domingo, 11 de agosto de 2013

HISTÓRIA DO BRASIL DE AFRANIO PEIXOTO 8


HISTÓRIA DO BRASIL DE AFRANIO PEIXOTO 8


A DATA
Sem tento, há por aí outras datas. Era vigente o Calendário Juliano. A reforma Gregoriana, de 1582, não retroage os cômputos cronológicos: se retroagisse, mais nove dias, seria a 1.º de Maio. A “invenção da Vera Cruz”, celebrada pela Igreja, é a 3 de Maio. Foi Gaspar Corrêa que confundiu as duas datas: “O capitão pôs o nome de Santa Cruz a esta nova terra, porque a ella chegarão a tres de mayo, dia de Santa Cruz”. (Lendas da Índia, t. I, p. 152).

Ora Cabral pusera à terra o nome de “Vera Cruz”, que D. Manuel mudara em “Santa Cruz”: Santa Helena achara essa cruz a 3 de Maio. Pareceu certo. Em 1823 sugerira Lara Ordonhes a Gonçalves Gomide, deputados à Constituinte Brasileira, e o último por carta a José Bonifácio, o dia 3 de Maio para a abertura da assembléia, “por ser o do descobrimento do Brasil”, o que foi aceito. Dissolvida a Constituinte, a Constituição outorgada por D. Pedro I marcou esse dia para a abertura das Câmaras, durante todo o Império, o que continuou na República. (Cf. Miguel de Lemos, in Jornal do Comércio, do Rio, de 27 de Maio de 1899 e Boletim do Apostolado Positivista do Brasil, n.º 13, de 6 de junho de 99).
Vem daí. Mas Gaspar Corrêa não tinha documento, e servira-se de ilação. O documento apareceu, em 1817, quando Aires do Casal publicou, na sua Corografia Brasílica, a Carta de Pero Vaz de Caminha a el-Rei D. Manuel, e que está na Torre do Tombo. Ora o documento diz, precisamente, 22 de Abril de 1500. Os ensaios de conciliação com a reforma gregoriana do calendário, que ocorreu em 1582, não procedem: 1.º, porque Gaspar Corrêa que faleceu entre 1561 e 1583, escrevendo antes, desconhecia a reforma: a sua data é “juliana”; 2.º, porque não retroagiu o cômputo gregoriano para nenhuma data da história universal, antes de 1582; 3.º, porque a reforma gregoriana não recorreu, suprimiu apenas alguns dias do mês de Outubro, seguindo a quinta-feira 4 de outubro, sexta-feira 15 de outubro... para acertar o erro então existente, de dez dias, em 1582; 4.º, porque 22 de abril, mais nove dias, que era a diferença em 1500, dá 1.º de Maio e não 3...; 5.º, porque contando a diferença no fim do século XVI, ou dez dias, dá ainda assim 2 de Maio, e não 3...; 6.º, porque contando a diferença na época de José Bonifácio, começo do século XIX, seriam doze dias, ou 4 de maio e não 3...; 7.º, porque pela “conta de chegar”, de Varnhagen (História Geral, 2.ª ed., 1877), esse descobrimento, (não com a vista, o achado da terra a 22 de Abril, porém a 23, com o “primeiro trato” dos índios) não parece sério e seria então, quando fosse, o descobrimento dos “brasileiros”(5) e não do Brasil; 8.º finalmente porque não se atentou que, além da data precisa “terça-feira d oitavas de pascoa que foram XXI dias d Abril que topamos alguns sygnaes de terra... hos quaes eram muita camtidade de ervas compridas”... “aa quarta feira seguinte pola manhãa topamos aves... e neste dia, a ora de bespora, ouvemos vista de tera”...
Portanto, o Brasil foi descoberto a 22 de Abril, quarta-feira, à tarde. Três de Maio foi “domingo” e o Brasil foi descoberto uma “quarta-feira”... Este elemento de identificação, sobre o qual nunca se insistiu devidamente, parece-me irretorquível: aa quarta feira, portanto a 22 de abril...
E tanto, que na Relação do Piloto anônimo (outro raro documento da viagem de Cabral, publicado em italiano nos Paesi nuovamente retrouati, de Francesco Montalboddo, 1507, e reproduzido em Ramusio, Delle Navigatione e Viaggi, Veneza, 1554, t. I, f. 132) se lê: “alli XXIII di aprile che fu il mercoredi nella ottava di Pascha hobbe la detta armata vista de una terra di che hebbe grandissimo piacere”. (São os mesmos termos de Cretico, no liv. VI dos Paesi nuovamente retrouati, Vincentia, 1507, com pequenas variantes, o que leva os redatores da Racolta Colombiana, parte III, vol. I, p. 83-4, a escreverem que podem tranqüilamente atribuir a tradução italiana do “Piloto Anônimo” ao Cretico, que fez, de parte da relação, carta sua à Senhoria de Veneza...) No texto citado é a mesma data, 24 de Abril in la octava di Passione. Pode-se dizer: “Piloto-anônimo” ou Cretico “errados”, pois que esse dia 24 de Abril de 1500 foi sexta-feira... e o dia da semana corrige a data do mês, menos fácil de reter de memória. (A correção gregoriana respeitou esta decorrência da semana: se 4 de outubro antecede a 15 de outubro, — supressos os dias do mês, de 5 a 14, — a semana é respeitada e, a quinta-feira, 4, segue-se sexta-feira, 15 de outubro de 1582. Não se recorreu: suprimiram-se 10 dias, no mês; não se tocou na semana). O Brasil foi descoberto uma quarta-feira (concordância de Pero Vaz e do Piloto-Anônimo-Cretico), portanto, a 22 de Abril...


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