta de assunto original e empolgante, “Apolônio teve de recorrer ao maravilhoso e sobrecarregar o seu poema de episódios.., e valeu-se da tradição das amazonas, que na ilha Lenos aparece tão fora de caráter.., como as habitantes das ilhas dos Amôres aos companheiros de Gama”.

As amazonas da Líbia (L’Atlantide, de Otto Silbermann, pág. 71 — Cristóbal Colón y El Descubrimiento de América, Humboldt, pág. 163), segundo a tradição, surgiram à margem da Lagoa Tritonida, cuja primeira rainha foi Pallas, filha de Japeto Atlante.
Estas mulheres, um dia, comungando o desejo de sentir a sensação da liberdade, fugiram ao jugo do homem e conservaram a virgindade até certo tempo. Mas quando atingiam a idade padrão de se entregarem ao homem, arranjavam marido que também lhes servia de criado. Era o matriarcado por excelência. É uma aberração da natureza, mas da qual se tem notícia, uma vez ou outra, nestes milênios de história, e que contrasta paradoxalmente com a lenda de D. Juan, e com a existência de Casanova! Os frutos femininos daquelas uniões eram recebidos com indizível alegria: gozavam de todo cuidado materno e eram alimentados com leite de cabra, ao passo que aos do sexo forte lhes inutilizavam os membros, para mais tarde não se tornarem superiores, como era fado da natureza. Quem não se revolta ainda com aquelas cenas imortais do Homem que ri, que foi mutilado pela mão perversa de um anatomista mercenário? Mais dolorosa é esta cena, em que a própria mãe surge como protagonista.
Conta-se também que na Europa, em idade prehistórica, mulheres aboríginas, em grande número, entregues ao culto da Magia, isolaram-se dos homens, ocultando-se à sombra das densas florestas, ou nos antros dos montes lavados pelo dilúvio.
Escondido sob o pseudônimo de Eneas Silvius (*), o papa Pio II escreveu em sua História da Bohêntia (Capítulo VII), que outrora, no século VIII, existia naquele país uma forma de república idêntica à das amazonas, sob a direção da inteligente e ousada môça Valasca, uma das damas de tylissa, filha de Crocus, rei da Bohêmia. Estas, sob o ponto de vista materno, não ficaram aquém no plano de crueldade às suas antecessoras, pois também recebiam jubilosamente as filhas, e aos filhos lhes vasavam o olho direito e lhes cortavam o polegar da destra para os impossibilitar de entesar o arco. E, além disso, viviam organizadas militar e civilmente.
Agora, é o audacioso e celebérrimo Marco Polo quem vem à balha, informando o imaginoso Júlio Verne, o qual, em seu livro Descoberta da Terra, pág. 89; vol. 1, escreve:
S... da Arábia oxide arribou às ilhas Macho e Fêmea, assim chamadas porque uma é exclusivamente habitada pelos homens e a outra pelas suas mulheres, que êles só visitam nos meses de março, abril e maio.
Aqui, neste bosquejo, encontram-se quase tôdas as notícias que a História não esquece, referentes às mulheres de todos os tempos, que se alistaram nas milícias de Marte e sacrificaram ou afetaram sacrificar no culto a Vênus.
(*) Incido no êrro para não quebrar o ritmo histórico de vários séculos, pois o nome verdadeiro dêste historiador foi Enéas Silvio Piccolomini, que exerceu a chefia da Igreja cinco anos, onze meses e vinte e seis dias, com o nome de Pio II.


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